Foi em um jantar entre amigos, em agosto de 2016, que o documentário Pagliacci, em cartaz a partir desta quinta-feira no país, foi pensado pela primeira vez. O filme seria parte da comemoração dos 20 anos da Cia La Mínima, grupo circense criado por Domingos Montagner e Fernando Sampaio, amigos e palhaços. Na época, o cineasta Luiz Villaça se animou com o projeto, mas precisou engavetá-lo com o trágico acidente que matou Montagner um mês depois do amigável jantar.
“Tudo ficou suspenso por um período”, conta Luciana Lima, viúva do ator, sobre os muitos planos que envolviam o aniversário de duas décadas da trupe. “Não sabíamos se dávamos continuidade ou não. Então, veio um flash, uma sensação muito presente, de que sim, a gente deveria continuar. Já bastava a perda de uma pessoa tão significativa na nossa vida emocional, pessoal e profissional. Em forma de homenagem, decidimos manter aquela energia e continuar em frente.”
Montagner havia sugerido um documentário diferente do tradicional, que é respaldado apenas por imagens e depoimentos. Ele preferia um fio condutor. Seu desejo foi honrado na figura do palhaço, que ganha os holofotes da produção, e também em Fernando, com quem, segundo Luciana, Montagner tinha um segundo casamento.
“A sintonia dos dois me impressionava. Eles se conheceram no final dos anos 1980, no Circo Escola Picadeiro, e foi uma conexão de alma. Não só a convivência, o trabalho, ensaios, pesquisa, mas existia uma química sensorial.”
Villaça reassumiu o projeto, ao lado dos diretores Chico Gomes, Julio Hey, Luiza Villaça e Pedro Moscalcoff. As filmagens aconteceram entre o fim de 2016 e o começo de 2017, concomitantemente com o lançamento do último espetáculo do grupo de palhaços, que, após um ano da perda, reaprendia a sorrir.
“O filme fez parte do processo de luto. Desde a montagem do espetáculo, a separação de material de acervo: abrir baús, mexer em fotos, textos, figurinos. Ainda estávamos anestesiados”, conta Luciana. “Fernando e eu nos apoiamos muito um no outro, entre momentos muito difíceis e emotivos, e outros empolgantes e felizes, pois, no fim, era a realização de um sonho.”
O luto, contudo, não faz de Pagliacci um filme triste. Os bastidores da vida de artistas circenses – e como eles abraçaram a vocação —, os ensaios e o legado deixado por Montagner dão leveza à produção, enquanto provocam risos, acompanhados de uma pontada de saudade do ator.