Baz Luhrmann dá brilho ao hip-hop em ‘The Get Down’
Com orçamento mais caro da Netflix, série investiga o nascimento do movimento musical sob a ótica do diretor de ‘Moulin Rouge’
Em sua carreira de pouco mais de vinte anos, Baz Luhrmann soma apenas cinco longas-metragens. O número modesto foi suficiente para deixar a sua marca purpurinada no cinema, com títulos como Romeu + Julieta (1996), Moulin Rouge: Amor em Vermelho (2001) e, o mais recente, O Grande Gatsby (2013). Agora, o cineasta australiano colocou com cuidado a mão no potinho de glitter para contar a pouco conhecida história do movimento que daria origem ao bilionário mercado do hip-hop.
The Get Down chega ao catálogo da Netflix nesta sexta-feira envolta em muita expectativa e notícias de um bastidor conturbado. Tanto que apenas seis episódios da primeira temporada foram lançados para cumprir a promessa da data de estreia — outros seis ficaram para um dia ainda indefinido de 2017. Mudança de showrunner, roteiro reescrito e atrasos de produção levaram Luhrmann a sair do cargo de “tio da série” para trabalhar duro e supervisionar tudo de perto. No total, os erros e acertos custaram 120 milhões de dólares, tornando a atração a mais cara já feita pela Netflix.
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O resultado é no mínimo interessante, em partes, inovador — em outras, caótico. O estilo Luhrmann é visto com parcimônia, exceto no primeiro episódio de 90 minutos dirigido por ele, o mais estilizado. Para quem espera um Moulin Rouge do rap, melhor diminuir as expectativas. A obra no máximo flerta com o charme urbano de Romeu + Julieta e lembra algum clipe cult de Beyoncé. A cantoria é reservada a momentos de brincadeiras entre adolescentes, em festas, no palco de uma igreja e quando o protagonista, Ezekiel (Justice Smith), recita poemas com sua bela voz cadenciada.
O rapaz vive no bairro do Bronx, Nova York, em 1977, e escreve rimas sobre sua realidade, com dramas que vão da dor da perda dos pais, ambos baleados, até sua grande paixão por Mylene (Herizen Guardiola), uma jovem cantora filha de um pastor (Giancarlo Esposito). Ela, por sua vez, sonha em sair dos palcos religiosos para dominar as pistas de disco music, o ritmo da época.
Apelidado de “Books” pelos amigos, Ezekiel sai do casulo quando conhece o grafiteiro Shaolin Fantastic (Shameik Moore) e o DJ Grandmaster Flash (Mamoudou Athie), que lhe apresentam o universo das festas apelidadas de “Get Down”, onde a discoteca e o rap começam a se fundir para criar algo novo. Pela falta de acesso a instrumentos e por tentar representar um cotidiano com pouco apelo para as gravadoras, os jovens criam uma nova forma de arte com limitações mas também com liberdade, mixando diferentes sons de álbuns existentes e cantando versos soltos por cima. A amizade do grupo e a busca por vidas novas, que só seriam possíveis com a música, é o que conduz a primeira parte da atração.
https://www.youtube.com/watch?v=NaxfH5v8YR0
Entre as inovações da série, está a escolha do elenco, composto majoritariamente por rostos pouco conhecidos, divididos entre negros e latinos, um feito em tempos de discussões sobre a falta de diversidade na TV e no cinema americanos. A trilha é assinada pelo rapper Nas, que consegue emocionar ou divertir, dependendo do momento. Por trás da atração, também está o verdadeiro Grandmaster Flash, retratado no programa como um mentor do novo grupo, função que ele também exerce nos bastidores.
Enquanto a produção musical e os bons atores esbanjam ritmo, o roteiro e a direção deixam a desejar. O episódio piloto sofre com longos momentos de tédio e não empolga o espectador a permanecer na jornada da história. O capítulo seguinte ganha um clima mais direto, mas ainda pena para sustentar a trama, que só engrena com a boa edição do terceiro episódio. As mazelas da época e a violência constante do bairro são pinceladas pelo cineasta, que prefere dar verniz à formação musical do grupo e à sua criatividade. Sorte do hip-hop, elemento da série que se beneficia do raio purpurinado de Baz Luhrmann.
https://www.youtube.com/watch?v=GceAJPNTBHY