Biden transforma Salão Oval em relicário anti-Trump
Dando seu toque pessoal ao Salão Oval, o novo presidente escolheu obras que simbolizam igualdade racial, apreço pela ciência, diversidade e união
Nos Estados Unidos, é de costume que presidentes deem seu “toque pessoal” ao gabinete de trabalho, o famoso Salão Oval. Joe Biden, que não perde tempo para iniciar suas funções, também já deu um tapa no escritório que é sinônimo da majestade do cargo – e a decoração escolhida dá muitas dicas sobre como o novo líder americano pretende conduzir o país pelos próximos quatro anos.
A peça central do ambiente é um enorme retrato do 32º Presidente dos Estados Unidos, Franklin D. Roosevelt, pendurado em frente à mesa do Salão Oval, chamada Resolute Desk (umas das únicas peças nunca mudadas desde 1880). FDR comandou o governo federal durante a maior parte da Grande Depressão, nos anos 1930, implementando o aclamado plano de recuperação econômica “New Deal”.
Quase um século depois, Biden faz um claro aceno à figura de Roosevelt, já que enfrenta um desafio semelhante em relação à pandemia de coronavírus e a crise econômica por ela gerada, analisa o jornal americano The Washington Post.
Seu plano econômico inclui aumento de gastos públicos – a exemplo do exorbitante “Plano de Resgate Americano”, no valor de 1,9 trilhões de dólares, para atender às demandas de saúde e econômicas do país –, aumentar impostos para os ricos e investimento em empresas sustentáveis. É o New Deal 2.0.
No governo de Barack Obama, primeiro presidente negro dos Estados Unidos, a peça central era a Proclamação de Emancipação, documento assinado por Abraham Lincoln que libertou todos os escravizadas do país.
Ao redor do retrato de FDR, multiplicam-se os retratos e bustos de figuras históricas americanas. Biden colocou os antagonistas Thomas Jefferson e Alexander Hamilton (ex-secretário do Tesouro) lado a lado, para ilustrar os benefícios de ter pontos de vistas diferentes. Segundo o gabinete de Biden, as pinturas mostram que essas divergências “são essenciais para a democracia”.
Aí repete-se o tom do discurso de posse do democrata na quarta-feira 20, em que pediu por união e disse que viver na América é estar constantemente exposto às diferenças, mas pontos de inflexão sempre podem ser superados.
Ao lado de uma lareira, foram colocados bustos de Martin Luther King Jr. e do ex-procurador-geral Robert Kennedy, em homenagem ao papel de ambos no movimento pelos direitos civis. Kennedy também é conhecido por seu papel no combate à máfia.
A figura do pastor e ativista negro também entra no rol das representações de diversidade – tão importantes para esta administração –, assim como o busto do filho de mexicanos Cesar Chávez, sindicalista e defensor da comunidade de latinos no país, o de Rosa Parks, ativista do movimento negro, e uma escultura de um nativo-americano apache, que pertenceu ao falecido senador Daneil Inouye (primeiro americano de origem japonesa a ser eleito para o Congresso).
O novo mandatário colocou no gabinete, lado a lado, pinturas dos ex-presidentes George Washington e Lincoln. O Salão Oval também contém uma pintura de Benjamin Franklin, posicionada ao lado de uma rocha lunar. Ambos os objetos representam o apreço de Biden pela ciência e pela valorização das realizações das gerações anteriores, diz o Post.
Ela entrou no lugar do retrato de Andrew Jackson, um presidente populista que estimulou o massacre de indígenas, que Donald Trump mantinha quando estava no cargo. O quadro foi motivo de revolta em 2017, quando foi pano de fundo para um discurso do republicano em homenagem aos membros da tribo Navajo que auxiliaram a Marinha americana na Segunda Guerra. No mesmo discurso, ele referiu-se à senadora Elizabeth Warren como “Pocahontas”.
Móveis e cortinas, parte da coleção da Casa Branca, continuaram os mesmos. O tapete, contudo, Biden roubou de Bill Clinton, substituindo o creme da gestão Trump por um azul escuro profundo.
O democrata retirou, ainda, as bandeiras militares que o antecessor mantinha atrás da Resolute Desk. Apenas duas ficaram: a dos Estados Unidos e a que traz o selo presidencial. O ambiente de cerca de 75 m² tornou-se um microcosmo da gestão Biden – cuja essência parece ser, acima de tudo, anti-Trump.