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Críticas e análises sobre o universo da televisão e das plataformas de streaming
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‘Onde Está Meu Coração’ desperdiça potencial ao se tornar novelão da Globo

Estrelada por Letícia Colin, como uma médica viciada, minissérie se perde ao dar espaço para coadjuvantes que em nada acrescentam ao drama da protagonista

Por Amanda Capuano Atualizado em 12 Maio 2021, 21h28 - Publicado em 12 Maio 2021, 16h19
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  • A proposta é boa: uma jovem médica de classe alta se envolve com drogas e vê a vida virar de ponta cabeça por causa do vício. O enredo de Onde Está Meu Coração, minissérie que chegou ao Globoplay no início do mês, é terreno fértil para as séries médicas, e não à toa: segundo um estudo feito em 2013 pelo Journal of Addiction Medicine, 69% da classe já abusou de substâncias prescritas para “aliviar o stress de dores físicas e emocionais”. O grande vilão é o opioide, substância presente em remédios como a Oxicodona, vício da neurocirurgiã Amelia Shepherd, em Grey’s Anatomy, e do Dr. Evandro, na brasileira Sob Pressão, e o Vicodin, narcótico usado por House em Dr. House.

    Na trama protagonizada por Letícia Colin, em uma interpretação primorosa e de rara intensidade, o veneno que a leva ao fundo do poço é outro: Amanda, sua personagem, é introduzida ao crack pelo namorado Miguel (Daniel de Oliveira), que optou por experimentar a substância. O arquiteto não fica viciado, mas a namorada, que tem histórico de dependência na família, não teve a mesma sorte. Logo no primeiro episódio, transmitido pela Globo na TV aberta, a jovem revela os terrores da recaída, levando seus pais e o marido a optarem por interná-la compulsoriamente. Com bons atores e uma fotografia que transmitia de forma poética as dores da família, a minissérie se mostrou ali bastante promissora — pena que acabou, como muitas minisséries da Globo, enveredando para os clichês folhetinescos e perdendo assim sua aparente originalidade.

    Nas tramas secundárias da minissérie estão elementos típicos do DNA do horário nobre, como a dualidade entre a irmã certinha e a problemática, o apego do brasileiro pela religiosidade e promessas, muito presente na recém finalizada Amor de Mãe, na figura de Dona Lourdes (Regina Casé), e a obsessão de uma mulher poderosa por um homem apaixonado por outra — relação que se repete exaustivamente em vários títulos globais.

    Em um país em que as novelas são campeãs absolutas de audiência, não há demérito algum na comparação, não fosse o fato de que a minissérie escorrega no formato para soar superficial. Ao contrário das tramas televisivas, que passam meses, e até anos no ar, com espaço de tela suficiente para o desenvolvimento de vários núcleos, uma produção de dez episódios tem suas limitações. O principal desafio é contar a história de personagens secundários de maneira aprofundada, ao mesmo tempo em que se dá o devido foco à protagonista — e é justamente aí que a produção falha: Amanda se torna apenas mais uma peça em um mar de excessos melodramáticos.

    Vivian (Camila Márdila), por exemplo, é apresentada como uma mulher poderosa e independente, mas logo se mostra obcecada por Miguel, e é resumida ao papel de pivô de conflitos no relacionamento do arquiteto com Amanda, para complicar ainda mais a vida da protagonista. A morte de Davizinho, o caçula da família, também entra nesse limbo: o menino faleceu ainda criança em um acidente doméstico que Júlia (Manu Morelli), a irmã do meio, diz ser culpa de Amanda. O que realmente aconteceu fica no ar, diluído entre flashbacks que pouco acrescentam na construção psicológica da protagonista e alfinetadas da irmã nada cativante, que tem a sua própria narrativa também escanteada: depois da morte da criança, ela pediu a Deus que curasse sua família e, em troca, se casaria virgem. A relação com a religião se restringe ao conflito entre quebrar ou não a promessa, que em nada acrescenta na relação das irmãs, muito menos conquista por si só.

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    Onde esta meu coração
    Sofia (Mariana Lima), Amanda (Letícia Colin) e David (Fábio Assunção) em Onde Está Meu Coração, minissérie de 10 episódios disponível no Globoplay (Globoplay/Divulgação)

    A falta de foco do roteiro, porém (e ainda bem), não consegue ofuscar o talento e versatilidade de Letícia Colin, capaz de entregar desde o drama de alguém que luta contra um vício até o humor da trama de Cine Holliúdy, outra minissérie de sucesso que conta com a atriz entre os protagonistas. A relação de Amanda com a mãe Sofia (Mariana Lima) é outro ponto alto, capaz de despertar empatia pelo sofrimento materno — mais até do que o aguardado desempenho de Fábio Assunção, ele mesmo um dependente em recuperação, no papel de David, o pai da moça. Talvez o próprio e o desenvolvimento de seu personagem tenham sido prejudicados pelo espaço gasto com coadjuvantes desnecessários. Fica então o alerta: às vezes uma única (e boa) história é mais que o suficiente para uma boa série.

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