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Hegemonia do PT no AC tem sua força no assistencialismo

Estado terá em 2014 primeiro segundo turno em vinte anos. Mas a continuidade do PT no poder ainda não parece estar ameaçada

Por Mariana Zylberkan, de Rio Branco
6 out 2014, 12h02

Na noite deste domingo, enquanto eram contabilizados os primeiros votos no Acre, o clima na sede da campanha do atual governador e candidato a reeleição, Tião Viana (PT), era animado. Posicionado como favorito nas pesquisas, a vitória no primeiro turno era dada como certa por sua equipe. Ao longo da apuração, porém, os gritos de comemoração da sala reservada à cúpula petista no Estado foram rareando à medida que caía o porcentual de votos em Tião. Uma diferença de 1.600 votos levou a disputa para o segundo turno, o que não ocorria no Estado desde 1994. Em vinte anos, todas as eleições para o Palácio de Rio Branco foram decididas no primeiro turno e, nos últimos três pleitos, vencidas pelo PT. Os irmãos Jorge e Tião Viana e seus aliados se revezam no poder há doze anos. Agora, Tião seguirá na disputa com o tucano Márcio Bittar, que teve 30,1% dos votos.

Na avaliação de Tião Viana, a candidatura de Marina Silva à Presidência da República pelo PSB e uma votação considerada expressiva do candidato do PSOL, Antonio Rocha, foram os ingredientes que impediram a vitória no primeiro turno. “Nós mantivemos o compromisso com nossa aliança com o governo federal e não apoiamos Marina, isso deixou o eleitor confuso”, diz o candidato à reeleição. Marina foi a presidenciável mais votada no Estado, com 41,99% dos votos.

Além disso, Viana avalia que os cerca de 2.500 votos conquistados por Rocha atrapalharam seu desempenho, já que as disputas pelo governo do Acre tendem a ser bastante polarizadas. “Fosse contabilizada apenas a soma dos dois primeiros adversários, eu venceria”. O Estado é um dos campeões em repasses federais, só o projeto habitacional Cidade do Povo, que prevê a construção de mais de 10.000 casas e infraestrutura, vai custar aos cofres da União 1,1 bilhão de reais. Cerca de 78.000 cidadãos acreanos recebem benefício do programa federal Bolsa Família.

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Entre a população, o assistencialismo é retribuído com uma grande fidelidade ao partido do governo. Bandeiras vermelhas feitas de forma rústica, com pedaços de bambu, salpicam a periferia de Rio Branco em símbolo de apoio ao PT. As bandeiras também dominam as fachadas das casas do projeto habitacional Cidade do Povo, construído com verba pública do Fundo de Arrendamento Habitacional (FAR) do Ministério das Cidades. “O PT fez muita coisa pela gente aqui. Não ligo para as críticas ao partido”, diz Adriano Pereira, de 28 anos. Ele foi contemplado com uma casa no Cidade do Povo onde mora há dois meses – e fez questão de pendurar nela a bandeira vermelha. Antes, ele vivia com os quatro filhos em uma área de risco de alagamento na periferia da capital. Ele recebe renda do Bolsa Família.

Seu vizinho, o carpinteiro João Paixão Silva, de 42 anos, também aceitou o pedido da militância petista e colocou três bandeiras em frente à sua casa no conjunto habitacional. “Votei no Tião e na Dilma porque eles fazem muita coisa boa por aqui”, diz o carpinteiro que tem oito filhos e recebe 372 reais por mês do Bolsa Família. A fidelidade a Tião Viana e, principalmente, ao PT é refletida também na fala de alguns moradores que justificam seus votos por medo de perder o que já conquistara. “Mudar para quê se eles nos dão toda essa estrutura”, diz mais uma moradora do Cidade do Povo, a dona de casa Elenira Costa dos Santos, de 33 anos, que votou em Tião para governador e Dilma para presidente.

Além dos benefícios sociais, a dona de casa tem uma visão crítica de Marina Silva que é compartilhada principalmente por moradores da área rural. A política ambiental implementada pela candidata do PSB enquanto ministra do Meio Ambiente prevê multa alta para quem desmata, mesmo os pequenos agricultores de subsistência. “Não voto mesmo, Não é justo uma pessoa acima da gente nos proibir de plantar para nosso próprio consumo e ainda cobrar multa de quem faz isso”, diz a dona de casa que morava na zona rural de Rio Branco.

Já Raimunda Soares, de 45 anos, deu seu voto a Marina em protesto ao seu descredenciamento do Bolsa Família depois que passou a receber benefício do INSS, após ser diagnosticada com um tumor na cabeça. Ela mora com quatro filhas em um barraco em área de risco na periferia de Rio Branco e está esperando ser contemplada com uma casa na Cidade do Povo. “Ela é acreana vai mudar as coisas por aqui”, afirmou, antes da apuração que tirou Marina da disputa. “A grande maioria da força de trabalho do Estado está empregada no setor público e isso confere um grande controle ao governo estadual que faz de tudo para manter essa estrutura assistencialista e clientelista”, diz o professor da Universidade Federal do Acre, Elder Andrade de Paula.

Emissões de carbono – Com um colégio eleitoral pequeno, cerca de 500.000 eleitores, 0,3% do eleitorado brasileiro, o Acre é estratégico para o governo federal não apenas por causa dos votos fiéis de sua população a cada eleição. O Estado é visto também como uma importante fonte de renda a curto e médio prazo por abrigar no país o primeiro projeto de comércio de emissões de carbono, um nicho de negócio em franca expansão no mundo todo. No ano passado, o banco de desenvolvimento alemão KFW injetou 16 milhões de euros em acordo com o governo estadual do Acre para criar mecanismos que garantam sua credibilidade no futuro perante os órgãos reguladores de compra e venda de créditos de carbono.

O Estado já vem trabalhando nesse projeto desde 2010, quando aprovou a lei que criou o Sistema de Incentivos a Serviços Ambientais (SISA) para regulamentar a relação entre o sistema financeiro e o mercado de carbono, ou seja, estabelece parâmetros para transformar a neutralização de emissão de gás carbônico em negócio. Baseado nesse processo, o Acre firmou recentemente um acordo com a Califórnia, nos Estados Unidos, e Chiapas, no México, para estabelecer o comércio de emissões. “O meio ambiente é visto pelo governo como um riquíssimo nicho de negócio”, diz o professor Elder Andrade de Paula. O governo estadual aposta nessa estratégia para se livrar da intrínseca dependência financeira que tem com o governo federal. Entre 2011 e 2013, a dívida pública do Acre passou de 50,4% da receita para 68,5%.

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