Uma investigação do jornal britânico The Guardian revelou que mais de 160 leis do Reino Unido concedem imunidade especial à rainha Elizabeth II. Segundo o levantamento, baseado em documentos oficiais e análise da legislação, a monarca estaria isenta de impostos e de cumprir desde regras de proteção ambiental até direitos trabalhistas.
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Chamada de “imunidade soberana”, a doutrina secular estabelece que processos criminais e civis não podem ser movidos contra o monarca como chefe de Estado. Ela deriva em parte do conceito medieval de que o rei (ou rainha) é a fonte da justiça e, portanto, não pode errar.
O princípio também se baseia no argumento de que, como os tribunais pertencem à rainha, ela não pode ser obrigada a comparecer neles, pois estaria processando a si mesma.
A investigação descobriu que foram mais de 160 leis escritas desde 1967, que apresentam cláusulas que protegem a soberana de responsabilidades legais. O governo do Reino Unido e o Palácio de Buckingham se recusaram a comentar o processo pelo qual a imunidade foi registrada na legislação nacional.
Entre as isenções mais controversas está a medida que proíbe os funcionários da rainha de apresentar queixas de discriminação sexual e racial. Mesmo a lei antidiscriminação mais moderna, a Lei da Igualdade de 2010, foi projetada para não proteger os empregados do Palácio.
Outras leis desobrigam a monarca de observar vários direitos trabalhistas relacionados à saúde e segurança ou prover pensões.
Trinta e uma leis contêm cláusulas que proíbem a polícia ou inspetores ambientais de acessar as propriedades privadas da família Windsor, sem a permissão da rainha, para investigar crimes, incluindo denúncias sobre maltrato de animais e poluição ambiental – uma imunidade legal concedida a nenhum outro proprietário privado no país.
Em um caso relatado pela primeira vez no ano passado, os advogados da rainha fizeram um lobby secreto para que as empresas privadas da rainha ficassem livres de cumprir uma importante lei escocesa que reduz as emissões de carbono.
Outras cláusulas a isentam de uma variedade de impostos cobrados de outros cidadãos britânicos ou fornecer informações a fiscais ou dados estatísticos oficiais.
No início da década de 1990, o Palácio de Buckingham admitiu que a rainha não pagava imposto de renda ou ganhos de capital, inclusive sobre seus empreendimentos privados, e após severas críticas públicas, ela concordou em pagar alguns impostos “voluntariamente”.
Contudo, em 2013, ministros escoseses aprovaram medidas que estipulam que a rainha Elizabeth não será taxada ao comprar de terrenos, fazer descartes em aterros e está parcialmente livre de impostos sobre viagens aéreas.
Especialistas em direito constitucional consultados pelo Guardian alertaram que os privilégios legais concedidos à rainha minam a noção de que todos são iguais perante a lei. Por outro lado, eles explicaram que, como monarca, ela tem personalidade jurídica pública e privada.
De acordo com a pública, Elizabeth II é a figura pública que serve como chefe de Estado e possui bens históricos como o Palácio de Buckingham ou a coleção de arte real, que não pode ser vendida.
Como personalidade privada, Elizabeth Windsor é uma pessoa física que pode comprar e vender investimentos e ativos como qualquer outro cidadão.
O secretário de comunicações da rainha, Donal McCabe, defendeu que a lei do Reino Unido geralmente não se aplica ao governo e à monarquia. “Os princípios da aplicação da coroa são estabelecidos há muito tempo e amplamente conhecidos”, disse a autoridade.
A doutrina de “imunidade soberana” não é exclusiva do Reino Unido: vários países têm leis ou convenções que imunizam o chefe de Estado de ações legais. As imunidades conferidas à atual rainha serão, na maioria dos casos, transferidas para o príncipe Charles quando ele se tornar rei.