Nos anos 90, a psicóloga e pesquisadora do Massachusetts Institute of Technology Sherry Turkle escrevia com otimismo e entusiasmo: “Os computadores são o novo palco de nossas fantasias, erotismo e intelectualidade. Estamos usando a vida em rede para nos adaptar a novas maneiras de pensar relacionamento, sexualidade, política e identidade”. Em 2011, Sherry Turkle escreve com reserva e reticência: “Estamos confusos sobre intimidade e solidão”.
A guinada por que passou a psicóloga nos últimos 15 anos é a razão de seu livro mais recente, Alone Together – Why We Expect More From Technology and Less From Each Other (Basic Books, ainda sem editora no Brasil), algo como “Juntos sozinhos – Por que esperamos mais da tecnologia e menos de cada um de nós”, lançado em janeiro. Sherry ouviu 450 pessoas e concluiu: a enxurrada de dispositivos tecnológicos compromete a sociabilidade. Para Sherry, no mundo virtual as relações são menos profundas e até ilusórias, e as múltiplas amizades das redes sociais são, na verdade, uma redução da amizade.
Em entrevista ao site de VEJA, Sherry aponta a diluição no ambiente virtual de aspectos fundamentais das relações sociais no mundo físico. “Quando desempenhamos um papel na vida real contamos com o tom da nossa voz, com a tensão de nossos músculos e com o movimento do nosso corpo para nos comunicar. Aprendemos a interpretar esses sinais”, diz. “Isso não é irrelevante e não pode ser substituído por linhas postadas no mural do Facebook.”
Dos relatos que colheu, a pesquisadora americana aponta que o deslumbramento com a tecnologia pode empobrecer também o relacionamento familiar. “Os pais têm sido acusados de adotarem o mesmo comportamento que repudiam em seus filhos”, afirma. “Eles estão acessando a internet na mesa do jantar, estão enviando SMS enquanto dirigem e não largam o smartphone nem mesmo enquanto brincam com as crianças no playground”.
“Preferimos escrever a falar” é a frase definidora das preocupações de Sherry. Tem sido brandida em toda entrevista concedida ou artigo publicado. A VEJA, ela exemplifica o bordão apontando certo gosto pelas desculpas virtuais. Segundo ela, o ato de pedir desculpas por SMS, e-mail ou recados em redes sociais nos livra de testemunhar a reação do outro. “Os entrevistados me disseram que um pedido de desculpas que não dá espaço para você ouvir a dor que causou e que não permite ao outro expressar o desapontamento não é suficiente”, conta.
Desencanto – O tom desencantado de “Alone Together” despertou a ira de certa comunidade acadêmica dada ao elogio sem reservas de toda nova traquitana tecnológica. Mas Sherry garante que não está contra a evolução tecnológica de smartphones, computadores, robôs ou redes sociais. Ao contrário, está convencida de que as mais populares ferramentas são extremamente jovens e ainda precisam amadurecer.
Sherry é usuária ativa do Facebook e, claro, também prefere “escrever a falar” ocasionalmente – é o caso desta entrevista, aliás. Em artigo publicado no jornal britânico The Guardian, ela afirma: “Eu uso a internet para ficar em contato com meus amigos e familiares. E, como a maioria das pessoas, tenho me surpreendido com a forma com a qual a mídia social tem adicionado uma nova dimensão à vida”.
Seu alvo, portanto, não é o mundo virtual, mas a ambição que detectou ao longo dos anos de torná-lo substituto para o mundo físico. Reforça um ditado popular facilmente aplicável a situações do cotidiano. A diferença entre o remédio e o veneno, como dizem os avós, está na dose. Simples assim.