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‘Jogos do Rio podem superar os de Barcelona’

Especialista em marketing de grandes eventos esportivos, com atuação em Londres e, agora, nos jogos do Brasil, Mike Lee diz que não há modelo a ser copiado

Por Flávia Ribeiro, do Rio de Janeiro
24 ago 2011, 07h09

“As pessoas mostram que estão pensando em como será bom estar no Brasil durante esses eventos”

A imagem que o grande público tem dos grandes eventos esportivos é uma especialidade do inglês Mike Lee. Diretor de Comunicações e Assuntos Públicos da candidatura de Londres aos Jogos Olímpicos de 2012 e conselheiro de marketing nas candidaturas do Rio de Janeiro aos Jogos Olímpicos de 2016 e do Qatar à Copa do Mundo de 2022, Lee acredita que o Rio tem chance de sediar uma Olimpíada ainda mais impactante que a de Barcelona. Se a aposta se confirmar, a missão da cidade e dos organizadores terá sido bem-sucedida. Barcelona é, até hoje, considerado o melhor exemplo de marketing e de legado de uma competição olímpica. “Barcelona não se vê muito como Espanha, a Catalunha é uma região à parte. Penso que o Rio pode ser até melhor em relação à transformação e ao potencial para a economia do Brasil, porque o Rio representa o Brasil”, acredita ele, que diz ter uma visão própria do que deve orientar o percurso da cidade até 2016: “O Rio não deve copiar ninguém. O Rio deve ser o Rio”.

Há uma grande expectativa do Brasil em relação aos Jogos de 2016. O que o mundo espera desse evento?

Acredito que haja muito interesse da mídia internacional no Brasil, por inúmeras razões. O Brasil tem sido visto como uma história de sucesso, politicamente estável, economicamente forte, com uma posição importante no G-20, um papel de liderança na comunidade internacional. Quando você soma isso ao fato de que haverá a Copa do Mundo em 2014 e as Olimpíadas em 2016, cria muita excitação em relação a esses eventos. Acho que internacionalmente há um sentimento de boa vontade em relação ao Brasil, todos conhecem sua paixão pelo esporte, pela celebração, pelo Carnaval… A cobertura da mídia internacional é muito positiva, as pessoas mostram que estão pensando em como será bom estar no Brasil durante esses eventos.

Como é seu trabalho com o Comitê Rio 2016 atualmente?

Estou trabalhando no projeto da Casa Brasil em Londres. É parte dos Jogos Olímpicos, parte do movimento olímpico. As casas olímpicas ficam abertas durante as Olimpíadas e as Paraolímpiadas. Como o Brasil é a sede seguinte, Londres é um momento importante. É uma grande oportunidade de promoção, não apenas de promover o Rio e o Brasil, mas também para os patrocinadores da Rio 2016. Vai ser também um lugar para a mídia trabalhar em Londres, um lugar onde pode-se receber convidados, o lugar para se festejar quando a chama sair da Inglaterra para o Brasil. A locação é ótima, na Somerset House, à beira do Rio Tâmisa. Todos os principais comitês – os alemães, franceses, italianos, suíços, japoneses, coreanos – terão casas olímpicas.

Como se transforma uma marca olímpica em dinheiro?

Uma ma das coisas que acontecem quando você está prestes a sediar Olimpíadas é que você automaticamente se conecta com os patrocinadores top do COI (Comitê Olímpico Internacional), que se movem de uma competição para outra, como Coca-Cola, McDonald’s, Visa, Samsung. Uma certa porcentagem do dinheiro que eles dão para o COI é automaticamente repassada para o Comitê Organizador, para ajudá-lo a levantar os Jogos em seu país. Em adição a isso, o Comitê Rio 2016 está também fazendo negócio com patrocinadores líderes. É uma parte normal do negócio, e eles passam a ter o direito de usar a marca olímpica. E claro que para o Comitê organizador isso é uma parte crucial do financiamento dos jogos. Em geral, com os Jogos Olímpicos, você quer garantir que o Comitê Organizador não perca dinheiro.

O que a cidade sede ganha?

Fui diretor de comunicação da campanha de Londres 2012, e lá tem havido muito investimento do governo em novas linhas de transporte, novas acomodações, na construção de instalações esportivas. Se você olhar a campanha do Rio, vai ver que esses investimentos estão apontados aqui com muita veemência, e que o Rio vai se beneficiar. Não apenas os Jogos, mas a cidade, as gerações futuras. É um jeito de se olhar: isso não é apenas sobre os Jogos, é sobre um legado de longo prazo, é sobre melhorar a infraestrutura e o transporte, é sobre desenvolver áreas da cidade. Carlos Nuzman e seu time estão trabalhando muito próximos do governador e do prefeito, e eu sei que essa é a visão que eles têm: um quadro de longo prazo, não apenas as Olimpíadas.

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Como saber se investimentos dessa magnitude não vão resultar em elefantes brancos?

Uma das coisas que o time do Rio está fazendo desde o início da campanha é procurar uma forma de esses investimentos serem úteis no futuro. Então todas as mudanças no transporte e os planos para os aeroportos, por exemplo, são claramente para o futuro. Em relação às instalações esportivas, há uma visão para muitas delas também, que se tornarão parte do Parque Olímpico, com uso pelas futuras gerações de atletas. Outras serão temporárias. Eu não vejo nenhum elefante branco no Rio.

Vista geral do projeto vencedor do concurso para o Parque Olímpico do Rio de Janeiro
Vista geral do projeto vencedor do concurso para o Parque Olímpico do Rio de Janeiro (VEJA)

E em Londres, haverá?

Não sei. Todos os planos estão vindo a termo agora em Londres. Uma companhia de legado está sendo criada e seu trabalho é garantir justamente que as instalações tenham uso futuro. Assim como no Rio, algumas instalações em Londres serão temporárias. Mas os planos de legado ainda estão sendo feitos, é um processo em andamento. Não há como se esperar que qualquer comitê organizador tenha todos os planos fechados desde o início, mas eu sei que no Rio há um planejamento de legado muito claro em relação à vila dos atletas e às instalações esportivas, que em alguns casos serão usadas para treinamento, em outros para competições. A abordagem que o Rio fez é a correta.

Qual é o impacto da cobertura da imprensa no Rio e em Londres?

É muito positivo. Qualquer grande cidade tem desafios e problemas, mas as pessoas têm uma impressão muito boa do Brasil e do Rio, em geral. Normalmente a imprensa nacional tende a ser crítica, no Rio ou em Londres. A imprensa nacional tende a olhar os problemas, reparar nos detalhes, e isso é natural. Mas internacionalmente há muitos sentimentos positivos. E uma coisa importante, nos próximos cinco anos, é tirar vantagem disso.

Qual foi o maior desafio na campanha da candidatura?

O maior desafio foi o Rio ter tentado duas vezes antes e não ter sido bem sucedido. Havia um certo sentimento no COI, eles não tinham certeza se o Rio entregaria os Jogos, se o Rio estava pronto, e havia preocupações em relação à segurança. Mas a grande sacada da campanha brasileira foi que essas questões foram levantadas, e não escondidas ou ignoradas. Nós falamos muito positivamente sobre a importância da economia, sobre o programa de investimentos do governo, mas também sobre políticas de segurança pública que estavam sendo desenvolvidas. Numa campanha olímpica, que está sendo acompanhada pelo mundo inteiro, você tem que mostrar que conhece os seus problemas e apresentar soluções. Então a campanha do Rio foi sobre celebração, sobre paixão, sobre o clima maravilhoso da cidade, mas também foi clara sobre problemas como o de segurança.

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Qual é o maior desafio agora?

Para qualquer comitê organizador, é garantir que tudo será entregue no prazo. Mas, por tudo o que tenho visto, o COI está encantado com o trabalho que o comitê e os três níveis de governo estão fazendo. Seu último relatório sobre o Rio mostra esse encantamento. É um ciclo de sete anos, ainda faltam cinco, é muito trabalho a ser feito. Mas estive no Comitê organizador ontem, conversei sobre o que está sendo feito e minha sensação é que eles estão nos trilhos.

Entre uma Olimpíada e outra, há uma verdadeira revolução tecnológica. Baseado na sua experiência, o que podemos esperar das iniciativas de marketing em 2016?

É difícil prever, porque as mídias digitais e sociais estão mudando muito rapidamente. Voltando à campanha de candidatura de Londres, em relação à do Rio parecem anos-luz de distância quando se pensa em mídias sociais, ao mundo online, twitter, facebook. O Rio já tem uma atividade nessa área maior do que Londres, pois começou com muito mais foco nessa área. E o logo do Rio foi desenhado para ser 3D, o que é uma perspectiva muito estimulante em relação ao marketing no mundo digital.

Qual é o melhor exemplo de marketing em grandes eventos esportivos?

Em termos de Jogos Olímpicos, acredito que foi Barcelona. E uma das razões foi que Barcelona usou os Jogos para transformar a cidade, modernizá-la, conseguir novos investimentos. Assim como o Rio vai fazer, Barcelona transformou seu porto, a vila olímpica se tornou novas acomodações para a cidade. Barcelona se tornou, de cidade esquecida, no terceiro destino de visitantes internacionais na Europa, e os Jogos Olímpicos deram um tremendo impulso nisso. Até hoje eu pesco imagens de Barcelona, na TV, dos Jogos de 1992. Se você viaja para lá, os moradores falam de como os Jogos mudaram a cidade. Então Barcelona é não só um grande exemplo de sucesso em marketing, mas de transformação de uma cidade.

E qual é o pior exemplo?

Ainda em termos de Jogos Olímpicos, se você olhar em relação a legado e à memória dos Jogos, Atlanta 1996 foi muito criticada. Como evento de esporte, foi uma Olimpíada fantástica. Mas eles foram criticados por não lidar apropriadamente com a imprensa, por não haver um legado claro em relação às instalações – muitas delas simplesmente fecharam. E ainda houve um atentado terrorista no Parque Olímpico. Então mesmo que os eventos esportivos tenham sido bons, falhou-se em outras frentes. Porque os Jogos Olímpicos são mais do que duas semanas de esporte, e em relação a isso eu vejo que o Rio tem uma posição muito forte.

O Rio pode fazer um evento tão bom quanto o de Barcelona?

Talvez até melhor. O Rio pode superar Barcelona. Se você olha para Barcelona em relação à Espanha, percebe quea cidade não se vê muito como Espanha, a Catalunha é uma região à parte. Por isso penso que o Rio pode ser até melhor em relação à transformação e ao potencial para a economia do Brasil, porque o Rio representa o Brasil. Então foi ótimo para Barcelona, mas não tenho certeza se teve tanto impacto para a Espanha como as Olimpíadas do Rio podem ter para o Brasil, em desenvolvimento esportivo e em imagem internacional.

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Pensando em Olimpíadas mais recentes, como você analisa as de Atenas e Pequim?

Atenas sofreu um pouco com o esvaziamento da cidade. Muitos dos seus moradores deixaram Atenas durante os Jogos e foram passear pelas Ilhas Gregas. E não houve uma grande campanha internacional, eles não atraíram tantos visitantes. Essa é uma outra vantagem do Rio, as Olimpíadas têm grande suporte dos brasileiros, eles se sentem inspirados por ela, querem estar lá, fazer parte disso. Além disso, em Atenas não se pensou tanto sobre o legado, e eles tiveram elefantes brancos lá. E uma coisa que eu ouvi o prefeito do Rio dizer é que o plano geral urbanístico dos Jogos Olímpicos é o plano geral urbanístico da cidade. Eles estão integrados, foram pensados. Já Pequim foi muito bonito, um momento incrível, havia grandes estruturas. Mas é diferente do Rio porque não se sabe ao certo quanto custou nem o que ficou de legado porque não foi um assunto discutido abertamente. O Comitê organizador chinês tem que levar o crédito por uma bela Olimpíada, que fez diferença para a imagem da China no exterior. Mas você não pode comparar a China com o Brasil simplesmente porque na China não há democracia, e democracia significa que você tem uma imprensa independente. O legal das Olimpíadas é que a cada edição elas são realizadas em países com diferentes culturas, e o Rio não deve copiar ninguém. O Rio deve ser o Rio.

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