Empresas de tecnologia e de telecomunicações consideraram as reformas nos programas de vigilância dos Estados Unidos anunciadas nesta sexta-feira pelo presidente Barack Obama um primeiro passo. Mas acreditam que as medidas ficaram aquém das expectativas de mudanças significativas na espionagem americana.
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Segundo o jornal The Washington Post, as empresas de tecnologia esperavam que as mudanças fossem mais longe. “Estamos desapontados por ele não ter acabado completamente com a coleta e a análise de metadados”, disse Ed Black, presidente da Associação das Indústrias de Computador e Comunicações, que tem entre seus membros Google e Facebook. Os chamados metadados são informações que podem indicar, por exemplo, quem está envolvido na comunicação, em que data ocorreu o contato, a partir de qual localidade e quanto tempo durou, sem que se tenha acesso ao conteúdo.
As companhias da área de internet pressionaram Obama por mudanças, reclamando que não puderam tornar público o número de pedidos judiciais que receberam para liberar dados de seus usuários. Desde que o ex-analista de inteligência Edward Snowden revelou o gigantesco alcance da espionagem americana, as empresas de internet têm feito um esforço para demonstrar que as informações de seus usuários estão protegidas.
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Alex Fowler, chefe de políticas públicas da Mozilla, criadora do Firefox, afirmou que a expectativa era por limites à ação da NSA, a Agência Nacional de Segurança americana, e o fim da coleta de dados sem autorização. “De modo geral, a estratégia parece ser deixar os processos de inteligência atuais praticamente intactos e aumentar a supervisão. Nós esperávamos – e a internet merecia – mais. Sem uma mudança de curso significativa, a internet vai continuar seu caminho em direção a um mundo de desconfiança”.
Ainda segundo o Washington Post, as empresas de telefonia não querem ficar com a responsabilidade de armazenar os dados de seus usuários por um período maior do que o necessário para os objetivos do negócio, como apontou uma associação da indústria wireless.
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‘Titanic’ – Grupos de defesa das liberdades civis também criticaram o alcance das medidas anunciadas por Obama. “Os ajustes feitos pelo presidente Obama serão lembrados como a música do Titanic se a sua administração não adotar reformas mais profundas”, afirmou o diretor-executivo da Anistia Internacional, Steven Hawkins. “Trocar o responsável por armazenar informações não resolve o principal problema: a coleta maciça de dados pessoais”, acrescentou.
A União Americana de Liberdades Civis classificou o discurso de Obama de “altamente preocupante”. “O anúncio trouxe reformas necessárias e que serão bem-vindas. No entanto, a decisão do presidente de não acabar com a coleta e retenção de dados é altamente preocupante. O presidente lançou um processo para estudar o assunto e parece estar aberto a alternativas, mas ele deveria acabar – e não reparar – a coleta de dados feita pelo governo. Quando o governo coleta e armazena informações sobre as chamadas telefônicas de americanos, ele está violando a Constituição”, disse o diretor-executivo Anthony D. Romero.
O jornalista Glenn Greenwald, que publicou as primeiras reportagens do jornal britânico The Guardian com detalhes dos documentos vazados por Snowden afirmou que o discurso do presidente americano não esclareceu assuntos específicos. “Obama nunca escondeu a real intenção desse processo, que é restaurar a confiança pública na NSA. Em outras palavras, o objetivo não é reformar a agência, mas fazer com que as pessoas não a temam ou fiquem irritadas com ela.”
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Fisa – Entre as reformas defendidas pelo presidente está a criação de um painel de advogados públicos que vão representar os interesses privados da população americana junto à Corte de Vigilância da Inteligência Estrangeira (Fisa). A Corte fiscaliza a aplicação da lei que permite o recolhimento de informações em operações de vigilância. A proposta de Obama é criar uma “voz independente” para avaliar os pedidos de informações antes que eles sejam encaminhados à Fisa.