Pesquisadores da Universidade Federal Fluminense vão iniciar a fase final de testes de um novo medicamento quimioterápico para o tratamento do glioma, responsável por 56% dos tumores cerebrais malignos. O remédio aumenta a sobrevida dos pacientes e melhora as perspectivas de sucesso na luta contra o câncer. Ele será testado em 279 pessoas (199 que já participavam de fases anteriores da pesquisa e 80 que ingressarão agora) do Hospital Federal de Ipanema a partir do fim deste mês.
A esperança atende pelo nome de álcool perílico, substância que vem sendo estudada no Brasil com resultados expressivos. “Ele é encontrado na natureza, em hortelã, limão, erva doce – e é feito a partir de extrato. Ao contrário dos quimioterápicos para tumores cerebrais, que são caríssimos, esse é um medicamento muito barato”, afirma Júlio Thomé, chefe do Serviço de Neurocirurgia do Hospital Ipanema, que atua em parceria com a universidade.
O álcool perílico começou a ser desenvolvido como quimioterápico há seis anos e passou por duas fases de testes: já foi aplicado em animais e em seres humanos. Um estudo comparativo comprovou sua eficácia: 61% dos 69 pacientes que receberam o tratamento tiveram sobrevida de quatro a doze meses, ante aos cerca de dois meses registrados entre as 52 pessoas que não se submeteram ao medicamento.
Antes do tratamento, os pacientes com glioma não tinham muita expectativa de sobrevida, por causa da letalidade da doença. O glioma não produz metástase, mas é extremamente agressivo por se desenvolver dentro da cabeça, criando uma pressão no interior do crânio que mata os pacientes. “A taxa de mortalidade da doença é de 100%”, diz Thomé. Com o álcool perílico, ganha-se tempo para o tratamento quimioterápico e radioterápico. E, é claro, crescem as chances de cura.
Suicídio celular – Segundo o médico, o remédio age no DNA das células cancerígenas no cérebro, em uma proteína da membrana que altera a programação genética e reduz o ciclo de vida celular. Ele interrompe o fornecimento de nutrientes para essas células, induzindo-as a uma espécie de suicídio por sufocamento. O remédio ainda possui a vantagem de atingir somente essas células doentes, sem afetar as saudáveis.
Absorvido por inalação, o medicamento apresenta poucos efeitos colaterais, bem menores dos que ocorrem em outros quimioterápicos – não há queda de cabelo, por exemplo. A perspectiva, segundo o pesquisador, é boa, já que a iniciativa poderá impulsionar a realização de mais pesquisas e trazer avanços no tratamento desse tipo de câncer. Segundo ele, até o próximo ano, deverão estar em produção vinte projetos de pesquisa, com dissertações de mestrado e teses de doutorado. Uma linha de estudo mais promissora é a que prevê o uso do álcool perílico como um “meio de transporte” para medicamentos quimioterápicos. “A combinação do álcool com essas drogas aumentaria a eficiência do tratamento”, diz Thomé.
Além da criação de um novo medicamento, os cientistas estão monitorando o DNA das células cancerosas para estudar o perfil e a evolução dos tumores. No futuro, isso poderá permitir o desenvolvimento de pesquisas e testes para prever a doença. “Não se deve jogar a toalha. Acho que não devemos condenar a pessoa à morte sem antes tentar alternativas”, diz. “O álcool perílico está demonstrando que é possível aumentar a sobrevida e propiciar uma melhor qualidade de vida ao paciente”.