STF retoma julgamento sobre foro privilegiado com duas teses diferentes
Ministros vão decidir se prerrogativa se limita aos crimes relacionados ao mandato ou a qualquer delito a partir da diplomação dos parlamentares
O Supremo Tribunal Federal (STF) retoma nesta quarta-feira o julgamento sobre a restrição do foro privilegiado para deputados federais e senadores, com a oposição de duas visões em torno do tema e o receio de integrantes da Corte de que um novo pedido de vista (mais tempo para análise) interrompa novamente o debate.
Até agora, sete ministros já concordaram com a tese de Luís Roberto Barroso, de que o foro deve ser limitado aos crimes praticados no exercício do mandato e em função do cargo. Já Alexandre de Moraes concordou com a restrição, mas em menor extensão. Para ele, a prerrogativa deveria valer para crimes cometidos a partir da diplomação dos parlamentares, independentemente de terem relação ou não com o cargo.
O julgamento do foro será retomado com o voto do ministro Dias Toffoli, que pediu vista em novembro do ano passado. Ele deverá acompanhar a tese de Moraes, considerada mais objetiva e com um marco temporal mais delimitado que a de Barroso.
Um dos receios de integrantes do STF é de que a proposta de Barroso dê margem a múltiplas interpretações. Há casos de políticos investigados no Supremo por terem recebido caixa dois na campanha eleitoral — antes, portanto, de assumir o mandato, o que dificultaria o entendimento se o processo se enquadra ou não na tese de Barroso.
Toffoli já sinalizou a interlocutores que a restrição do foro deveria valer não apenas para deputados federais e senadores, mas para outros cargos. O ministro também questionou se legislações estaduais podem dar prerrogativa a autoridades locais, como procuradores. Além de Toffoli, ainda não votaram os ministros Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski.
De ministros de Estado a comandantes de corpo de bombeiros, passando por vereadores e parlamentares, cerca de 55 .000 pessoas gozam do foro especial. Mas reportagem de VEJA mostra que a restrição não deve representar, necessariamente, um golpe na impunidade — como pode fazer crer a rapidez com que os juízes Sergio Moro e Marcelo Bretas prolatam suas condenações.
O problema é que os casos de Moro e Bretas não são regra. Eles só cuidam das ações relacionadas ao petrolão, enquanto nas demais varas do país seus colegas decidem sobre processos diversos. Além disso, nos rincões do país, não raro os juízes mantêm relação pessoal com o político a ser julgado ou ficam sujeitos à pressão dos mandachuvas locais. Há risco, portanto, de a demora e a blindagem apenas mudarem de endereço — ou de instância.
Doutor em ciência política pela Universidade de São Paulo (USP) e diretor executivo da Transparência Brasil, Manoel Galdino mostra-se preocupado com a perspectiva de ainda mais demora nos julgamentos se processos em tramitação no Supremo descerem para a primeira instância. Ele ressalta que nem todo juiz é como Sergio Moro. Ou seja: a restrição ao foro, para ele, pode ter efeito contrário ao esperado.
“Pode haver uma frustração da população por causa da expectativa que existe com o fim do foro, particularmente em razão da velocidade dos processos da Lava-Jato em Curitiba”. Ao descerem para a primeira instância, processos podem voltar à estaca zero. Resultado: o político que por longos anos não teve seu caso julgado no STF passa a ter a perspectiva real de ser beneficiado, na primeira instância, com a prescrição, cenário em que o Estado é impedido de puni-lo porque já se passaram muitos anos desde o crime.
(com Estadão Conteúdo)