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Quem pena e quem comemora, fora dos EUA, uma derrota de Trump

A diferença com Joe Biden está aparecendo em todas as pesquisas e ninguém resiste a especular sobre como seria o mundo pós-Trump

Por Vilma Gryzinski 26 out 2020, 08h40
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  • Os nomes principais do time dos que vão abrir champanhe na noite de 3 de novembro, se a votação confirmar o resultado das pesquisas – cada vez mais apertado -, praticamente diz tudo: Irã e China.

    Cuba também pode projetar uma volta à aproximação quase incondicional estabelecida durante o governo Obama.

    Muitos aliados europeus também vão comemorar.

    A insistência de Donald Trump em cobrar a conta da aliança militar em que os Estados Unidos entram com tudo – nada menos que 70% do total – e os outros com alguma coisinha. Tipo menos que 2% do PIB, a meta estabelecida para todos, mas pouco cumprida.

    Isso é especialmente válido para a Alemanha, que prometeu igualar os gastos dos Estados Unidos a partir de 2021. 

    A primeira-ministra Angela Merkel, que nunca escondeu o esforço feito nos contatos com Trump, não terá muito tempo para comemorar: vai sair da política por livre vontade, também no ano que vem.

    Só uma diferença grave na coalizão de governo, ou um resultado negativo no processo por corrupção, tirariam Benjamin Netanyahu do poder em Israel, onde sobrevive com um constante exercício de equilibrismo político e uma certa ajuda de Trump.

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    Se o presidente americano perder a reeleição, não terá tempo de cobrar a contrapartida para os gestos históricos que fez ao reconhecer Jerusalém como a capital de Israel e as montanhas de Golã como parte do território israelense.

    Em troca, se chegasse lá, esperaria a criação de um Estado palestino dentro dos planos apresentados por Jared Kushner, o genro de Trump que conheceu momentos de vitória quando os Emirados Árabes Unidos, o Bahrain e, agora, nos últimos minutos, o Sudão, aceitaram normalizar relações com Israel.

    É claro que todos esses países saem perdendo com uma derrota de Trump.

    Mesmo que um futuro governo Biden não cancele – nem menospreze – a rara aproximação, dificilmente vai seguir a estratégia trumpista de “começar pelo fim”, promovendo a normalização com Israel antes da criação de um Estado palestino.

    Isso só foi possível por causa da percepção de que o Irã é a grande ameaça em comum, contra a qual valeria a pena sacrificar alguns princípios da tradicional frente unida árabe em favor da causa palestina.

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    O maior promotor da tese é Mohammed Bin Salman, o herdeiro do trono saudita que desponta como um dos grandes perdedores com uma derrota de Trump.

    A maior de todas as dúvidas em matéria de política externa é se Joe Biden recuaria na estratégia de confronto com o Irã e voltaria ao acordo sobre o controle da eventual conversão bélica do programa nuclear iraniano.

    O acordo, legitimamente contestado por opositores e detonado por Trump, foi negociado durante o governo Obama, com participação de Biden como vice.

    Como presidente, ele enfrentaria um dilema: voltar ao acordo e levantar sanções, numa manifestação que inevitavelmente será interpretada como fraqueza, ou procurar alguma cortina de fumaça para o entreguismo.

    Tony Blinken, o principal assessor de Biden para política externa, já deu a entender que o acordo seria “reforçado” e mais todo aquele blá-blá-blá sobre cooperação com os aliados para não permitir que o Irã saia da linha.

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    O blá-blá-blá é compreensível: em campanha, os candidatos não podem se comprometer com propostas fechadas em áreas altamente voláteis.

    Mesmo assim, é difícil imaginar Joe Biden mandando pulverizar o general Qasem Suleimani, o cabeça das intervenções externas iranianas, como fez Trump no começo do ano.

    A eliminação de Suleimani foi um dos raros gestos agressivos de Trump no campo global. 

    Ao contrário da imagem mais tosca criada a seu respeito, Trump foi muito cauteloso em matéria de intervencionismo, a ponto de ser enquadrado na escola isolacionista.

    Essa cautela produziu um “hambúrguer de vento” – a aproximação com Kim Jong-un, que ficou só nos gestos de um balé entre parceiros altamente improváveis.

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    Por trás de todos os enigmas do delirante regime norte-coreano existe uma realidade muito simples: a China, que tem o poder de literalmente desligar a luz de Kim e companhia, não vai abrir mão de um instrumento de pressão regional e global como a Coreia do Norte.

    O que nos leva de volta ao início: qual será a política de um governo Biden em relação à China, a mais importante questão existencial do palco global.

    “Todos nós reconhecemos que a China representa o maior desafio que enfrentamos por parte de outro estado-nação”, disse Tony Blinken no mês passado.

    Como enfrentá-lo, segundo uma potencial doutrina Biden?

    “Temos que começar nos colocando numa posição de força a partir da qual nosso relacionamento com a China avance, mais em nossos termos do que nos deles”.

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    E a guerra tarifária com a qual Trump pretendia exatamente fazer negócios nos “nossos termos”?

    Dificilmente Joe Biden teria o mesmo topete. Metafórico, claro. 

    Político de carreira, convencional e pouco dado a arroubos de grandeza, ele não teria a audácia – alguns diriam insensatez – de Donald Trump ao pretender uma mudança de longo alcance nas regras do jogo comercial com a China.

    Com países menos vitais, como a Grã-Bretanha do Brexit e o Brasil de Jair Bolsonaro, Joe Biden tem mais espaço para crescer e até empacar acordos comerciais importantes.

    Em julho do próximo ano, termina a autorização especial que o Congresso deu ao presidente para fechar acordos comerciais.

    Em relação ao Brasil, Biden até insinuou sanções comerciais para salvar as florestas tropicais. 

    Ou então dar aqueles 25 bilhões de dólares que considerou adequados, no primeiro debate com Trump, para “comprar” a segurança da Amazônia.

    Fora a falta de noção, Biden tem uma ideia razoável do Brasil, um pouco mais elaborada do que a dos presidentes americanos em geral. 

    Ele, com a assessoria de Tony Blinken, então subsecretário de Estado, foi encarregado, como vice-presidente, de acalmar a birra de Dilma Rousseff por ter sido gravada, como todo mundo mais, pelo gigantesco dispositivo americano de escuta eletrônica.

    Blinken citou até Fernando Brant, então recém-falecido, para exaltar a amizade entre Estados Unidos e Brasil.

    Um amigo como o Brasil, que não cria problemas para a superpotência americana, é realmente para se guardar do lado esquerdo do peito.

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