Reforma política: Congresso quer fazer, só não sabe como
Principais pontos geram muita discórdia e pouco consenso; debate ultrapassa limites entre governo e oposição
Senador José Agripino Maia (DEM-RN): “Eu sou muito descrente. Como isso mexe com a praia de cada parlamentar, há conflito de interesses”
A reforma política virou um mantra no Congresso Nacional nos últimos meses. Mas só agora, com a formação de comissões, no Senado e na Câmara, para discutir o tema, é que os parlamentares poderão demonstrar o que estão dispostos a alterar no sistema em vigor. E se estão dispostos.
Apesar de, em seus discursos, governo e oposição ressaltarem a necessidade de mudanças, a verdade é que, dos onze temas listados no Senado Federal como prioritários, a minoria encontra algum tipo de consenso no Parlamento. Senadores e deputados sabem que é preciso alterar o modelo vigente, mas não se acertam sobre que rumo seguir. No Planalto, o vice-presidente Michel Temer (PMDB-SP) já fala em uma reforma “enxuta”, com aprovação de três ou quatro projetos.
Deputados e senadores ouvidos pelo site de VEJA enfatizaram a dificuldade de se construir consenso em torno das principais propostas. A reforma política é um tema complexo porque o debate não se divide entre governo e oposição: cada parlamentar tem algo a ganhar ou perder com a implementação de um novo modelo. Há uma reforma política diferente na cabeça de cada congressista, o que pode dificultar a formação de acordos.
“Eu sou muito descrente. Como isso mexe com a praia de cada parlamentar, há conflito interesses”, diagnostica o senador José Agripino Maia (DEM-RN). O senador Wellington Dias (PT-PI) é mais otimista: “Estou confiante porque há uma disposição do Executivo, do Judiciário, da Câmara e do Senado”. Só o tempo dirá o que, de fato, sairá do papel.
Lei Tiririca – A proposta defendida abertamente por Temer, a do fim do sistema proporcional, que elege deputados e vereadores, é um item criticado quase à unanimidade no Congresso. Uma das alternativas é o voto distrital, que transformaria as eleições proporcionais em majoritárias: cada distrito elegeria um deputado ou vereador. Outra: o “distritão”, que transformaria as unidades da federação em distritos. Na prática, elegeriam-se aqueles que conquistarem mais votos.
A mudança colocaria fim à eleição de parlamentares que chegam ao Congresso na “carona” de colegas bem votados. Não por acaso a medida já recebeu o apelido de “Lei Tiririca”. Atualmente, vale o quociente eleitoral (a quantidade mínima de votos que um candidato precisa para se eleger é calculada dividindo o número de votos válidos pelo número de cadeiras a ser preenchidas). Os votos dados a um deputado que superam o quociente são repassados ao partido e às legendas coligadas.
Por causa do sistema, Tiririca (PR-SP), “puxou” outros candidatos. O quociente eleitoral de São Paulo para o cargo de deputado federal nas últimas eleições foi de de 304.500 votos. Como Tiririca teve 3,5 vezes mais votos que o necessário, garantiu a eleição de pelo menos mais três deputados de seu partido e de sua coligação.
Outros temas, como o financiamento público de campanha e o fim da reeleição, têm ganhado apoio, mas ainda encontram forte resistência de alguns setores das duas casas. Para suavizar as mudanças, parte dos congressistas acredita que a implementação dos novos dispositivos deve ser gradual, entre as eleições de 2012 e 2016.
Candidaturas avulsas – Há um item que deve ser descartado de imediato: a permissão de candidaturas avulsas – ideia do senador Itamar Franco (PPS-MG). A mudança tornaria facultativa a filiação partidária para a disputa de cargos eletivos. Mas a proposta tiraria poder das legendas e, por isso, não deve ir longe.
Os outros temas, com a cláusula de barreira e a alteração no sistema de suplência para senador, devem ser objeto de uma longa discussão no Congresso. E o tempo joga contra: a comissão criada no Senado para discutir a reforma política tem 45 dias para apresentar uma proposta consolidade. Na Câmara, o grupo de trabalho sobre o tema nem sequer começou a funcionar.