Rinkeby, o pesadelo da ultradireita sueca
Para se defender de medidas discriminatórias, bairro dos imigrantes garante os votos na esquerda
Nos últimos anos, chegaram tantos somalis que em Estocolmo o bairro é conhecido como pequeno Mogadiscio
Rinkeby encarna tudo o que a ultradireita detesta. Um bairro a apenas dez estações do metrô do centro de Estocolmo, onde as lojas de roupa vendem chadors e hijabs, os restaurantes servem kebabs e café turco, nove entre dez habitantes são imigrantes ou filhos de imigrantes, e pelas ruas se fala somali, espanhol, turco, bósnio, persa, árabe… e com sorte um pouco de sueco.
“Aí, não. Os democratas da Suécia não colocam os pés aqui”, disse o salvadorenho Eduardo Mejía, referindo-se ao partido de direita, enquanto distribui folhetos da Coalizão Rubro-verde que advertem em nove idiomas: “Vote; não arrisque que os racistas entrem no Parlamento”.
Diante do local de votação, uma ferida de guerra: as ruínas de um centro juvenil incendiado no começo do verão. Jovens, irritados ou talvez simplesmente entediados porque não os deixaram entrar numa festa no instituto decidiram queimar o prédio. Depois enfrentaram a polícia anti-distúrbios com pedradas e causaram outros nove incêndios no bairro.
Para Ann-Margarethe Livh, candidata municipal de esquerda, o episódio é uma consequência do esquecimento que sofreu Rinkeby durante os últimos quatro anos de governo conservador. “Fecharam tantos centros culturais, e num bairro assim é mais importante do que nunca que existam centros públicos aonde os jovens possam ir, porque seus pais não podem pagar aulas de vela ou de tênis, e eles não têm dinheiro nem para ir dançara no centro de Estocolmo.”
Viúva de um chileno e moradora de Rinkeby há 30 anos, ela explica que o bairro tem cada vez menos vizinhos suecos e que os imigrantes estabelecidos há mais tempo, como finlandeses e latino-americanos, também estão indo embora. “E já sabemos o que acontece quando os serviços públicos se deterioram e as pessoas com alguma possibilidade vão embora: nasce um gueto. Ainda não é o caso de Rinkeby, mas se seguir assim, será.”
Eduardo Mejía, que chegou a Rinkeby em 1982 fugindo da guerra civil em El Salvador, também sente que o bairro está mudando. “Antes, o ambiente era mais multicultural. Havia gente de todas as partes e todos nos misturávamos. Meus filhos cresceram aqui e desde pequenos se acostumaram à diversidade, a ouvir dezenas de idiomas a cada dia. Hoje é diferente, Rinkeby está se enchendo de somalis. Não digo isso como algo mal, mas é inegável que o ambiente mudou.”
Nos últimos anos, chegaram tantos somalis que em Estocolmo o bairro é conhecido como pequeno Mogadiscio. No ano passado, os serviços secretos suecos alertaram que a milícia islâmica somali Al Shabab estava recrutando jovens em Rinkeby para a guerra santa na Somália.
Que Rinkeby seja um bairro de esquerda fica evidente pelo fato de que nas praças só existam social-democratas, a esquerda e os verdes. Mas os moderados do primeiro-ministro que deixa o cargo, Fredrik Reinfeldt, também têm seus votos. Rahma Dirie, de 27 anos e origem somali, está na porta do local da eleição distribuindo filipetas. Até hoje sempre votou nos social-democratas, mas mudou de lado quando viu “tudo o que os conservadores conseguiram”. “Quando emigramos para a Suécia nos anos 90, meu pai ficou 13 anos sem trabalho. Treze anos! Tivemos que ir para a Noruega. Creio em um país em que as pessoas possam ser autônomas e prosperar sem depender do estado. E os moderados são os únicos que conseguiram isso”, assegura.
Rahma explica a quem quiser ouvir que os moderados construirão a primeira mesquita de Rinkeby. “Os social-democratas, tantos anos no governo e nos deixaram rezando nas ruas.” Ann-Margarethe Livh tem outra opinião. “A direita promete a eles uma mesquita quando este bairro precisa de mais investimentos e mais empregos (50% dos moradores são desempregados). Claro que não é a primeira vez na história que se usa a religião para comprar votos”, suspira.