Uma sopa é mais do que uma simples refeição. É um prato que, além de alimentar, reconforta ao irradiar um calor gostoso, que aquece o corpo e a alma. Sopas são cobertores em estado líquido, que nos esquentam de dentro para fora. O inverno é a estação das sopas — e o plural se impõe pela inesgotável variedade. As sopas podem ser ralas ou encorpadas. De carne ou vegetais. De cebola ou queijo. Apimentadas ou suaves. Aveludadas ou com alguma crocância. Batidas no liquidificador ou cozidas no caldeirão. Podem ser entrada ou prato principal. São ainda quentes ou frias — estas apropriadas para um eventual calor fora de hora. Paro por aqui, a lista é extensa e certamente não caberia neste espaço.
Além de promoverem o aconchego térmico, as sopas são aliadas indispensáveis na luta contra a balança, o que é especialmente importante nesta época do ano, quando tendemos a comer mais do que o habitual. Não se trata de gula. Trata-se de uma reação normal do organismo. O frio nos convida a ingerir mais calorias e gorduras, prometendo manter nosso corpo aquecido.
É aí que entram as sopas. É claro que tudo depende dos ingredientes e da quantidade, mas, em princípio, um bom prato de sopa, no almoço ou no jantar, costuma ter menos calorias que uma refeição sólida que ofereça a mesma sensação de saciedade. Durante o regime que, muitos anos atrás, me fez perder peso, minha receita de sopa de legumes era um lembrete de que dietas não são necessariamente só sacrifício.
“O clima mais frio do inverno pode nos ajudar a emagrecer. Mas prudência e caldo de galinha não fazem mal”
Caseiras por excelência, as sopas convidam ao convívio familiar. À mesa, em torno de um prato fundo fumegante que nos obriga a procurar as bordas com a colher, apresenta-se a oportunidade perfeita para colocar a conversa em dia, enquanto esperamos, sem pressa, a temperatura se ajustar para o consumo. Mas quem disse que a sopa não faz boa figura também em grandes ocasiões? Jacqueline Kennedy não dispensava um consomê nos banquetes que oferecia na sede do governo americano, sempre preparados pelo chef francês René Verdon, que naquele início dos anos 60 comandava a cozinha da Casa Branca, acrescentando um toque de inovação à sua formação gastronômica clássica. Quando recepcionou André Malraux, ministro da Cultura de Charles de Gaulle, a sofisticada e simples Jackie optou pelo consomê madrilène iranien, à base de caldo de galinha, cebola, salsão e alho-poró. A preferência por determinadas sopas é reveladora de estilos de vida. Enquanto a esbelta primeira-dama dos Estados Unidos valorizava a delicadeza, Napoleão Bonaparte apreciava a consistência. Sua famosa “sopa do soldado”, como foi apelidada, era uma mistura espessa de feijão-branco, batata e legumes à qual o imperador da França acrescentava um condimento à base de azeite, alho, tomate e manjericão — uma refeição e tanto, embora não tenha sido suficiente para vencer o “General Inverno”.
E por falar em inverno, a boa notícia é que o clima mais frio, ao contrário do que se imagina, pode nos ajudar a emagrecer. A exposição a baixas temperaturas pode reverter a inflamação causada pela obesidade, segundo um estudo recente. Só não há desculpa para baixarmos a guarda. Afinal, prudência e caldo de galinha não fazem mal a ninguém.
Publicado em VEJA de 13 de julho de 2022, edição nº 2797