O vespeiro do CNJ na simplificação de serviços de cartórios
Cartorários mais ricos tentam reverter modernização por meio de lobby e farpas públicas
O acirramento de rusgas entre tipos de cartórios, além do lobby pesado daqueles mais ricos, marcam o derradeiro mês do prazo para o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) instalar o Operador Nacional do Sistema de Registros Públicos (ONSERP), que será o órgão responsável por centralizar e agilizar serviços cartoriais em nível nacional.
Embora a modernização – trazida pela Lei 14.382/2022 – seja o anseio de todo cidadão e empresário, em função de tempo e dinheiro despendidos com diversos atos e transações, cartorários mais ricos ainda tentam reverter a tendência e fazer uma espécie de reserva de mercado para garantir obrigatoriedades e custos que estão sendo derrubados ou relativizados a cada decisão do CNJ.
Mal iniciada a legislatura no Congresso Nacional, por exemplo, há projetos de lei elaborados este ano contrariando a simplificação.
Desde a promulgação da Lei 14.382, em junho do ano passado, não foram poucas as mudanças concretizadas por medidas do atual Corregedor Nacional de Justiça, o ministro Luis Felipe Salomão.
O Corregedor e seus auxiliares do CNJ têm reiterado, em audiências públicas sobre a implantação do SERP, a diretriz de proporcionar aos cidadãos novas modalidades de serviços cartoriais digitais que signifiquem facilidade, menos custos e prazos bem menores para pessoas e empresas.
Na contramão do processo, por exemplo, o senador Hamilton Mourão apresentou o projeto de lei complementar 77 (de março/2023), proporcionando um salto na rentabilidade de cartórios ao criar uma nova etapa de identificação cartorial para o simples ato de abrir uma conta bancária por meios eletrônicos.
Sob o argumento de fraudes no sistema financeiro, o texto do parlamentar quer instituir a obrigatoriedade de todo correntista realizar um “Cadastro Digital Certificado”, a um custo de R$ 15, nos serviços eletrônicos dos cartórios de Notas, instituições financeiras e empresas de certificação, com entrega de uma série de documentos e informações pessoais.
O certificado só seria válido por até dois anos. Com o detalhe de que os próprios bancos já possuem uma série de procedimentos de segurança, com investimentos de bilhões e esforços de autorregulamentação da Febraban, para identificar usuários de serviços financeiros.
Proposições legislativas à parte, os ambientes acadêmicos e os fóruns de discussão jurídicos se transformaram em palco da guerra aberta de teses, e também acusações, sobre interesses contrariados e supostos malefícios do SERP.
Posicionamentos públicos de cartorários milionários de atividade registral, por exemplo, compararam o SERP ao “genocídio ianomâmi”. Uma das mudanças trazidas trouxe grande perda de receita para registradores de tipos de documentos como contratos bancários, porque se eliminou a necessidade de registro em duplicidade nas bases territoriais do banco e das demais partes contratantes.
Outra mudança que foi pivô de críticas ao CNJ foi a regulamentação da união estável, que trouxe novos instrumentos de formalização que quebraram o “monopólio” dos tabeliães de notas – e, portanto, rendimentos vultosos.
Todo cenário indica que o SERP está na direção certa e tem enorme potencial de avanços para a maioria da sociedade brasileira. Resta saber se isso irá se contrapor à aguerrida movimentação de alguns dos maiores cartorários do país. Daí os complexos (e seculares) obstáculos enfrentados pelo Ministro Salomão.