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O detalhe que Ivete e Ludmilla ocultaram sobre cancelamentos de turnês

Artistas acusam produtora 30E — mas o buraco é bem mais fundo (e triste)

Por Felipe Branco Cruz Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 22 Maio 2024, 11h13 - Publicado em 16 Maio 2024, 11h30

Ivete Sangalo e Ludmilla fizeram nesta quarta-feira, 16, pronunciamentos semelhantes para justificar o cancelamento de suas mega-turnês que seriam realizadas neste ano. Os comunicados seguidos de vídeos em tom de desabafo no Instagram apontam os dedos para a produtora 30e, acusada de não cumprir as condições previstas no pré-contrato e a falta de organização da empresa. As reclamações das duas artistas são válidas e corretas. O que elas esqueceram de mencionar — e talvez seja esta a razão mais importante para os cancelamentos — é que nenhuma das duas vendeu a quantidade de ingressos esperada para a magnitude dos shows propostos. Não há dúvidas de que, se ambas tivessem lotados estádios e vendido ingressos na velocidade da luz, como Bruno Mars vendeu recentemente, as turnês seriam realizadas pela produtora, que se desdobraria para resolver os problemas apontados. Aqui vale lembrar aquele velho ditado do caçador que arrumou inúmeras desculpas para justificar o fato de não ter atirado no cervo. Ele disse que ficou com dó do animalzinho, que estava com problema de visão e não acertou a mira, que o clima não estava favorável etc. Mas, a verdadeira razão, justamente a única que importava, ele não disse: não havia bala na espingarda.

O anúncio dos cancelamentos das turnês que Ivete e Ludmilla fariam neste ano pode até ter pegado alguns fãs de surpresa, mas, nos bastidores do mercado, já se sabia que as vendas eram pífias. Seduzidas pelo canto da sereia da 30e, que demonstrou sua capacidade de realizar mega-eventos, como no caso do Titãs Encontro, ambas acreditaram que a produtora repetiria o sucesso com elas. De fato, tanto Ivete quanto Ludmilla tinham projetos tão grandiosos quanto o dos Titãs, mas faltava a elas algo que a reunião do octeto paulistano tinha e que ambas não têm: trata-se do tal marketing de escassez, aquele que desperta nas pessoas o senso de urgência, o medo de perder uma oportunidade. É a sensação que leva uma pessoa a pensar: “preciso ir nesta apresentação, pois será única”. O exemplo mais recente de sucesso desse marketing é a turnê de Caetano e Bethânia, que lotou estádios ao redor do Brasil até o fim do ano.

Ludmilla e Ivete fazem shows frequentemente. Ambas aparecem toda semana na TV e, claro, só têm essa visibilidade porque são artistas extraordinárias e competentes. Mas, daí, imaginar que 50.000 pessoas pagariam caro para vê-las em um estádio, mesmo na maior cidade do país, em São Paulo, é um salto distante. Não há escassez de Ivete. Ela está em micaretas, festivais, em festas de aniversário de cidades. O público entendeu que não precisa desembolsar um valor alto para vê-la. De novo: isto não tem nada a ver com a qualidade das artistas.

E por que custa caro? Porque ambas pensaram em shows com uma estrutura monumental. Para fazer a conta fechar, o preço do ingresso precisa ser alto — em torno de 150 reais a 3.000 reais. Na hora do público escolher onde alocar seus recursos, ele vai preferir pagar para ver Bruno Mars ou Caetano e Bethânia, que ofereceram entradas por valores parecidos. Resultado:  Ivete e Ludmilla acabaram encalhadas na praia — em alguns lugares, menos de 1.000 ingressos foram vendidos para um estádio com capacidade de 30.000 pessoas.

Para arrematar a tempestade perfeita, há uma saturação do mercado com festivais, shows em estádios e eventos além da capacidade do público de comparecer. Durante a pandemia, analistas disseram que o fim da quarentena traria o desaguamento rápido dos shows represados e a saturação seria iminente. A conta chegou.

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Por fim, as reclamações de Ivete e Ludmilla sobre a produtora 30e tem sua verdade. A empresa vendeu ilusões a ambas, oferecendo mundos e fundos sem equalizar as expectativas. Além disso, em três anos de existência, a produtora já acumulou problemas. Em março, o jovem João Vinícius Ferreira Simões, de 25 anos, morreu eletrocutado durante um festival promovido por ela. Segundo um levantamento do Uol de certidões de débitos trabalhistas da empresa, eles acumularam, em três anos de existência, multas trabalhistas no valor de 2,6 milhões de reais, ligadas ao descumprimento de regras de CLT. O buraco se revela ainda mais fundo.

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