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Código de barras da vida acelera identificação das espécies

Nos próximos quatro anos, 10% da biodiversidade brasileira será catalogada com ajuda da técnica conhecida como DNA barcoding

Por Tatiana Gerasimenko
Atualizado em 6 Maio 2016, 17h05 - Publicado em 17 jul 2011, 14h13

Para o Ibama, a cena não tem nada de inusitada. Uma pessoa é detida em flagrante no aeroporto com ovos presos ao corpo. Sabe-se que o tráfico de animais silvestres é considerado crime ambiental, mas não se sabe ao certo que espécie foi apreendida. Se a ave estiver na lista dos animais em risco de extinção, a punição pode ser mais dura. Mas como saber de que espécies são os ovos? A tarefa, às vezes árdua até para taxonomistas, deve receber uma mãozinha extra agora que brasileiros se uniram ao consórcio internacional Barcode of Life (iBol). Cerca de 10% da biodiversidade brasileira será catalogada em quatro anos com a ajuda de uma técnica conhecida como DNA barcoding, o ‘código de barras da vida’.

Sequência de nucleotídeos presentes em fragmento de DNA vira ‘código de barras animal’ ()

A ideia é a seguinte: um trecho da sequência de DNA de cada exemplar brasileiro será usado para produzir o que seria um ‘análogo’ do código de barras utilizado em produtos em geral. “A diferença é que para identificar produtos se utiliza uma sequência de números e nesta técnica se usam sequências de nucleotídeos, que são os bloquinhos que constituem o DNA”, explica Cláudio Oliveira, pesquisador do Instituto de Biociências da Unesp em Botuctatu e coordenador da Rede de Pesquisa de Identificação Molecular da Biodiversidade Brasileira (BR-BoL), criada no final de 2010. A meta é identificar 120.000 exemplares de 24.000 espécies nos próximos anos. “Assim como os códigos de barras são característicos dos produtos, as sequências de DNA são características das espécies.”

Pesquisador do Instituto de Biociências da Unesp, Cláudio Oliveira. coordena a rede brasileira envolvida no projeto de catalogação de ‘códigos de barra da vida’ ()

O primeiro passo da rede brasileira é analisar o material que há tempos está disponível em laboratórios e coleções científicas. Isso, contudo, não impede que exemplares nunca antes catalogados sejam identificados: muitas espécies não se distinguem do ponto de vista morfológico, e apenas análises genéticas podem diferenciá-las. É o caso de uma nova espécie de Tetragonopterus, identificada pela equipe coordenada por Cláudio Oliveira. Trata-se de um peixe encontrado nas águas amazônicas do Rio Jari, na divisa entre os estados do Amapá e Pará. Os resultados obtidos pelo DNA barcoding revelaram uma significativa diferença entre a nova espécie e as demais do gênero.

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Pressa – Existem atualmente cerca de 1,7 milhão de espécies catalogadas no mundo, e estima-se que haja mais 4 milhões ainda desconhecidas. Só no Brasil, acredita-se que haja 600.000 espécies por conhecer (estimativas mais ‘otimistas’ apontam que o número pode chegar a quase 2 milhões). Os cientistas até poderiam se valer de estratégias convencionais da taxonomia para encontrá-las ao logo dos anos, mas há certa urgência em função de ameaças ambientais, do desmatamento às mudanças climáticas. “É muito importante que possamos ter a visão mais ampla possível da nossa biodiversidade antes que impactos irreversíveis levem um grande número de espécies à extinção”, ressalta Oliveira. “E é muito mais fácil conservar o que conhecemos.”

O que é DNA barcoding?

É a identificação genética dos seres vivos segundo determinados padrões. Para tanto, dois aparelhos são utilizados. No chamado termociclador, amostras de DNA são copiadas, a partir de algum tecido do animal, como pele, carne, sangue etc. No sequenciador, é feita a leitura do código genético. É a mesma estratégia do sequenciamento de genoma, a não ser por um detalhe: apenas um fragmento de um único gene presente em todas as espécies é usado para comparações – o gene codificador da proteína Citocromo Oxidase I (COI). Ele é considerado um bom marcador por combinar trechos muito variáveis a outros de grande regularidade. Mas não é o único, nem se presta a todo tipo de espécie. Para plantas, por exemplo, os cientistas costumam usar outros trechos do DNA.

O entomologista José Albertino Rafael, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, acredita que a técnica é um avanço para a taxonomia: “Vamos demorar mais mil anos para catalogar todos os animais se continuarmos no ritmo que estamos”. Para identificar uma nova espécie, é preciso compará-la aos exemplares já identificados. “Conforme o grupo vai ficando maior, fica mais difícil descrever novas espécies, porque é preciso conhecer todas as existentes e catalogadas”, explica. Um banco de códigos de barra pode acelerar as comparações. Mas o cientista Rafael ressalva que isso não exclui a necessidade de caracterizar a espécie morfologicamente.

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Escala – A análise de material genética faz tempo é uma ferramenta conhecida dos cientistas. A equipe do geneticista da PUCRS, Eduardo Eizirik, por exemplo, realizava trabalhos de identificação molecular de organismos com técnicas semelhantes há mais de cinco anos. “O que mudou com o barcoding foi a escala. É a ideia de padronizar os processos de identificação em nível global para toda a biodiversidade e prezar pelo zelo no processamento de vários passos necessários para criar uma base de dados completa e integrada”, explica o pesquisador, que passou a coordenar a geração de código de barras em mamíferos, aves, répteis e anfíbios. “Até onde eu sei, nunca houve uma rede de pesquisa no Brasil focada nesse assunto com esta amplitude, então isso já é uma conquista”.

Para além do ambiente acadêmico, uma rede ampla e padronizada de identificação genética pode ter aplicações tanto no combate ao tráfico de animais como no controle de fraudes no comércio de produtos animais. Isso porque o barcoding permite a identificação da espécie a partir de partes dos bichos, como um pedaço de carne, osso ou pelos, sangue etc. Nos Estados Unidos, o código de barras da vida já está sendo usado pela Food and Drug Administration, que regula alimentos e medicamentos, como forma de conter fraudes na importação de produtos animais.

Info biodiversidade no brasil e no mundo ()
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