“Senador é senador, deputado é deputado. O sistema é bicameral. Somos do mesmo partido, mas não quer dizer que pensamos igual” Eunício Oliveira, senador
Publicidade
De tão recorrentes, as divisões no PMDB ensejam uma irônica pergunta quando se fala no partido: “Qual PMDB?”. Sem fugir ao retrospecto, o partido trava uma nova batalha, agora em torno do texto que regulamenta a terceirização. Mais uma vez, a richa opõe as bancadas da sigla na Câmara e no Senado. Mas a disputa agora promete agitar o Congresso: fortalecidos pelo vácuo de poder em Brasília, em meio à crise política que atravessa o governo Dilma Rousseff, os presidentes da Câmara, Eduardo Cunha (RJ), e do Senado, Renan Calheiros (AL) protagonizam uma guerra em torno do texto.
O projeto foi aprovado pela Câmara na noite de quarta-feira, após um esforço pessoal de Cunha. Mas, no Senado, a ordem de Renan é colocar o pé no freio. O presidente do Senado não poupou críticas ao texto, que estende para todas as atividades a possibilidade de terceirização da mão de obra. Segundo ele, a medida é um “retrocesso”. “É fundamental regularizar os terceirizados, temos no Brasil 12 milhões. Mas não podemos regulamentar, sob hipótese nenhuma, a atividade-fim. É uma involução, um retrocesso. Significa revogar os direitos e garantias individuais e coletivos”, disse nesta quinta-feira. Calheiros promete uma votação “sem pressa” e com uma distribuição correta nas comissões. “O que não vamos permitir é pedalada contra o trabalhador. Não podemos permitir uma discussão apressada que revogue a CLT”, disse.
Leia mais:
PSDB decide apoiar terceirização de atividades-fim
Governo critica, mas é um dos principais agentes de terceirização, diz especialista
Mas a reação de Renan tem como pano de fundo mais do que a preocupação com direitos trabalhistas. O peemedebista ainda não superou a demissão do afilhado Vinícius Lages do Ministério do Turismo para alocar o ex-presidente da Câmara Henrique Alves. Braço-direito de Cunha, Alves foi alçado ao posto após articulação do chefe da Câmara e do vice-presidente da República, Michel Temer. Após a demissão, Lages foi empregado no gabinete da presidência do Senado.
Para deputados peemedebistas ouvidos pelo site de VEJA, há ainda outros fatores por trás das críticas de Renan ao texto: a possibilidade de obrigar o governo a, mais uma vez, sentar-se à mesa com ele, que passou de fiador do Planalto a aliado imprevisível e também a chance de ‘polir’ sua imagem diante da opinião pública no momento em que é alvo de inquérito no Supremo Tribunal Federal por suposto envolvimento no petrolão. “Ele quer ficar no centro das atenções. É um instrumento para ter na mão o governo, que vai pedir para alterar a proposta, e ainda aproveita para limpar sua imagem perante a sociedade, tirando seu nome da pauta da Lava Jato”, avalia um correligionário.
Renan recebeu nesta tarde o projeto, entregue pelo deputado Paulinho Pereira (SD-SP), aliado de Cunha. Na próxima semana, o presidente do Senado programa uma rodada de negociações com alas pró e contra a terceirização.
Entre os senadores peemedebistas, mudanças ao texto são dadas como certas: o líder do partido do Senado, Eunício Oliveira (CE), também já anunciou posição contrária à terceirização para atividades-fim e promete tentar alterar o texto. “Onde couber emenda, eu vou apresentar alterações. A garantia dos direitos dos trabalhadores é a garantia do funcionamento do setor empresariado”, disse. Ele minimizou as divergências entre as bancadas: “Senador é senador, deputado é deputado. O sistema é bicameral. Somos do mesmo partido, mas não quer dizer que pensamos igual. O Eduardo [Cunha] é evangélico, eu sou católico. Ele é contra minorias, gays e lésbicas, eu não sou. As coisas são assim”, continuou.
Cunha, por outro lado, já tem engatilhada uma reação caso o Senado não se empenhe a aprovar o texto: planeja barrar projetos considerados prioritários pelos senadores que aguardam análise da Câmara para ter a votação concluída. Além disso, ele afirma que a Casa é quem dá a última palavra no Congresso, já que o texto volta para sua análise caso sofra alterações. “Mandamos o texto para o Senado, então agora é problema deles. Se voltar para cá, aí volta a ser um problema nosso. E, se o governo vetar, ainda podemos analisar o veto”, disse Cunha.