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Antilulista e ex-PFL, Heráclito Fortes ‘marinou’

Um dos expoentes da oposição no Senado durante o governo Lula tenta voltar ao Congresso filiado ao PSB. 'No Brasil, quem dita a ideologia é a caneta', diz

Por Felipe Frazão 20 set 2014, 09h16

O ex-senador Heráclito Fortes “marinou”. Aos 64 anos, ele tenta voltar a Brasília como deputado federal pela sexta vez. Pretende ser base de governo da ex-petista Marina Silva – como ele, uma neófita no PSB, atraída para o partido pelo ex-governador de Pernambuco e ex-ministro do governo Lula Eduardo Campos, morto em acidente aéreo em agosto. Ícone do antilulismo na oposição no Congresso Nacional, o ex-PFL agora apoia a candidatura construída por dois ex-ministros do petista e ostenta uma flâmula vermelha e amarela do Partido Socialista Brasileiro sobre a mesa de seu gabinete, no confortável apartamento onde mora em Ilhotas, bairro nobre de Teresina (PI). A bandeira à mostra não o impede de chamar o golpe militar de 1964 de “revolução” quando justifica que, no Brasil, “nunca houve episódio de mudança que não tenha se concretizado com a junção de oposicionistas e [ex] aliados do governo”.

“No Brasil, quem dita a ideologia é a caneta. Essa disputa entre direita e esquerda é abstrata. Ao pé da letra, todos os partidos são socialistas. Isso se define com atitudes e não com placa. Eu fui prefeito de Teresina e não fiz uma obra para rico, só trabalhei em ações de povo”, disse ao site de VEJA, durante conversa no último dia 13, um sábado, horas antes do comício de Marina na capital piauiense.

Heráclito foi líder do governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB) na Câmara. Mas agora tem planos mais modestos. Após a morte de Campos, o espaço para ele e ex-pefelistas que aderiram ao PSB, como os Bornhausen (do PSD), encolheu. Na passagem relâmpago de Marina pelo Piauí, Heráclito teve presença discreta no palanque. Ficou a cerca de três metros de distância de Marina, de braços cruzados, observando a presidenciável discursar. Nos bastidores, enfrentou a fúria dos integrantes da Rede Sustentabilidade. Assessores do ex-senador e sonháticos bateram boca nos camarins. “Tem gente da velha política inserido aqui, como o Heráclito Fortes, e a gente não aceita, porque o histórico dele não representa a nova política. Não tem como conciliar, não estamos de acordo com essa junção do novo com o velho”, reclamou Dionísio Carvalho Neto, representante do Piauí na cúpula da Rede, mas, ao mesmo tempo, secretário-executivo de Meio Ambiente e Recursos Hídricos na prefeitura de Teresina. Vale lembrar, uma cidade administrada pelo PSDB – partido a que Marina rejeita se associar. O jovem de 29 anos, formado em Jornalismo e Gestão Ambiental, recebe 7.301.44 reais na função de confiança a convite do prefeito tucano Firmino Filho. “Ele vai sair do palco”, exigia Neto.

Dionísio Neto, no Piauí
Dionísio Neto, no Piauí (VEJA)

Heráclito não só ficou no palco, como fez questão de ciceronear a presidenciável. Acompanhou o desembarque da comitiva no Aeroporto de Teresina e, já na madrugada de domingo, pegou carona na van que levava Marina depois do comício ao hangar de onde decolaria de jato para Brasília. Dono de um avião King Air C9-GT, avaliado em 3,7 milhões de reais, segundo sua declaração à Justiça Eleitoral, o ex-PFL aposta em erro dos pilotos no acidente que matou Campos, ainda inconformado com o acidente. Relata que o convite de Campos foi decisivo para a adesão ao PSB – no Congresso, havia se aproximado dele e do avô, Miguel Arraes.

“Quem toma conta da campanha e do futuro da Marina é a natureza. Essa campanha está sendo levada pela força da natureza. Não tem nem partido, porque não deu tempo. Nós estamos diante do traumatismo da morte de um cara de 49 anos que teve de morrer para o Brasil conhecer sua mensagem”, diz Heráclito.

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Com patrimônio declarado de 5 milhões de reais, Heráclito faz uma das campanhas mais caras do Piauí. Já arrecadou mais de 1,4 milhão de reais, as maiores doações na própria família. Os cavaletes da campanha de Heráclito, um dos que se vê em maior quantidade nas ruas de Teresina, levam uma foto dele cercado por microfones de TVs e rádios e a frase: “Ele está fazendo falta”. O ex-senador também circula em uma pick-up F-250 com espaço para seis passageiros, além do motorista e do carona (banco que ele sempre ocupa). A exemplo dos cavaletes, a chamativa caminhonete adesivada não tem fotos de Marina.

Da esquerda para direita: Palanque do PSB no Piauí reúne o ex-governador Wilson Martins, candidato ao Senado, Marina Silva, Beto Albuquerque, candidato a vice-presidente, e o ex-senador do DEM Heráclito Fortes (de azul) - 13/09/2014
Da esquerda para direita: Palanque do PSB no Piauí reúne o ex-governador Wilson Martins, candidato ao Senado, Marina Silva, Beto Albuquerque, candidato a vice-presidente, e o ex-senador do DEM Heráclito Fortes (de azul) – 13/09/2014 (VEJA)

“Seria hipocrisia minha ou de qualquer senador dizer que teve intimidade com ela, mas tivemos uma relação respeitosa. Presidia a Comissão de Infraestrutura e fizemos muitas discussões que geralmente batiam na Marina e na Dilma [então ministras de Lula]. Ela travava muito a questão quando ia para o problema ambiental, mas sempre foi civilizada”, recorda.

Com cinco partidos no currículo (além de PSB e DEM, passou por PMDB, PP e Arena), Heráclito Fortes defende que Marina busque apoio do PSDB e do DEM num eventual segundo turno da disputa presidencial. Ele avalia que Marina está “certíssima” ao dizer que vai buscar “os melhores de cada partido”. Apesar da amizade com o presidenciável tucano Aécio Neves, Heráclito não se sente confortável para articular uma aproximação entre os dois candidatos. Ao menos por ora. “Tem gente mais qualificada para isso. Estou querendo voltar, mas o caminho da volta é muito penoso, não sei como as coisas vão acontecer”, desconversa. “O Aécio precisa manter a candidatura porque ele tem de salvar a bancada. Ele não pode tergiversar em nenhum momento. A primeira coisa é ver como esses partidos [PSDB e DEM] vão chegar ao day after.”

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Padilha – Derrotado na campanha de 2010 ao Senado por Wellington Dias (PT) e Ciro Nogueira (PP), o neopessebista afirma ter sido alvo do Palácio do Planalto, ao lado de uma bancada de ex-senadores que infernizava a vida de Lula: Tasso Jereissati (PSDB), Mão Santa (PSC), Heloísa Helena (PSOL), Marco Maciel (DEM) e Arthur Virgílio (PSDB). Segundo Fortes, o PT empenhou-se em beneficiar adversários dos senadores. “Fomos escolhidos pelo Planalto para não voltar porque nós prejudicávamos o governo federal. E aí quem foi escalado para ser o capitão da operação? Alexandre Padilha, era o ministro da articulação política, e hoje não passa dos 8% de intenção de voto em São Paulo. Mas Deus está vendo e ele hoje está pagando os 8%. Fico numa felicidade danada quando eu vejo”, diz.

O desafeto de Lula assiste à distância os embates e ataques da campanha do medo de Dilma Rousseff contra Marina. Enxerga pelo menos uma semelhança: “O que a Marina está sofrendo agora do PT, eu sofri durante anos. O PT não quer contestação. Mas essa artilharia de pancada pode surtir um efeito contrário e a Marina sair vitimizada”. Para Heráclito, o PT não tem argumentos contra Marina: “Quando a pessoa não serve mais, eles passam a execrar, como fizeram com a Heloísa Helena e com o Maurício Rands. Vai bater na Marina porque ela é pobre, frágil, amazônica, nasceu em casa de chão batido e aprendeu a ler aos 16 anos? Por causa da Fundação Chico Mendes? Quem poderia bater na Marina está calado, o campo e o setor agrícola é que teriam legitimidade para bater nela e estão calados.”

Segundo o Ibope, porém, a presidente-candidata é favorita no Nordeste e ostenta índices ainda mais expressivos de intenção de voto na terra de Heráclito: 61%, ante 24% de Marina e 6% de Aécio Neves. A preferência pela petista no Piauí, Estado em que metade da população recebe o Bolsa Família, dificilmente será revertida, avalia o homem que encarnou o antipetismo local. A predileção pelo PT reverbera na campanha ao governo estadual. O senador Wellington Dias (PT) soma 49% e venceria o atual governador, Zé Filho (PMDB), que tem 22%. “A Marina está quebrando um pouco isso, mas não sei se ela vai quebrar na velocidade que precisa. Eu não acredito que nem quebre no primeiro turno, mas que vai dar uma canseira no segundo turno eu não tenho nenhuma dúvida”, diz. “O PT não fez nenhuma obra estruturante nesses quatro anos. Sustenta-se só com o Bolsa Família. E se faz o terrorismo de que se a Dilma perder acaba a Bolsa Família, o que a Marina tranquiliza um pouco por causa das origens e pelo fato de ter participado do governo e da elaboração do programa. Na primeira eleição do Lula, o único Estado do Nordeste que o PT elegeu governador foi o Piauí. Meu medo agora é que o Piauí seja o de novo, não é possível.”

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