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Deixem a Internet livre de impostos

Os impostos sobre tecnologia de informação e comunicação são o equivalente moderno de comer a semente que seria plantada no próximo ano

Por Da Redação
Atualizado em 30 jul 2020, 21h43 - Publicado em 26 dez 2014, 18h22

Quando você desencadeia um dos maiores protestos no Leste Europeu desde a queda do comunismo, você sabe que despertou o eleitorado. Isso é exatamente o que o governo húngaro fez ao propor recentemente um imposto sobre a internet de 50 centavos de euro (1,6 real) por gigabyte. Mais de 100.000 manifestantes se reuniram em Budapeste, furiosos com o significado político do imposto e seu impacto econômico real. O governo do primeiro-ministro Viktor Orbán recuou rapidamente.

O imposto proposto pela Hungria era absurdo – semelhante a calcular impostos pela leitura de livros ou cobrar as pessoas por conversas com amigos. Mas a proposta, mesmo se descartada (embora Orbán tenha dado a entender que pode trazer o assunto de volta de outra forma), permanece preocupante, porque é parte de uma tendência inquietante. Vários países introduziram impostos e tarifas que dificultam a adoção e utilização de tecnologia de informação e comunicação (TI). Todos juntos, 31 países – incluindo Brasil, Turquia e Grécia – adicionam 5% ou mais ao custo de TI, em cima de impostos sobre valor agregado já existentes.

Na Hungria, o imposto proposto teria sido particularmente oneroso, porque aumentaria o custo de dados móveis em 5 a 15% e teria um impacto ainda maior sobre as assinaturas de banda larga fixa. Para os jovens e pobres, seria um encargo significativo. Um valor de 2,30 euros por pessoa (7,50 reais), proposto às pressas após o clamor público inicial e antes da proposta ter sido retirada, teria sido insuficiente para aliviar esse fardo sobre os usuários de baixa renda da Internet, reduzindo drasticamente a receita total do programa.

Como os manifestantes em Budapeste enfatizaram, o imposto proposto é equivocado para a Hungria. É equivocado em outros países, também. Governos sem recursos adotam estes impostos porque os bens e serviços de tecnologia da informação são um alvo fácil para as autoridades fiscais. Além disso, eles são às vezes falsamente caracterizados como produtos de luxo – como se a internet não tivesse se tornado vital para a vida das pessoas.

Estas políticas são, em última análise, autodestrutivas. Os aumentos de preço resultantes impedem a adoção e utilização de TI, reduzindo as receitas fiscais de aquisições de bens e serviços. E a evidência mostra um efeito indireto ainda maior: restringir a adoção de TI amortece o crescimento. Em última análise, essa política tem um impacto negativo na receita fiscal total, contrabalançando os ganhos de taxas pela utilização da Internet. Um estudo mostrou que, para cada dólar equivalente a tarifas impostas pela Índia para produtos importados de TI, o país sofre uma perda econômica de 1,30 dólar pela baixa produtividade.

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Os impostos sobre TI são o equivalente moderno de comer a semente que se estava guardando para plantar no próximo ano. A adoção de tecnologia de informação leva a mudanças tecnológicas fundamentais, potencialmente transformando uma ampla gama de setores, bem como a vida cotidiana das pessoas. Para as empresas, a TI pode melhorar a eficiência e facilitar a administração. Para as pessoas, pode aumentar os rendimentos e facilitar o dia a dia.

Os benefícios de bens e serviços de TI crescem significativamente à medida que mais empresas e consumidores passam a usá-los. Políticas governamentais inteligentes, tais como subsídios ou interrupção temporária na cobrança de impostos para compras de TI, impulsionam a adoção de tecnologia, ao ajudar usuários que, de outra forma, não teriam condições de compra. A tributação sobre a internet, assim como outros impostos e tarifas sobre bens e serviços de TI, tem o efeito contrário.

O imposto proposto pela Hungria foi especialmente pernicioso por causa da sua fraca concepção. Como o imposto seria uma taxa fixa de 0,50 euro por gigabyte, sua participação nos gastos totais de TI aumentariam à medida que o custo de um gigabyte caísse – como era quase certo de acontecer. O valor no imposto impediria a taxa de crescer de forma espiral, mas o aumento nas larguras de banda levaria a maioria dos usuários ao máximo rapidamente, afetando não só os consumidores mais pobres, mas também novas ou pequenas empresas. Manter as pessoas pobres e empreendedores fora internet não é uma forma de financiar um governo.

Os países se sairiam melhor com políticas que promovessem a TI: eliminação de impostos e tarifas sobre os produtos e serviços, remoção de barreiras não tarifárias como as que exigem armazenamento de dados local e incentivo à inovação digital e transformação em setores econômicos através de regulamentação e melhoria na forma de aquisições. O resultante aumento da produtividade, competitividade e crescimento econômico estabeleceria uma base muito mais estável e bem-sucedida para o aumento das receitas fiscais.

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A União Europeia como um todo tem feito um bom trabalho em manter os impostos e tarifas baixas sobre TI, apesar das sérias dificuldades fiscais em muitos países. De fato, o regime fiscal geral não discriminatório tem sido um importante benefício para a adoção de TI e o comissário da UE para agenda digital se pronunciou fortemente contra imposto proposto na Hungria, chamando-o de “uma ideia particularmente ruim”. O único país da UE com impostos expressivos sobre produtos e serviços de TI (cerca de 9%) é a Grécia, um caso especial na Europa.

As recentes ações dos legisladores húngaros mostram que nenhum país está imune às ideias de má política. Os governos precisam de receitas, mas a forma como eles as conseguem molda as economias de seus países incentivando algumas transações e desencorajando outras. As políticas que incentivam a adoção de TI são uma escolha certa para o crescimento econômico inclusivo e de longo prazo. Como mostrou o caso da Hungria, em última análise, são os cidadãos que devem manter os governos responsáveis e garantir que as políticas fiscais e tarifárias funcionem em benefício de todos.

Robert D. Atkinson é o fundador e presidente da Information Technology and Innovation Foundation. Ben Miller é analista político da Information Technology and Innovation Foundation.

(Tradução: Roseli Honório)

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© Project Syndicate 2014

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