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Foro de São Paulo é tolerante com as Farc

Por Jadyr Pavão
23 Maio 2008, 11h23

Por Diogo Schelp, de Montevidéu

Se não fosse por dois fatores, o Foro de São Paulo, um encontro anual de esquerdistas latino-americanos, seria apenas mais uma oportunidade para debater sobre medidas que jamais sairão do papel e para perpetuar a desgastada retórica de que a culpa pela pobreza latino-americana é dos Estados Unidos e do neoliberalismo. O primeiro fator que faz do Foro de São Paulo merecedor de atenção é que muitas das organizações políticas que dele fazem parte estão no poder — ou formam a base de apoio do governo — em mais de uma dezena de países da América Latina. O segundo é que o Foro tornou-se o centro de uma contradição que divide e remói a esquerda latino-americana: a incapacidade de se posicionar de maneira firme contra as violações de direitos humanos cometidas pelas Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), um grupo que esteve presente em boa parte dos dezoito anos de existência do Foro.

Equilibrando esses dois estigmas, começou nesta quinta-feira um novo encontro do Foro de São Paulo, desta vez em Montevidéu, no Uruguai (o último foi em El Salvador). O evento termina no domingo, dia 25. Em um hotel de frente para o Rio de la Plata, cerca de 30 pessoas, representantes de alguns dos principais partidos de esquerda da região, fizeram uma reunião do chamado Grupo de Trabalho – espécie de cúpula diretiva do Foro de São Paulo. A discussão foi presidida por Valter Pomar, secretário de relações internacionais do Partido dos Trabalhadores brasileiro e secretário-executivo do Foro de São Paulo. Como a entidade não tem uma estrutura hierárquica com presidente e diretores, isso faz de Pomar uma espécie de comandante-en-jefe do Foro. Logo após a reunião, que aconteceu a portas fechadas e durou pouco mais de três horas, Pomar concedeu uma entrevista à reportagem de VEJA no bar do hotel, enquanto se deliciava com as bolachinhas que acompanhavam sua xícara de café com leite.

VEJA — É verdadeira a notícia de que as Farc e o Exército de Libertação Nacional (ELN) serão impedidos de ser membros do Foro de São Paulo, a partir deste encontro em Montevidéu?

Pomar — Não existe uma filiação ao Foro. Nenhum desses grupos, portanto, pode ser chamado de membro do Foro. Basta se inscrever e vir participar. Assim como você se inscreveu e está aqui.

Eu estou aqui como jornalista, é diferente.

Seja como for, você não vai ver ninguém das Farc aqui porque a inscrição de qualquer grupo que queira participar do Foro é submetida à aprovação dos partidos que fazem parte do Grupo de Trabalho. Se o PP [Partido Progressista] brasileiro resolvesse se inscrever, por exemplo, certamente não seria aceito porque o PT barraria. Se as Farc quisessem se inscrever, o que aconteceria? O PDA [Polo Democratico Alternativo, do ex-candidato à presidência Carlos Gaviria], da Colômbia faria o quê? O que você acha que faria?

Não sei.

Não permitiria, claro.

Quando as Farc deixaram de participar do Foro?

As guerrilhas colombianas — não apenas as Farc, veja bem, porque há outros grupos — há muitos anos deixaram de vir, até porque a situação da guerra não lhes permite. Na década de 90 havia uma situação de negociação das Farc com o governo e naquele período a presença delas em eventos na região era pública e notória.

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O texto de convocação do Foro em Montevidéu fala em combate à corrupção e ao narcotráfico. Trata-se de um mensagem velada às Farc de que não são bem-vindas?

Não, não é nenhuma mensagem velada. Este tema está no texto porque nos preocupa. O narcotráfico é um problema para a região e, portanto, também o é para a esquerda. Eu vejo a Colômbia da seguinte forma: o problema lá não são as Farc em si, é a guerra. Trata-se de um conflito que tem como atores o estado colombiano, os paramilitares e a guerrilha. Classificar as Farc de terrorista significa tratá-las como um grupo criminoso, e ninguém negocia com criminosos. Só que para solucionar a guerra na Colômbia, é preciso negociar. Não é a solução que o atual governo colombiano quer, que é matar a todos. A guerra colombiana tem 40 anos e os grupos guerrilheiros estão nesse contexto histórico. Não concordo com seus métodos, mas não se trata de uma guerrilha artificial. Ela tem causas sociais e políticas.

As Farc tem como meta derrubar pelas armas um governo democraticamente eleito. No texto de convocação do Foro há claramente a defesa da via eleitoral para chegar ao poder. Trata-se de uma tentativa de o Foro se posicionar a respeito da questão das Farc, com seus métodos de seqüestro, tortura e mortes?

Essa posição acompanha o Foro desde sua fundação. Nós tentamos deixar claro que a via eleitoral é o caminho. Mas a realidade colombiana é complexa. Os interessados em manter a guerra como está são a direita colombiana, que tem ligações com os paramilitares e o narcotráfico, e os Estados Unidos, que assim tem uma justificativa para sua presença militar na região. É preciso negociar.

Uma vez que não se deve classificar as Farc como criminosas e que é legítimo negociar com seus membros, nada impede que o grupo tenha ligações com outras organizações da região. Nesse sentido, o PT mantém algum tipo de relação com as Farc?

O PT, como instituição, não tem nenhum relação com as Farc. Se algum membro do PT, como pessoa, tem alguma relação, é por sua conta e risco. Eu não sei de ninguém que tenha contato com as Farc, nem de ouvir falar. Quando prenderam aquele padre, o Olivério Medina, houve alguns membros do partido que assinaram uma petição para que ele não fosse extraditado, mas ali é outro caso, tratava-se de uma questão de direitos humanos.

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