Ignacio Ortega.
Moscou, 14 dez (EFE).- O presidente da Duma, a Câmara baixa do Parlamento russo, um dos principais colaboradores de Vladimir Putin, é a primeira vítima política da onda de protestos contra a acusação de fraude que pesa contra o Governo nas recentes eleições parlamentares.
‘Hoje tomei a decisão de renunciar a minha condição de deputado’, anunciou Boris Gryzlov, quem dirigia a Duma desde dezembro de 2003.
Sobre o número dois do partido governista Rússia Unida (RU) recai a culpa pelos maus resultados colhidos pelo partido liderado pelo primeiro-ministro Putin no pleito legislativo de 4 de dezembro.
A oposição, particularmente a não parlamentar, acusa o Governo de falsificar resultados eleitorais para que a RU obtivesse a maioria absoluta na Duma.
‘Embora a lei não contemple nenhuma limitação, não estarei presente na Duma, já que considero incorreto ostentar o cargo de presidente da Câmara além de dois mandatos consecutivos’, justificou Gryzlov, citado pelas agências russas.
O funcionário afirmou, no entanto, que vai continuar à frente do conselho da RU e que ‘está disposto a trabalhar onde o presidente decidir’.
Ministro do Interior entre março de 2001 e dezembro de 2003, Gryzlov foi um dos funcionários mais próximos a Putin desde a vitória dele nas eleições presidenciais de março de 2000.
Durante sua gestão, Gryzlov, de 61 anos, foi muito criticado por transformar a Câmara dos Deputados em um mero órgão de certificação das decisões do Kremlin e do Governo.
‘A Duma do Estado não é lugar para debates políticos’, foi uma de suas célebres frases.
A Câmara dos Deputados perdeu tanta relevância durante os últimos anos que é a instituição política menos valorizada pela população.
Para os analistas, a renúncia de Gryzlov permitirá ao Kremlin colocar à frente da Duma um funcionário de maior peso político, com o objetivo de melhorar tanto sua imagem quanto a cooperação entre o Governo e a oposição parlamentar.
O chefe do comitê central da RU, Andrei Vorobiov, afirmou que a renúncia de Gryzlov é parte da ‘inevitável rotação dos quadros’ na Rússia após as eleições legislativas, nas quais seu partido perdeu 77 deputados e quase 13 milhões de votos.
‘Não há dúvida de que o futuro guarda uma importante renovação’, augurou.
Por outro lado, o líder do partido liberal Yabloko, Sergei Mitrokhin, não acredita que a saída de Gryzlov represente uma mudança radical no panorama político russo.
‘Não vejo nenhuma grande notícia. Gryzlov nunca foi uma figura política autônoma. Por isso, o executor da vontade de Putin será substituído por outro’, opinou.
Mitrokhin considera que a mudança do chefe da Duma ‘ocorre porque a Rússia Unida já não conta com a maioria constitucional (300 dos 450 deputados), com isso Gryzlov seria incapaz de dar um jeito na situação’.
‘Por esse motivo decidiram nomear para o cargo um político mais sólido’, indicou.
Nas apostas para substituí-lo ecoam três nomes, os vices-primeiros ministros, Aleksandr Zhukov e Victor Zubkov e o chefe da Administração presidencial, Sergei Narishkin.
Na terça-feira, durante uma reunião com o presidente, Dmitri Medvedev, Gryzlov propôs que a oposição contasse com três dos oito vice-presidentes da Duma e 14 dos 29 comitês da nova Duma, que terá sua primeira sessão em 22 de dezembro.
Gryzlov afirmou que a apuração das denúncias de fraude no pleito parlamentar não vai alterar a vitória eleitoral da RU, conhecido popularmente como ‘o partido de sem-vergonhas e dos ladrões’.
Nesta mesma quarta-feira, Medvedev aceitou a renúncia do governador da região noroeste russa de Vologda, Viacheslav Pozgaliov, o primeiro dirigente regional a cair pelos maus resultados eleitorais.
Pozgaliov apresentou sua renúncia na segunda-feira após a RU obter apenas 33% dos votos em sua região, um dos piores resultados do partido, cujas listas eram lideradas por Medvedev.
Enquanto isso, a oposição parlamentar e não parlamentar aproveita o retrocesso eleitoral da Rússia Unida para apresentar candidaturas às eleições presidenciais de 4 março de 2012.
Além dos líderes dos três partidos com representação parlamentar anunciaram suas candidaturas Eduard Limonov, um dos líderes dos protestos opositores contra a fraude, e o magnata Mikhail Prokhorov, um dos homens mais ricos do país.
Alguns analistas preveem que Putin poderia ter de disputar o segundo turno, mas se ganhar poderia permanecer no poder até 2024, devido à reforma constitucional que aumentou seis anos os mandatos presidenciais. EFE