Ao atingir a costa leste dos Estados Unidos, entre a noite de quinta-feira e a manhã de sexta, o furacão Florence afetará inicialmente uma população de cerca de 15,3 milhões de pessoas. Entre elas, brasileiros residentes nos estados da Carolina do Norte e Carolina do Sul. A enfermeira Selma Vieira, de Wilmington, é uma das que atendeu ao chamado das autoridades e prepara-se para deixar sua cidade nesta quarta-feira.
Willmington está localizada no litoral da Carolina do Norte e bem na rota do furacão, que poderá atingir a categoria mais feroz (número 5) ao chegar ao continente – mais especificamente, este mesmo estado americano.
“O clima na cidade está um caos total”, relatou Selma a VEJA. “Eu estou meio assustada porque este é um dos furacões mais fortes no estado nos últimos 60 anos.”
De fato, o furacão está hoje classificado na categoria 4, com ventos até 220 quilômetros por hora, conforme a escala Saffir-Simpson. O último a passar com essa força na região foi o furacão Hugo, em 1989. Os institutos meteorológicos americanos alertam para a possibilidade de o fenômeno atingir a categoria máxima, com ventos de mais de 250 quilômetros por hora. Em ambas as categorias, o rastro de destruição é dado como certo.
Selma, de 51 anos, mora há 30 anos nos Estados Unidos e já vivenciou a passagem de muitos outros furacões. “Isso é algo repetitivo. Todo ano, na época de furacões, ficamos em estado de alerta”, diz. “Mas faz tempo que não temos um como este, vindo direto para nossa cidade.”
![Selma Vieira](https://veja.abril.com.br/wp-content/uploads/2018/09/mundo-internacional.jpg?quality=70&strip=info&w=300)
Natural de Santos, São Paulo, Selma conta que decidiu partir para os estados da Geórgia e da Flórida, ambos fora da rota do Florence, obedecendo as recomendações das autoridades locais. A agência de gestão de emergências da Carolina do Norte determinou a retirada de 1 milhão de moradores da região litorânea. Mais de 1,5 milhão aderiu ao apelo até o momento.
O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, assinou na noite de segunda declarações antecipadas de emergência para as duas Carolinas. A medida liberou aos governos estaduais recursos para prevenir maiores desastres. Albergues e abrigos estão sendo preparados para acolher pessoas atingidas.
Selma e sua família se abasteceram com garrafas de água mineral e mantimentos para deixar a cidade. Mas a busca pelos produtos não foi simples, já que as prateleiras nos supermercados da cidade estão quase todas vazias. Selma conta também que os postos de gasolina estão lotados.
“Como o sobrado onde moro é de esquina, uma de suas laterais estará desprotegida. Mas colocamos pedaços de madeiras nas janelas para proteger e tiramos todos os objetos e móveis do jardim”, relatou.
Selma é enfermeira e foi liberada do trabalho nos próximos dias em razão do furacão. O hospital em que trabalha, contudo, determinou uma medida de emergência: nenhum dos pacientes internados poderá deixar o local até a passagem do Florence, assim como médicos, enfermeiros e funcionários de plantão. O local também permanecerá fechado para novos atendimentos.
Além do hospital, a Universidade da Carolina do Norte Wilmington, escolas e outros centros educacionais foram fechados. As aulas estão suspensas. Policiais e bombeiros também pedem que todos os banhistas evitem as praias.
‘Fake news’
A 320 quilômetros do litoral da Carolina do Norte, designer gráfica Renata Ietto, ficará com a família em Matthews, ao sul de Charlotte, devidamente preparada para a passagem de Florence. Não houve alerta para a retirada de moradores dessa região, que deverá sentir os reflexos da passagem do furacão.
Renata vive com o marido e o filho nesta cidade, a principal da Carolina do Norte, há um ano. Mas já passou por outras experiências alarmantes nos seus treze anos nos Estados Unidos: nevascas, quando morava no estado de Nova Jersey, e furacões e tempestades tropicais, na Flórida.
Preocupadas com a passagem do furacão e também com os dias posteriores, para os quais se prevê inundações, suspensão do fornecimento de água e energia elétrica e emergências de todo tipo, as autoridades locais divulgam nas rádios e televisões uma série de precauções.
A brasileira seguiu a lista à risca: encheu o tanque de gasolina do carro, comprou água mineral e alimentos não perecíveis e que não precisam de refrigeração, sacou uma quantia suficiente de dinheiro do banco, abasteceu-se de pilhas e lanternas. Renata prometeu manter o telefone celular carregado, muniu-se de remédios e guardou os documentos da família em local seguro.
![Furacão Florence](https://veja.abril.com.br/wp-content/uploads/2018/09/mundo-eua-furacao-florence-20180911-0001-copy.jpg?quality=70&strip=info&w=300)
Na segunda, ao passar pelo supermercado próximo de sua casa, Renata encontrou prateleiras vazias, assim como Selma. Já não havia mais garrafas de água disponíveis. O gerente prometia abastecimento até amanhã.
O que mais a surpreendeu, entretanto, foi o descrédito de americanos, em uma rodinha de conversa no mercado, sobre a capacidade de destruição do Florence.
“O clima de Fla-Flu na política americana, de republicanos versus democratas, também está acontecendo sobre a previsão do tempo. Aquelas pessoas simplesmente não acreditavam nos alertas das autoridades e nas reportagens sobre o furacão. Diziam que era invenção, ‘fake news’, exagero e, o pior, não pareciam se preparar para o pior”, contou.
Em um mercado de brasileiros também próximo de sua casa, Renata deparou-se com o contrário. Conterrâneos que nunca passaram por esse tipo de emergência pareciam em pânico, com medo de serem arrastados pelos ventos.
Como está distante do percurso de Florence estimado pelos meteorologistas, o fenômeno deve alcançar a região de Charlotte como uma tempestade muito forte e interromper a circulação de veículos e pessoas por vários dias.
Inundações podem ocorrer nas áreas mais baixas, assim como a interrupção de fornecimento de energia e de água. Renata e sua família vivem no alto de um morro, e a preocupação maior deles é com as árvores que rodeiam sua casa.