A prisão de Michel Temer pela Operação Lava Jato tem, por si só, um inegável peso político: é um ex-presidente da República preso por corrupção, o segundo na história recente do país (Lula já está nessa condição há quase um ano) e um líder importante do MDB (presidiu o partido por vários anos) e da classe política em geral (foi presidente da Câmara por três vezes e sempre foi tido como um bom articulador).
Mas Temer pode deixar a prisão ainda hoje – certamente terá um pedido de habeas corpus analisado pelo Supremo Tribunal Federal, com grandes chances de êxito – e os processos nos quais está enredado devem demorar anos para ter um desfecho final.
A detenção do ex-presidente, porém, tem um impacto maior, mais imediato e de consequências ainda difíceis de medir: abala seriamente o clima no Congresso para a votação da reforma da Previdência e pode acirrar os ânimos de parte da classe política contra a Lava Jato – nos dois casos, vai sobrar para o presidente Jair Bolsonaro.
Ao levar o ex-juiz Sergio Moro para o Ministério da Justiça, Bolsonaro trouxe a Lava Jato para dentro do governo. O discurso pelo qual foi eleito, de combate à corrupção, também ajuda a alinhar a agenda do governo e da operação. É sintomático que a comemoração mais efusiva da prisão até agora tenha vindo de Major Olímpio, líder do PSL, partido do presidente, no Senado. No restante dos partidos, do PT ao PSDB, uma certa estupefação com a detenção de Temer e uma impressão crescente de que a Lava Jato quer cada vez mais desmoralizar a política.
A ação ocorre um dia depois de o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), ter passado um pito público em Moro, que se achou no direito de cobrar do deputado mais agilidade na tramitação do seu projeto de combate à corrupção e à violência.
Um dos presos na operação que levou Temer à cadeia foi o ex-ministro Moreira Franco, casado com a sogra de Rodrigo Maia. Pode não ter relação nenhuma uma coisa com a outra, mas o episódio não ajuda em nada o governo no Congresso. Apesar da bronca em Moro, Maia é tido como o único articulador confiável pela aprovação da reforma da Previdência – posição, aliás, da qual tem demonstrado cansaço ultimamente. Ele tem sido a garantia de algum avanço da proposta na Câmara, em meio à desarticulação constrangedora do governo no Legislativo.
O mercado, que não é bobo, já percebeu o tamanho da encrenca. A bolsa cai e o dólar sobe nesta quinta-feira, movimentos certamente influenciados pela avaliação de que a prisão de Temer só atrapalha o clima político no Congresso em um momento-chave para a tramitação da reforma da Previdência.
No mais, a prisão de Temer vem em um momento em que a Lava Jato está na defensiva, acusada de comportamentos pouco republicanos e em rota de colisão aberta com o STF e com o comando da Procuradoria-Geral da República: Raquel Dodge tem atuado abertamente para colocar algum freio nos procuradores da operação, em especial os de Curitiba.
De resto, a avaliação do habeas corpus de Temer pode cair nas mãos de Gilmar Mendes que, além de já ter mandado soltar uma infinidade de réus presos pelo juiz Marcelo Bretas, é desafeto declarado da Lava Jato. Não há nenhuma dúvida sobre qual será a sua decisão caso fique realmente com ele o pedido de soltura do ex-presidente.
Enfim, a ação da Lava Jato vai repercutir fortemente no Congresso e criar uma gigantesca marola que certamente irá atrapalhar os planos de Bolsonaro, de Moro e de quem mais sonha com o avanço da agenda reformista do governo.