
Repita comigo: friluftsliv. A palavra parece complicada à primeira vista, mas não é – “fri”, livre; “luft”, ar; “liv”, vida. Literalmente, a vida ao ar livre.
Também é simples o conceito por trás da expressão, que aprendi na Noruega, um dos países que visitei nas últimas semanas. Friluftsliv não diz respeito a um hábito que nos pareça excêntrico, como os mergulhos em águas gélidas, um clichê que associamos aos povos do norte. (Mas pode incluí-los também.) Friluftsliv é toda e qualquer atividade que se desenvolva em contato com a natureza.
Pude observar que isso é, de fato, algo que os noruegueses apreciam no cotidiano. Durante nossa visita, as temperaturas do começo de outono estavam agradáveis. Mas logo descobri que as pessoas não ficavam na rua só sob o clima ameno. Li que, segundo uma pesquisa recente, 77% dos noruegueses têm algum contato semanal com a natureza e 25% fazem isso todos os dias. E a meta da associação nacional de friluftsliv – sim, ela existe – é que todo mundo possa ter acesso a atividades ao ar livre, inclusive pessoas com alguma limitação física.
A Noruega é um país relativamente pequeno, mais ou menos como Maranhão e Rio Grande do Norte somados, com 40% de sua superfície coberta por florestas. Isso ajuda a explicar o gosto deles por trilhas e acampamentos. Dá para chegar a bosques de metrô. Mas não explica os muitos bebês dormindo placidamente em seus carrinhos do lado de fora de cafés frequentados pelos pais em Oslo, como eu vi.
Acontece, aprendi, que o friluftsliv é cultivado desde o berço. No jardim de infância, as crianças gastam pouco tempo confinadas. Praias, fiordes e montanhas são suas salas de aula. E isso em qualquer estação. Em todas há algo que a natureza ensina. Se no verão pode-se nadar em lagos, quando o inverno os congela, os noruegueses patinam. Na neve, esquiam, ou deslizam entre a brancura em trenós puxados por cães. Depois da chuva, catam cogumelos. Na primavera, observam insetos e flores.
Com o equipamento adequado, não existe tempo ruim. Não à toa os escandinavos inventaram bastões parecidos aos de esqui para andar na natureza. A “caminhada nórdica”, cujas qualidades têm sido muito divulgadas, é feita levando um deles em cada mão, o que permite movimentar tronco e braços ao mesmo tempo que as pernas.
As atividades ao ar livre costumam envolver algum exercício, esse ou outro. Mas existem muitos benefícios que os noruegueses associam ao contato com as intempéries. Estar na natureza reduz a ansiedade e promove sensação de paz – a principal motivação deles para buscar o ar livre, dizem. O tema é tão sério que o país está promovendo 2025 como o ano do friluftsliv, com atividades ao longo de todo seu comprido território.
Adoro andar a pé, seja pelas ruas de cidades que visito, seja fazendo trilhas. Ver o prazer dos noruegueses em passear até debaixo de chuva sem maiores finalidades do que apreciar a paisagem e se reconectar me pareceu inspirador.
A julgar pela alegria natural – o termo não pode ser outro – que demonstram nessas atividades, a vida ao ar livre pode muito bem ser a nova ideia escandinava de bem-estar a ganhar o mundo, depois de hygge e sisu, que já mencionei na coluna. E não precisa de grande coisa. Qualquer praça ou parque já é válido.