Não é novidade para ninguém que o aplicativo Tinder se tornou nos últimos anos a principal ferramenta para encontros amorosos. O que se desconhecia até agora é a impressionante capacidade da plataforma para fazer dinheiro — com ou sem pandemia. Em 2020, as ações do Match Group, dono do Tinder e outras 45 marcas dedicadas a relacionamentos virtuais, dispararam cerca de 200% na Nasdaq, a bolsa de tecnologia dos EUA. Com isso, a empresa passou a ser uma das queridinhas dos investidores americanos, seguindo o caminho de marcas consagradas como Amazon, Apple e Facebook. Em seu relatório do terceiro trimestre, a companhia informou que o número de usuários pagantes em seus aplicativos de paquera saltou 12% em relação ao mesmo período do ano anterior, para 10,8 milhões, e que a receita total cresceu 18%, para 640 milhões de dólares. Nunca houve tantos swipes, como é chamado o ato de arrastar a foto de um eventual pretendente na tela do celular (para a direita quando agradou e para a esquerda quando não), e matches, ocasiões em que o potencial casal é formado.
O sucesso é resultado de uma união perfeita entre oportunidade e criatividade. A pandemia do novo coronavírus atacou em cheio um dos aspectos que compõem a essência humana: a necessidade de socializar. A tecnologia das reuniões virtuais de certa forma amenizou a saudade de amigos e familiares, mas poucas coisas são tão insubstituíveis quanto um abraço em carne e osso. O baque emocional foi ainda mais nocivo para um grupo específico, o de solteiros e solteiras, e as empresas que os têm como público-alvo não demoraram a pegar carona no clima de “sofrência”, escancarado pela febre inicial das lives musicais. Especialistas destacam a demanda reprimida — eis aí a oportunidade — que abriu as portas para as pessoas que antes priorizavam o flerte em casas noturnas ou barzinhos. “Muita gente que não se interessava pelos aplicativos ganhou uma motivação adicional”, diz Ailton Amélio da Silva, ex-professor do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo.
Houve ainda um novo fenômeno pandêmico: a mera busca por companhia, ainda que o papo corriqueiro não mirasse diretamente o encontro marcado. “Só o ato de falar com alguém de forma mais casual já alivia parcialmente a solidão, mesmo que a pessoa não busque um relacionamento mais profundo”, diz Daniel Martins de Barros, médico do Instituto de Psiquiatria da USP. Os dados confirmam a tendência. Segundo o Tinder, as conversas diárias aumentaram em média 20% e a duração dos papos se tornou 25% maior.
Criado em 2012 em um câmpus de faculdade, o Tinder é o aplicativo não relacionado a games mais popular do mundo, disponível em 190 países e quarenta idiomas. Durante a pandemia, em um ano marcado por tensões raciais e políticas, a plataforma virou um local de debate sobre variados temas e reuniões de diversas tribos. As citações ao termo “voto” dobraram, enquanto o adjetivo “feminista” e o emoji símbolo do Black Lives Matter se espalharam por perfis mundo afora.
Jenny McCabe, chefe de comunicação do app, disse a VEJA que metade dos membros tem entre 18 e 25 anos. “A geração Z não delineia diferenças entre vida real e vida digital. É apenas vida”, afirma a executiva. A empresa também fez sua parte e caprichou na sedução — daí a criatividade. Uma das primeiras medidas foi habilitar os chats de vídeo. Faz todo o sentido. Na quarentena, afinal, o tão aguardado primeiro encontro precisou ser virtual. Outra novidade foi a liberação durante um mês do “passaporte”, recurso pago que permite o contato entre pessoas de qualquer lugar do mundo — em sua versão básica e gratuita, as possibilidades se limitam a um raio de 160 quilômetros. As cidades estrangeiras mais “visitadas” pelos brasileiros foram Nova York, Los Angeles e Londres.
O Tinder trouxe ainda outras inovações, como uma minissérie apocalíptica, Swipe Night, sua primeira produção de ficção, na qual o usuário se torna um personagem da trama, com o poder de definir seus rumos num arrastar de tela. As escolhas do assinante (que incluem salvar um cachorro ou um humano de um asteroide) foram usadas como filtro para que o aplicativo indicasse pessoas de perfis semelhantes. “Estamos comprometidos em impulsionar a inovação no Tinder, criando mais maneiras de reunir nossos membros, entretê-los e ajudá-los a conhecer novas pessoas”, afirmou Jim Lanzone, CEO do aplicativo.
O auge da paquera no mundo se deu em 5 de abril, semanas depois de a pandemia ter sido oficialmente declarada, quando foram enviados 52% a mais de mensagens em relação à média pré-quarentena. No Brasil, o dia 29 de março foi o ponto alto das conversas, com uma média de mensagens 61% superior. Em breve, o aplicativo promoverá outro evento, o Dating Sunday, em 3 de janeiro — segundo a empresa, o primeiro domingo de cada ano costuma ser o dia de maior movimento, uma espécie de Super Bowl dos encontros. A Match Group também fechou recentemente um contrato de parceria com a Rainn, a maior organização antiviolência sexual dos EUA, para revisar e aprimorar os processos de denúncia de má conduta. Com a chegada da vacina e tantas novidades, o flerte tende a ser mais proveitoso e seguro em 2021. O amor, como se vê, está sempre na moda.
Publicado em VEJA de 23 de dezembro de 2020, edição nº 2718
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