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Oscar Vilhena: “Não há esfera de poder imune ao controle”

Para jurista, Associação dos Magistrados quer acabar com investigações do CNJ para preservar interesses corporativos. STF decide imbróglio quarta

Por André Vargas
27 set 2011, 14h15

“O CNJ é uma demonstração de que os tribunais têm falhado”

Oscar Vilhena Vieira, jurista

O Supremo Tribunal Federal (STF) está para decidir se juízes podem ser investigados e punidos pela Corregedoria do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Órgão responsável pelo controle externo do Poder Judiciário, ele foi criado pela Emenda Constitucional 45, a chamada reforma do Judiciário, em 2004, e passou a atuar em 2005. A previsão é que entre em pauta nesta quarta-feira uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) contra o poder punitivo do CNJ.

Apesar de, à primeira vista, a questão estar envolta em tecnicalidades jurídicas – o que diz a Constituição sobre as atribuições de investigar juízes que cometem irregularidades – , no núcleo da discussão giram aspectos políticos que afetam toda a sociedade. Quem questiona a legitimidade do trabalho do CNJ é a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) alegando inconstitucionalidade. Para a AMB, juízes só podem ser punidos por seus pares, em seus respetivos tribunais. O CNJ não deveria entrar em ação, sem antes o caso passar pelas corregedorias dos tribunais.

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Na véspera do julgamento, declarações da corregedora nacional de Justiça, ministra Eliana Calmon, esquentaram o debate. Ela fez duras críticas à iniciativa de restringir a atuação do conselho. “Acho que é o primeiro caminho para a impunidade da magistratura, que hoje está com gravíssimos problemas de infiltração de bandidos que estão escondidos atrás da toga”, declarou a ministra, sem medir palavras. Ela também atacou o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), a quem tachou de “fechado” e “refratário a qualquer ação do CNJ”.

A reação ocorreu um dia depois de a AMB divulgar uma nota sobre o caso. Com o título “Não queremos ficar amordaçados”, o texto diz: “A razão de existir do CNJ não está no poder de vigiar os atos dos Magistrados”. A nota é assinada pelo presidente da AMB, desembargador Nelson Calandra.

O presidente do CNJ e do Supremo, Cezar Peluso, divulgou nota epudiando as declarações de Eliana Calmon. Sem citar nomes, disse que elas são “levianas”. Dos 15 integrantes do CNJ, 12 assinam o texto. Não é novidade em Brasília que as relações entre Eliana Calmon e Peluso nunca foram das melhores. Fala-se até sobre a possibilidade de ela entregar o cargo. A ministra não se pronunciou nesta terça.

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Para o jurista Oscar Vilhena Vieira, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), em São Paulo, não há nada de jurídico na natureza desta intensa discussão. O que a AMB quer mesmo é reduzir o poder fiscalizador do conselho em prol de interesses meramente corporativos. Em entrevista ao site de VEJA, Vieira classifica como lamentável o Judiciário não querer aumentar sua legitimidade perante a sociedade e defende que só a “competição entre os órgãos de controle” aumentará a transparência e a eficiência do trabalho dos juízes.

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O que está de fato em jogo nesta disputa entre a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) e o Conselho Nacional de Justiça (CNJ)? É um conflito, sobretudo, de natureza corporativa, porém, o que está em jogo é de interesse de toda a sociedade. Trata-se de uma questão política maior. Ao estabelecer mecanismos de coordenação, gerenciamento e transparência do Judiciário, o CNJ se tornou uma das inovações institucionais mais importantes das últimas duas décadas. Isto, sem dúvida, contraria interesses dentro da corporação. Espero que o STF enfrente o tema de maneira firme, levando em conta os princípios da Constituição e não os interesses de uma pequena parte dos juízes.

Mas o que há de errado em juízes serem fiscalizados por um órgão a mais, além das corregedorias de seus próprios tribunais? Nada. Em um regime republicano, não deve haver esfera de poder imune à fiscalização. Como o Judiciário não está submetido ao controle direto do cidadão, por intermédio do voto, é necessário estabelecer mecanismos horizontais que tornem os juízes responsáveis perante a sociedade.

A Associação dos Magistrados diz que o CNJ pratica controle externo. É verdade? O CNJ não constitui um mecanismo efetivamente externo, mas sim, uma instância mista, ainda que atue de modo mais interno. Seria uma temeridade limitar a atuação do Conselho neste momento. Sua corregedoria se tornou uma importante ferramenta para aumentar a transparência do Judiciário.

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Qual a extensão das punições aplicadas pelo CNJ e seus benefícios para a sociedade? O conselho é uma instância subsidiária às corregedorias dos tribunais. Assim, se eles tomarem as devidas providências, o conselho não precisa agir. Sua interferência se dá apenas no momento em que os órgãos correcionais dos tribunais falham. O trabalho do CNJ é uma demonstração de que os tribunais têm falhado muito.

Alguns estados discutem a criação de corregedorias independentes para suas polícias. Isto não é um grande avanço contra o corporativismo? Sim. Seria muito positiva a criação de mecanismos subsidiários correcionais em outras áreas. É importante criar tensão e competição entre os órgãos de controle. Conferir a uma só entidade o poder de investigar é sempre arriscado. Fica cada vez mais claro que há maiores chances de atendimento do interesse público quando as instituições são desafiadas, ainda que por outras instituições.

Caso a AMB vença no STF, o Judiciário não perderia uma grande oportunidade de se modernizar? É lamentável o Judiciário não querer aumentar sua legitimidade junto à sociedade brasileira, demonstrando que está aberto ao escrutínio do CNJ.

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O STF já tomou decisões importantes diante do imobilismo do Legislativo, em uma postura de ativismo jurídico. Por que o CNJ não pode fazer o mesmo em seu terreno? O CNJ foi estabelecido dentro do capítulo da Constituição que cuida do Judiciário. Não houve supressão de competências da Justiça em favor de um outro poder. O que se deu com a Emenda 45 foi a criação de outro agente para o qual foram realocadas competências.

O CNJ mandou acabar com o nepotismo e estabeleceu metas para os tribunais. Caso perca a capacidade de punir, sua atuação não será decorativa? Evidentemente. Porém, a competência correcional do CNJ emana da própria Constituição. Assim, não há o que discutir sobre sua validade.

Os mandatos de apenas dois anos não tornam a corregedoria por demais sujeita ao estilo de quem está em seu comando? Lembremos que mandatos mais longos também podem ser problemáticos. Principalmente se quem estiver no comando decidir nada fazer.

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