Cerca de 80% dos profissionais que se demitem ao redor do mundo citam como principal motivo a dificuldade de relacionamento com seus chefes. O dado está no livro Manual Antichefe, do escritor e executivo Eberson Terra, que se baseia no levantamento de 2019 da Michael Page, consultoria internacional de recrutamento. A obra, que analisa a complexa relação entre liderança e subordinados no ambiente de trabalho, deve chegar às livrarias em 7 de novembro.
“Há uma visão simplista de que chefes ruins são aqueles que gritam ou humilham seus funcionários. Não podemos reduzir a complexidade humana”, afirma Eberson. “Compreender o comportamento pode ser uma estratégia eficaz para neutralizar os impactos negativos e tornar o ambiente de trabalho e o desenvolvimento profissional mais saudável e colaborativo”, explica. Em consequência, o autor dedica um capítulo à descrição de dez arquétipos de chefes ruins, inspirados na teoria psicanalítica de Carl Gustav Jung, identificando padrões recorrentes entre lideranças.
Confira os dez arquétipos de “chefes ruins”:
1. Tirano
Usa métodos opressivos e autoritários para garantir que suas vontades sejam cumpridas. Assim como um ditador, o tirano corporativo domina sua equipe com ameaças e rigidez, enxergando seus funcionários como recursos descartáveis. Ele os divide entre aliados fiéis e rebeldes, reprimindo qualquer um que desafie sua posição de liderança.
Como lidar:
É importante evitar confrontos diretos e, em vez disso, compartilhar o crédito por boas ideias, alimentando o desejo de poder do tirano. Demonstrar concordância com as boas ideias do chefe e agir com calma em situações de conflito ajudam a manter um relacionamento menos hostil. Embora você precise abrir mão de receber total reconhecimento por seus sucessos, essa atitude pode garantir maior liberdade de ação e evitar que você seja visto como um inimigo da liderança.
2. Politiqueiro
Gestor habilidoso em manter uma imagem de simpatia e harmonia, sendo visto como um grande aliado e amigo no ambiente corporativo. A boa política permite a participação ativa dos profissionais em decisões estratégicas, facilitando negociações interpessoais que buscam o bem comum da empresa. O problema é quando surgem interesses pessoais — a politicagem — que passa a guiar as ações, colocando desejos individuais acima das metas da organização.
Como lidar:
Reconheça sinais de manipulação e aja com cautela para evitar ser vítima desse tipo de gestor. Manter-se afastado de fofocas, documentar todas as atividades e ter aliados fora da sua área de atuação são estratégias eficazes. Além disso, evite participar de reuniões que fogem de suas atribuições, pois esses encontros podem ser usados para distorcer informações e te envolver em jogos de poder.
3. Microgerente
Ele exerce controle excessivo sobre todos os detalhes do trabalho de sua equipe, sufocando a autonomia dos colaboradores. Esse comportamento decorre de uma falta de confiança nos liderados e uma necessidade constante de garantir que tudo esteja sob controle. A supervisão excessiva se traduz em interrupções frequentes, cobranças desnecessárias e pressão constante, o que gera um ambiente de trabalho estressante e afeta a produtividade e a motivação.
Como lidar:
Adote uma estratégia de antecipação e comunicação constante. Enviar informações periódicas, detalhando o andamento das tarefas, pode reduzir a ansiedade desse gestor e criar uma sensação de segurança. Antecipar as demandas mais sensíveis e assumir a iniciativa no fornecimento de atualizações também ajudam a evitar interrupções constantes e estabelecer uma relação de confiança que, com o tempo, pode resultar em mais liberdade e autonomia.
4. Omisso-permissivo
Oferece uma liberdade excessiva à equipe, confundindo autonomia com indiferença. Ele evita direcionar e acompanhar o trabalho, acreditando que os funcionários podem resolver tudo sozinhos, independentemente de suas necessidades de orientação ou experiência. Essa falta de envolvimento gera um ambiente desestruturado, onde os profissionais, especialmente os menos experientes, acabam procrastinando ou distribuindo mal suas tarefas, prejudicando a produtividade e o desenvolvimento da equipe.
Como lidar:
Faz- se necessário assumir proativamente a organização das próprias atividades e incentivar os colegas a fazerem o mesmo. Manter uma comunicação constante, mesmo que assíncrona, como o envio de relatórios periódicos, é fundamental para garantir que o chefe seja informado sem se sentir sobrecarregado. Estabelecer uma agenda de contatos regular, ainda que breve, ajuda a manter um canal aberto de diálogo, assegurando que os problemas importantes sejam abordados sem perder o interesse do gestor.
5. Guardião da verdade
Centraliza o poder em torno de suas próprias ideias e se posiciona como o único detentor da verdade. Ele rejeita sugestões e críticas de sua equipe, desqualificando opiniões que não coincidem com as suas. Essa atitude cria um ambiente de autoritarismo e dificulta o debate saudável, tornando a equipe meros executores de suas vontades. A arrogância e o egocentrismo desse líder prejudicam o desenvolvimento coletivo, uma vez que ele não admite erros e culpa os outros pelos fracassos.
Como lidar:
Evite confrontos diretos e escolha cuidadosamente os momentos para discutir pontos de vista divergentes, de preferência em conversas privadas. Busque mediação de colegas ou superiores que possam intervir, mas evite expor publicamente os erros do líder. Demonstrar inteligência emocional e paciência, mantendo-se discreto e estratégico nas abordagens, ajuda a mitigar conflitos e possibilita a apresentação de ideias sem desencadear reações negativas do chefe.
6. Multiplicador da ansiedade
É um perfil de liderança que cria um ambiente de alta pressão nas equipes ao confundir agilidade com urgência. A falta de planejamento e a dificuldade de eleger tarefas transformam as rotinas de trabalho em um caos, com todas as demandas sendo tratadas como prioritárias. Esse tipo de chefe, impulsionado pela ansiedade, transfere suas próprias inseguranças ao time, levando a uma queda na qualidade do trabalho e, em muitos casos, ao esgotamento emocional dos colaboradores.
Como lidar:
O primeiro passo é manter o equilíbrio emocional e evitar ser consumido pela pressão constante. Assumir a organização das demandas e propor cronogramas realistas podem ajudar a reduzir o impacto da ansiedade do chefe sobre a equipe. Também é importante envolver o RH e outras áreas de apoio para oferecer ajuda ao líder, garantindo que ele receba o suporte necessário sem expô-lo negativamente. A ideia é colaborar para restabelecer o ritmo da equipe, sem aumentar o estresse.
7. Gladiador
Promove a competição interna de forma hostil e destrutiva, jogando membros da equipe uns contra os outros. Inspirado no estilo de liderança agressiva de David McClelland, o gladiador acredita que toda fraqueza deve ser eliminada, criando um ambiente de constante confronto. Ele incita a competição com palavras duras e estratégias que visam encontrar os mais fortes, mas não participa diretamente dos embates. Esse comportamento é comum em times comerciais com metas individuais, desestruturando a harmonia da equipe e gerando inimizades.
Como lidar:
A melhor forma de agir com esse tipo de liderança é buscar uma nova oportunidade o mais rápido possível, já que o desgaste é insustentável a longo prazo. É importante manter seus valores e não se deixar levar pelas competições desmedidas que podem envolver práticas antiéticas. Caso o comportamento abusivo persista, é recomendável coletar evidências e denunciar a situação para autoridades competentes, como sindicatos ou o Ministério Público do Trabalho.
8. Bélico
É caracterizado por uma agressividade extrema e a defesa de interesses por meio de ataques impulsivos e desproporcionais. Esses chefes tendem a ver críticas construtivas como ataques pessoais, respondendo com hostilidade e procurando culpar os outros por quaisquer problemas. Eles operam em um ambiente de desconfiança, negando erros internos e utilizando informações de maneira manipuladora para desviar a atenção de suas falhas. Esse comportamento resulta em um ambiente de trabalho tóxico, onde a sensação de medo e vingança predominam, dificultando a colaboração e a confiança entre os membros da equipe.
Como lidar:
É crucial manter uma postura neutra e focar no próprio trabalho, evitando se envolver em conflitos e discussões desnecessárias. A resiliência é essencial, pois, apesar do impacto negativo do líder, manter-se firme pode garantir uma posição favorável perante a diretoria. Se um chefe bélico tentar envolver os subordinados em atividades antiéticas, recusar-se pode resultar em perseguições, mas também pode oferecer a oportunidade de coletar provas que protejam legalmente o profissional.
9. Acumulador de problemas
São líderes marcados por uma elevada insegurança e medo de rejeição, levando-os a aceitar demandas desnecessárias e a se sobrecarregar de responsabilidades. Muitas vezes, eles sofrem da síndrome do impostor, acreditando que não são merecedores de suas posições, o que resulta em autossabotagem. Essa busca por aceitação faz com que eles não consigam dizer “não” e, consequentemente, assumam a culpa por falhas que não são suas. Com o tempo, essa dinâmica prejudica o desempenho de suas equipes, já que as demandas excessivas criam um ambiente de procrastinação e falta de foco nas atividades realmente importantes.
Como lidar:
Os funcionários devem compreender as limitações de um chefe acumulador de problemas e sua impossibilidade de atender todas as demandas simultaneamente. Utilizar a dificuldade do chefe em dizer “não” pode ser uma estratégia eficaz para buscar ajuda e expor a verdadeira carga de trabalho da equipe, possivelmente envolvendo superiores se necessário. Ademais, oferecer suporte psicológico pode ser benéfico para o líder, ajudando-o a lidar com suas inseguranças e a recuperar sua eficácia no trabalho. Os funcionários devem priorizar suas tarefas, montar um planejamento de capacidade e documentar prazos realistas para renegociar expectativas de forma clara e objetiva.
10. Espalha-promessas
Eles manipulam as expectativas de seus colaboradores, alimentando falsas esperanças com promessas de melhorias, como aumentos salariais, promoções e estabilidade, sem a intenção de cumpri-las. Esse comportamento é motivado pela necessidade de manter a devoção e a atenção de suas equipes, ludibriando-as com cenários idealizados que podem nunca se concretizar. Ao longo do tempo, essas promessas não cumpridas acabam revelando o caráter enganoso dessa liderança, prejudicando a confiança e a moral da equipe.
Como lidar:
Os funcionários devem exigir metas claras e objetivas que sejam necessárias para a realização das promessas feitas, além de buscar a oficialização das acordadas por meio de e-mails ou mensagens, garantindo um registro do combinado. É importante não se deixar levar por promessas vazias e repensar a viabilidade das propostas, mantendo os pés no chão e buscando garantias que sustentem novas negociações. Caso ocorra uma quebra de acordo, o colaborador deve impor novos limites e se resguardar, evitando cair em um ciclo de desilusão que possa comprometer seu desenvolvimento profissional.