Assine VEJA por R$2,00/semana
Imagem Blog

Mundialista Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO

Por Vilma Gryzinski
Se está no mapa, é interessante. Notícias comentadas sobre países, povos e personagens que interessam a participantes curiosos da comunidade global. Este conteúdo é exclusivo para assinantes.
Continua após publicidade

França da era Covid: cem mil mortos, UTIs cheias, presidente culpabilizado

Emmanuel Macron não está bem na avaliação popular e a falta de controle sobre a pandemia é o fator que mais pesa contra ele

Por Vilma Gryzinski Atualizado em 30 mar 2021, 11h44 - Publicado em 30 mar 2021, 06h41

Proporcionalmente ao tamanho da população, as mortes por Covid-19 na França se equiparam às no Brasil: 1.447 por milhão de habitantes, contra 1.462.

Muitas outras circunstâncias são, obviamente, incomparáveis. A França tem um PIB per capita de país rico, 45 mil dólares, e um serviço público de saúde muito mais equipado.

As outras coincidências se devem à natureza tristemente igualitária da pandemia que já matou cem mil pessoas em território francês. 

Emmanuel Macron é acusado de privilegiar a economia sobre a saúde, e criticadíssimo por não ter decretado um segundo lockdown em escala nacional em janeiro, quando a onda de inverno do vírus já se mostrava altamente perigosa.

O ritmo da vacinação é exasperantemente lento, como em outros países da União Europeia, rondando os 10%. Se não for acelerado, os franceses vão esperar mais 62 dias para vacinar outros 10%. Macron lançou um plano para acelerar a imunização.

Continua após a publicidade

Como o bom exemplo em matéria de vacinação vem da Grã-Bretanha, com 50% da população adulta vacinada, os franceses têm que amargar a exultação dos aliados que amam desprezar, principalmente depois do Brexit. Ontem em Londres, por exemplo, nem uma única pessoa morreu de Covid-19.

Com a região de Paris e mais quinze departamentos em lockdown que não pode ser chamado, oficialmente, de lockdown, num exercício de ginástica linguística para que o governo não dê o braço a torcer, a situação nas UTIs é preocupante.

“Nós seremos obrigados a fazer triagem dos pacientes”, avisaram 41 intensivistas da região de Paris no Journal du Dimanche, usando o termo médico para a decisão entre quem recebe atendimento de UTI e quem fica de fora.

“Nos próximos quinze dias, com os contágios que já aconteceram, temos quase certeza sobre o número de leitos de cuidados intensivos que serão necessários e sabemos desde já que nossa capacidade de provê-los serão ultrapassadas ao fim desse período”, alertaram os médicos.

Continua após a publicidade

“Vai ser o caos”, disse, mais dramaticamente, Catherine Hill, epidemiologista de um hospital parisiense.

Como muitos outros críticos, ela acha que o governo errou ao não ouvir os especialistas e decretar um lockdown em janeiro, acusando Macron de seguir uma “estratégia da morte”.

“Posso reafirmar que não temos um mea culpa a fazer. Não tenho arrependimento nem vou fazer nenhuma admissão de fracasso”, teimou Macron na semana passada.

Com um estilo imperioso que ele mesmo denominou de jupiteriano, o presidente francês sofre da síndrome do geniozinho: como tem inteligência excepcional e domina fatos com a rapidez de uma máquina de raciocinar, acha impossível errar, mesmo quando as evidências apontam para o lado contrário.

Continua após a publicidade

Como ganhou quase miraculosamente a eleição presidencial de 2017, saindo do nada e concorrendo com um partido tirado do bolso do terno – sempre impecável, um produto da alfaiataria parisiense Jonas et Cie -, a síndrome do sabe-tudo ficou mais acentuada ainda.

Macron enfrenta nova eleição no ano que vem e sabe que sua atuação na pandemia será o ponto fulcral da campanha.

Atualmente, ele tem 37% de avaliação positiva, contra 60% do outro lado da balança.

Num segundo turno que, previsivelmente, vai repetir 2017, ele teria 52% dos votos, contra 47% para Marine Le Pen. 

Continua após a publicidade

É uma diferença notavelmente mais apertada do que a registrada na primeira eleição presidencial, quando a rejeição à candidata, saída de um partido que compartilhava tudo o que existe de pior na extrema direita na época de seu pai, resultou em 66% dos votos para Macron e 34% para ela.

É impossível não ligar a decisão macroniana de rejeitar o lockdown no começo do ano às pesquisas que indicavam que a opinião pública não queria uma nova quarentena coletiva.

Mas é difícil entender medidas como o toque de recolher a partir das seis da tarde, redundando em aglomerações nos transportes coletivos e no comércio de alimentos – exatamente o tipo de coisa que mais se quer evitar numa pandemia.

O horário já mudou, para 19 horas, mas os contágios continuam a crescer, passando de 40 mil por dia no momento, o que mantém o número de mortos num patamar que não cai.

Continua após a publicidade

“Como classificar um governo que decide deliberadamente deixar morrer quase 300 de seus compatriotas por dia, mesmo que pudesse evitar isso?”,  espetou a revista Marianne, disparando contra Macron a surrada acusação de ser “um presidente neoliberal que administra (mal) o país como um gerente, e não como dirigente político que serve ao interesse nacional”.

Espancado sistematicamente pela esquerda, que virou pó na última eleição e procura se rearticular, dividida como sempre, Macron procura espaços à direita tradicional.

É possível que a pandemia tenha um impacto eleitoral bem menor no ano que vem, quando já estarão absorvidas a morosidade na vacinação e as pisadas de bola de Macron, como dizer que a vacina da AstraZeneca era “praticamente não efetiva a partir dos 65 anos”, o que aumentou a relutância de uma parte da população.

Aí então estarão na linha de frente as consequências econômicas da pandemia. Muitos especialistas acham que o governo Macron reagiu bem, criando um bom colchão para amortecer o choque sofrido pelas empresas e pelos assalariados ou trabalhadores por conta própria .

O endividamento público francês estará ultrapassando os 120% do PIB, o maior da zona do euro. Em algum momento, a conta pode começar a ficar alta demais e nem a competência técnica e política de Macron, que é altíssima, conseguirá controlar o estouro.

Um presidente competente, consciente da liturgia do cargo, versado em praticamente todos os assuntos e menos sobrecarregado pela bagagem dos políticos tradicionais pode dar errado?

Seria muito triste ver isso acontecer.

Leia também:

  • Bolsonaro escolhe novo chefe do Itamaraty e anuncia outros nomes.
  • Pujol reúne alto comando do Exército para tratar de possível saída.
  • Demissão de Azevedo abre intervenção política de Bolsonaro na área militar.
  • ‘Bolsonaro pediu o cargo’, diz aliado de Fernando Azevedo.
  • Escolha de diplomata de carreira como chanceler traz alívio ao Itamaraty.
Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Domine o fato. Confie na fonte.

10 grandes marcas em uma única assinatura digital

MELHOR
OFERTA

Digital Completo
Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 2,00/semana*

ou
Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba Veja impressa e tenha acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 39,90/mês

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$96, equivalente a R$2 por semana.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.