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Rio Grande do Sul promete safra de vinho de qualidade internacional

Estiagem favorece a maturação das uvas em 2020, elevando a concentração de açúcar na fruta, o que permitirá a elaboração de bebidas com potencial de guarda

Por Alessandra Kianek Atualizado em 22 mar 2020, 15h07 - Publicado em 20 mar 2020, 06h00

Desde que os imigrantes italianos trouxeram na bagagem, além das mudas de videira, a cultura do vinho para o Rio Grande do Sul, há um sonho na região: produzir bebida de qualidade internacional. Entre 1875 e 2020, quase 150 anos depois, a produção evoluiu significativamente. Mas a adaptação das uvas viníferas, aquelas usadas na elaboração de vinhos finos, sempre foi um empecilho para que o brasileiro pudesse desfrutar bebidas equivalentes a congêneres europeus feitos em território nacional. Isso pode estar perto de mudar — ao menos é o que asseguram enólogos e agrônomos. A safra de uva vinífera colhida no início deste ano no estado está sendo considerada a melhor de todos os tempos. Isso graças à estiagem que atingiu em cheio os vinhedos por lá durante o verão.

A safra deverá apresentar uma queda na produção, em média, de 20%, devido a fortes chuvas que caíram em outubro e afetaram a floração das plantas. A quebra parcial, porém, será revertida em qualidade. “A partir do início de dezembro, ocorreu em todo o estado uma estiagem, um período de pouca chuva, com tempo seco, o que é excelente para a maturação das uvas. Quando isso acontece, sempre temos safras de qualidade, como as de 1999, 2005 e 2018. A de 2020 desponta como a melhor dos últimos vinte anos”, explica Mauro Celso Zanus, pesquisador da Embrapa Uva e Vinho.

O tempo seco durante as fases de formação do grão, de maturação do cacho e até o momento da colheita favorece o amadurecimento da uva, aumentando a concentração de açúcar. Outro ponto determinante para o bom desenvolvimento do vinhedo é a amplitude térmica, com dias bem quentes e noites frias, o que estimula a formação dos aromas. Esses fatores juntos resultam na maturação ideal tanto do açúcar quanto dos taninos — substâncias que conferem textura e adstringência à bebida — da uva, o que levará à produção de um vinho mais encorpado, mais estruturado, mais elegante e fácil de beber.

Um dos principais parâmetros que mostram a qualidade superior da safra de 2020 é a graduação do açúcar na fruta, que neste ano atingiu, em média, 3 graus acima do registrado em temporadas normais, segundo o padrão Babo, a medida que representa a quantidade de açúcar a cada 100 gramas de suco. “Em 2020, conseguimos nos nossos vinhedos uma marca histórica de uma média de 24 graus Babo, quando o normal é alcançarmos 21 graus. O que tivemos nesta safra é o máximo da qualidade que pode ser atingida em qualquer outro país produtor de uva na elaboração de um vinho tinto seco”, relata Edegar Scortegagna, enólogo da vinícola Luiz Argenta.

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Com uma matéria-prima de primeira linha, a questão agora é saber qual será a qualidade dos vinhos elaborados no Rio Grande do Sul. “Se o enólogo seguir o caderno da escola de enologia, com a menor intervenção possível, vamos ter bebidas de qualidade superior diferenciada, com vinhos mais encorpados e com grande potencial de guarda”, explica o presidente da Associação Brasileira de Enologia (ABE), Daniel Salvador. Atualmente, a tecnologia à disposição das empresas é muito melhor do que aquela utilizada quinze anos atrás, na safra histórica de 2005. As vinícolas inovaram no manejo dos vinhedos, trocaram as mudas, investiram nos equipamentos e nas técnicas de vinificação.

A grande maioria dos vinhos tintos produzidos nesta safra deverá estar disponível para o consumidor daqui a dois anos. Alguns tintos jovens e os brancos poderão ser encontrados no começo de 2021. “Como estamos falando de bebidas de qualidade elevada, as empresas devem envelhecer esses vinhos por, no mínimo, um ano antes de engarrafá-los, com passagens por barricas de carvalho. E ainda assim serão vinhos de guarda, que poderão ser armazenados por mais dez anos a quinze anos”, analisa Adriano Miolo, presidente e enólogo da vinícola gaúcha Miolo.

De fato, o caminho para que uma ótima uva se torne um excelente vinho é considerado longo. “O maior defeito que vejo em safras de grande potencial é quando os enólogos ficam entusiasmados com a qualidade da fruta e acabam fazendo a extração em demasia, o que deixa os vinhos sobrecarregados de taninos e duros, demorando anos para arredondar”, afirma o especialista Dirceu Vianna Junior, o único Master of Wine brasileiro, que vive em Londres. Não há dúvida de que 2020 é uma safra com extraordinário potencial para os vinhos brasileiros. Resta torcer para que a mão do homem agora aproveite o que a natureza concedeu.

Publicado em VEJA de 25 de março de 2020, edição nº 2679

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