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Haddad-2015: agora não tem mais desculpa

Prefeito se despede de 2014 com apenas 13% das metas cumpridas. Com mais dinheiro em caixa, agora precisa correr – e não só de bicicleta – se quiser ter chances em 2016

Por Eduardo Gonçalves Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 20 dez 2014, 07h33

É mais do que comum ouvir governantes atribuirem à falta de caixa a dificuldade de implementar no primeiro ano de mandato medidas prometidas ao longo da campanha eleitoral – afinal, os recém-empossados geralmente herdam de seus antecessores as dívidas contraídas ao longo do mandato anterior. No caso do prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), a justificativa se estendeu ao longo do segundo ano de governo. O petista argumenta que deixou de receber 2,5 bilhões de reais por causa da suspensão do reajuste do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) e do congelamento da tarifa de ônibus. E se despede de 2014 com a marca de meros 13% das metas cumpridas. Para 2015, porém, o cenário é diferente: a renegociação das dívidas do município com a União e a liberação, pela Justiça, do aumento do IPTU garantirão ao prefeito um orçamento folgado, o que abre caminho para mais investimentos. Ou seja, no próximo ano, Haddad não terá mais desculpas para não tirar do papel projetos que vão muito além de pintar ciclofaixas pelas ruas da capital.

O desempenho em 2015 será decisivo para o projeto de Haddad de concorrer à reeleição. A disputa promete ser acirrada até dentro do PT: a ex-ministra da Cultura Marta Suplicy não esconde que pretende concorrer em 2016, o que pode forçar a realização de prévias no partido. Prefeita de São Paulo de 2001 a 2004, Marta guarda nas periferias da capital paulista uma popularidade que Haddad não conseguiu conquistar. A oposição também já se mobiliza para a disputa, e tem como pré-candidatos os tucanos José Aníbal (deputado federal), Bruno Covas (deputado estadual) e o vereador Andrea Matarazzo.

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Dinheiro não será um problema para o prefeito. O Orçamento da cidade, aprovado em segunda votação na Câmara nesta sexta-feira, está estimado em 51,3 bilhões de reais – 1,5% a mais do que o previsto neste ano. Nesse valor, já estão inclusos cerca de 700 milhões de reais que a prefeitura prevê ganhar com o reajuste do IPTU e o aumento do ITBI (imposto de transmissão de bens imóveis). Além da renegociação da dívida, o petista também contará com uma verba proveniente da economia de 500 milhões de reais resultante da revisão de contratos, e do pagamento de 580 milhões de reais pelo acordo de exclusividade fechado com o Banco do Brasil. Como um presente de Natal extra para Haddad, a prefeitura de São Paulo recebeu ainda recebeu 46,8 milhões de reais do banco alemão Deutche Bank como indenização por transações ilícitas feitas por meio da instituição no período em que o hoje deputado Paulo Maluf (PP) era prefeito da cidade. Como define o relator do projeto do Orçamento na Câmara, Ricardo Nunes (PMDB): “Apesar de o país passar por uma crise econômica, a cidade de São Paulo está com a saúde financeira mais revigorada, e o prefeito tem tudo para acertar. Se ele errar ano que vem… aí não tem mais o que fazer. Torço para que dê certo”.

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Se a projeção de caixa para o ano que vem é positiva, os números do prefeito até aqui são pouco animadores: das 123 propostas de campanha, apenas dezesseis foram cumpridas. Isso significa que Haddad deve entregar 87% dos compromissos nos próximos dois anos – algumas bandeiras da campanha eleitoral, como o Arco do Futuro, um projeto de apoio viário à Marginal Tietê, já foram deixadas definitivamente de lado. Soma-se a isso a dificuldade do prefeito em aprovar projetos importantes para o Executivo na Câmara, como o reajuste do IPTU e o Plano Diretor, apesar de uma bancada de 43 aliados.

Vereadores da oposição classificam a relação de Haddad com o Legislativo como “presunçosa” e “distante” – mas nem entre os integrantes da base o prefeito é uma unanimidade. Exemplo: o reajuste do IPTU só foi aprovado no fim de 2013 por três votos de diferença – um a mais do que o mínimo necessário – em uma manobra da gestão petista que colocou o projeto em votação na calada da noite, para evitar protestos. Haddad ainda precisou devolver à Câmara o vereador Ricardo Teixeira (PV), secretário do Verde e Meio Ambiente, para conseguir maioria no plenário. Resultado: a sessão foi questionada na Justiça pela Fiesp (federação das indústrias paulistas) e pelo PSDB, e o aumento ficou suspenso até este mês. Na quinta-feira, o prefeito reduziu os índices de reajuste do imposto, mas elevou a cobrança do ITBI para compensar o valor que deixará de arrecadar com o IPTU.

Para o vereador Andrea Matarazzo, falta prioridades à gestão Haddad. “Administrar São Paulo não tem glamour: é passar o dia inteiro na rua, brigando com caçambeiro, empresas de ônibus, camelôs, etc. Não é ficar teorizando a São Paulo do século XXV, mas arrumar uma solução para a São Paulo real. É diferente de trabalhar no Ministério, onde se faz políticas públicas a longo prazo”, avalia. Já Ricardo Nunes, líder da bancada do PMDB na Câmara, diz que a falta de diálogo se deve à inexperiência de Haddad na política – ex-ministro da Educação, o petista foi o “segundo poste” que o ex-presidente Lula emplacou e chegou à prefeitura sem nunca ter disputado uma eleição. “Acho que isso é natural. Ele não era da política, nunca foi vereador nem deputado”, disse.

Além das negociações com a Câmara, Haddad terá de lidar com dois fantasmas que voltarão a assombrar sua administração no próximo ano. O primeiro é a chegada da temporada de chuvas de verão, que costuma causar alagamentos no início do ano – a seca história enfrentada em 2014 livrou o prefeito da tormenta neste ano. Do pacote de 79 medidas para conter enchentes, a gestão Haddad entregou apenas 27 obras, ou seja, 30% do que havia prometido. O descaso nessa área refletiu-se na semana passada, quando córregos transbordaram e alagaram vias importantes da capital após fortes pancadas de chuva. O segundo é a expectativa do aumento na tarifa de ônibus, congelada desde 2011. O reajuste de 20 centavos foi responsável por desencadear a onda de protestos que se espalhou pelo resto do país em junho do ano passado. A resistência inicial do prefeito em recuar derrubou a sua popularidade – de 35% para 18%, segundo pesquisa Datafolha feita em junho de 2013, marcas similares às das gestões de Celso Pitta (1997 a 2000) e Jânio Quadros (1986 a 1988).

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Neste ano, com a implantação de pelo menos setenta quilômetros de ciclofaixas, o prefeito conseguiu recuperar parte de sua popularidade: tem 22% de aprovação, segundo Datafolha de setembro de 2014. O número, no entanto, ainda está longe do recomendável para quem quer disputar a reeleição. Isso porque as ciclofaixas estão longe de ser uma unanimidade entre os paulistanos – e sua implantação apressada muitas vezes provoca problemas. Em novembro, por exemplo, a administração municipal precisou apagar uma faixa de bicicleta instalada na Vilaboim, Zona Oeste de São Paulo, porque ela estava atrapalhando o comércio local. “Eu possivelmente sou o único ciclista dos 55 vereadores da Casa. E o prefeito não veio falar comigo. Agora, está colhendo a ausência de debate com o parlamento e a sociedade”, disse o líder da bancada do PSD na Câmara, José Police Neto, que pertence à base aliada do prefeito.

Outra queixa à gestão petista é sobre a “relação perigosa” – como classificou o Ministério Público do Estado de São Paulo – entre a prefeitura e os movimentos pró-moradia, especialmente com o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST). O MP investiga o favorecimento a militantes em detrimento das pessoas que esperam há anos na fila de habitação. A administração municipal nega o privilégio, mas já anunciou ao menos duas medidas que favorecem o grupo – ambas regularizam a construção de moradia em dois terrenos invadidos, um em Itaquera, na Zona Leste, e o outro na Estrada do M`Boi Mirim, na Zona Sul. “Essa questão do diálogo tem que ser permanente, não pode ocorrer só em momentos de conflito. Ao invés de produzir consensos entre os movimentos e os vereadores, o prefeito entrega para a Câmara uma cidade dividida”, diz Police Neto.

Já o líder da bancada do PT na Casa afirma que a gestão Haddad foi “planejada” para cumprir as metas a partir de 2015. “Os primeiros dois anos de todo o governo sempre são difíceis, porque se assume diversos problemas da cidade, alguns até da gestão anterior. E a marca do governo só começa a aparecer depois. O governo Haddad foi planejado assim”, afirma o petista. Sobre o desempenho pífio no Plano de Metas, a prefeitura explicou que o adiamento do aumento do IPTU, devido à “judicialização promovida pelo PSDB”, e o congelamento da tarifa de ônibus, não permitiu que fossem aplicados 2,5 bilhões de reais “em diversas ações planejadas para 2013 e 2014”. No entanto, diz estar “confiante” que terá condições de cumprir as metas até o fim de 2016. Será preciso, porém, mais do que otimismo.

Resposta – Sobre as reclamações da falta de diálogo, a prefeitura respondeu, por meio de nota enviada pela sua assessoria: “O prefeito reitera sua postura republicana com o debate transparente de ideias e políticas públicas, separando temas partidários de assuntos de Estado para chegar à maioria de votos, uma vez que sua base aliada não compõe maioria no plenário”. Em relação ao balanço que ele mesmo faz da gestão em 2014, o prefeito disse estar “tranquilo” por ter começado a imprimir sua marca na administração de São Paulo. “O ano de 2013 me deixou na dúvida se seria possível deixar um legado. Eu falei: ‘Corro o risco de não conseguir. 2014 me dá segurança de que o legado existirá'”.

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Balanço dois anos de gestão Haddad
Balanço dois anos de gestão Haddad (VEJA)
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