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Para alcançar o poder, Matteo Salvini mergulha Itália em caos político

Orgulhoso de ser chamado de 'populista', líder de extrema-direita aposta em eleições neste ano para tornar-se primeiro-ministro

Por Denise Chrispim Marin Atualizado em 20 ago 2019, 21h29 - Publicado em 20 ago 2019, 19h35

Na praia de Sabaudia, na costa italiana, Matteo Salvini anunciou no início de agosto ter perdido a fé na coalizão entre seu partido, o Liga, com o Movimento Cinco Estrelas – as duas forças de extrema-direita que sustentavam o governo encerrado nesta terça-feira do premiê Giuseppe Conti. De calção de banho, copo de bebidas na mão, mulheres em biquini à sua volta, Salvini não disfarçava sua pança bronzeada enquanto prenunciava o golpe político que daria nas semanas seguintes, em Roma.

Pela imprensa, ainda com os pés na areia da praia, pedia aos cidadãos italianos “dar-me total poder para fazer integralmente o que nós prometemos, sem desaceleração nem corda em torno do nosso pescoço”. Não poderia ter sido mais transparente.

Rosto do nacionalismo de extrema direita da Itália, Salvini detonou a coalizão governista e apresentou ao Parlamento moção de censura ao premiê Conti, um acadêmico independente que aceitou conduzir um governo comandado, na prática, pelo líder da Liga. Amparado na popularidade elevada de sua legenda e na convicção de que seria ungido primeiro-ministro, Salvini forçava pela convocação de eleição parlamentar imediata. Seu tiro ainda não atingiu o alvo e pode não roçá-lo nunca.

Conti renunciou nesta terça-feira, 20. As eleições, que Salvini esperava para o período de outubro a dezembro, devem ficar para o ano que vem. O presidente italiano, Sérgio Mattarella, ainda busca a composição de uma nova coalizão de governo, da qual o líder da Liga pode ficar de fora. Entre as pressões da União Europeia por maior rigor orçamentário e a campanha de Salvini por uma farra fiscal, a Itália mergulha agora em mais uma onda de caos político.

No país que deu vivas a Mussolini, a Matteo Renzi e a Silvio Berlusconi, o político milanês de 46 anos é adorado por uma parcela substancial do eleitorado, mas visto continente afora como o homem mais perigoso da Europa. Falastrão, ataca o bloco europeu e o euro com a facilidade com que promete a devolução da lira como moeda forte dos italianos. “O euro é uma moeda fracassada, uma moeda errada, um experimento falido”, afirma frequentemente. “Não precisamos de um homem forte. Mas precisamos de um país forte que não seja subordinado à Europa. Com sua própria moeda, por exemplo.”

Também defende a família e o casamento sagrado apenas entre homem e mulher – embora tenha se casado duas vezes. Depois de várias namoradas, declarou ter encontrado o amor em Fracesca Verdini, uma italiana 20 anos mais nova que ele.

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Matteo Salvini, ministro do Interior da Itália: contra resgate de imigrantes náufragos no Mediterrâneo – 25/07/2019 (Yara Nardi/Reuters)

Salvini demoniza tanto os imigrantes como os combate, para deleite dos italianos avessos aos árabes e africanos indocumentados em fuga de vida ou morte de seus países de origem. O navio humanitário espanhol Open Arms continuava ancorado nesta terça-feira na costa de Lampeduzza sem sua autorização para o desembarque dos passageiros salvos em alto-mar, apesar de parecer da Justiça em favor dos imigrantes. Em desespero, 15 desses refugiados se lançaram novamente às águas, na esperança de alcançar a nado terras italianas, enquanto Salvini executava seu golpe político.

“Precisamos de centros de deportação”, costuma alardear aos xenófobos do país. “Estamos sob ataque. Nossa cultura, sociedade, tradições e modo de vida estão em risco”, disse, referindo-se ao ingresso de imigrantes, sobretudo muçulmanos, contra os quais foi inclemente na frase seguinte. “O problema da presença dos muçulmanos é crescentemente preocupante. Há cada vez mais conflitos, mais demandas. E eu duvido da compatibilidade da lei italiana com a lei muçulmana porque não se trata somente de religião, mas de lei.”

Viva a linguiça

Chamado de “homem forte da Itália” e de “capitão”, embora não tenha obtido a patente no serviço militar, como o presidente Jair Bolsonaro, Salvini exprime ideais muito parecidas aos do brasileiro e às do líder americano, Donald Trump. Mas é a Vladimir Putin que reverencia. Ele nega, mas a procuradoria pública italiana investiga a negociação de financiamento ilícito à Liga conduzida por um assessor seu em Moscou.

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A construção do líder da extrema-direita italiana deu-se a partir de sua filiação à Liga do Norte, em 1990. Três anos depois, foi eleito vereador em Milão, sua terra natal. Não chegou a se graduar na Universidade de Milão, onde cursou História. Mas projetou-se mais tarde como jornalista da publicação Padania e da Rádio Padania Libera, os meios de comunicação do partido.

Atuou no Parlamento Europeu, foi eleito para o Senado italiano e foi catapultado pelas eleições de 2018, com a vitória da aliança formada pela Liga, Forza Itália, de Berlusconi, Fratelli d´Itália e Nói con l´Itália. Mas chegou a vice-premiê e ministro do Interior a partir da nova coalizão de governo de sua Liga com o Movimento Cinco Estrelas.

Salvini não nega ser um populista de direita. Antes, considera a expressão como um “elogio”. Alvo fácil das revistas de celebridade e de tabloides, não dispensa frases ao gosto do italiano médio em seus discursos e entrevistas nem o uso descontrolado das redes sociais. Logo depois da eleição de 2018, alegando ter perdido muitos quilos na campanha pelo país, declarou em Pádua que poderia comer naquela noite “seis quilos de polenta com ossobuco”.

“Eu não diria salame ou carne de porco porque algumas pessoas podem se sentir ofendidas. Viva a linguiça! Viva o salame! Viva a carne de porco, à copa, à pancetta”, animou-se. Para o deleite de boa parte dos italianos, Salvini também conhece o valor de uma barriga masculina avantajada. “Um homem sem pança é um homem sem substância”, disse na praia, em Sabaudia, ciente do sucesso que sua frase faria.

No poder ou fora dele, Salvini e sua legenda continuarão populares na Itália por tempo indefinido. O partido obteve 17% dos votos na eleição nacional de março de 2018 e 38% no pleito para o Parlamento europeu, em maio passado. Pesquisas recentes mostram que o partido de extrema-direita conquistaria 38% dos votos em novas eleições nacionais – as mesmas almejadas por Salvini para este ano.

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