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Sim, o beijo gay é problema para ‘Babilônia’. Mas só um deles

Para além da demonstração de afeto entre as personagens de Fernanda Montenegro e Nathalia Timberg, a novela das nove da Globo tem outros problemas, que ajudam a entender as dificuldades que ela enfrenta no Ibope, como uma mocinha chata, um maniqueísmo datado, a ausência de conflitos fortes e de humor inteligente. O elenco é o ponto forte

Por Maria Carolina Maia e Beatriz Rosa
12 abr 2015, 08h20

Às vésperas de fazer meio século, idade que será comemorada no próximo dia 26, a Globo vive um dos momentos mais dramáticos de seu horário nobre. Babilônia, a trama de Gilberto Braga, Ricardo Linhares e João Ximenes Braga que está completando um mês no ar, tem a pior audiência de uma novela das nove – e das oito, antiga faixa ocupada pelo principal produto de dramaturgia da emissora – da história. Vai pior até que a famigerada Em Família, que marcou de maneira melancólica a despedida de Manoel Carlos dos folhetins e era, até aqui, o recorde negativo de público do horário, por volta dos 30 pontos no Ibope da Grande São Paulo. Com uma audiência que oscila em torno dos 25 pontos, média de novela das sete, Babilônia chega a registrar 20 pontos em algumas noites. E as razões, como mostram especialistas ouvidas pela reportagem, vão além do afamado beijo gay entre as personagens de Fernanda Montenegro e Nathalia Timberg.

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Sim, um beijo gay incomoda muita gente – e não apenas os evangélicos que hoje representam 22,2% da população, ante 64,6% de católicos, e que já vinham fazendo campanha há tempos contra os folhetins da Globo. “Estamos vivendo um momento de maior conservadorismo na sociedade e, nesses momentos, as pessoas tendem a recorrer para aquilo que acreditam ser seguro”, diz Denise Tavares, professora do programa de pós-graduação em Mídia e Cotidiano (PPGMC) da Universidade Federal Fluminense (UFF). Também é verdade que houve um acirramento da concorrência, com a esperta reprise, no SBT, do sucesso Carrossel (no ar, com pequenas variações, das 21h15 às 22h15) e com o primeiro folhetim bíblico da Record, Os Dez Mandamentos (no ar, geralmente, das 20h40 às 21h25). Mas isso não é tudo. Afinal, novelas controversas já tiveram o seu espaço e a concorrência vem incomodando a Globo faz tempo. É preciso olhar, portanto, algumas questões que se somam a essas e que ajudam a explicar o começo periclitante da trama.

Babilônia tem problemas no próprio texto. O maior deles talvez sejam os personagens mal construídos. A protagonista e as antagonistas, personagens que aparecem em primeiro plano no folhetim, são chapadas, sem qualquer profundidade. A mocinha Regina (Camila Pitanga) é corretíssima, não erra uma, e ainda por cima é histérica, incapaz de cativar o espectador – uma barraqueira, como sugere o trabalho que tem na praia do Leme. E as vilãs Beatriz (Gloria Pires) e Inês (Adriana Esteves) são más, muito más: cheias de ambição e inveja, elas pisam nas pessoas, traem os outros e odeiam pobres. Esse maniqueísmo, representado em algumas cenas pela distribuição do figurino, claro para Regina e escuro para as duas malévolas, vai contra tudo o que se vê hoje na TV, tanto em novela como – especialmente – em séries.

Babilônia é um retrocesso no sentido do maniqueísmo, se comparada a outras tramas. Parece os folhetins dos anos 1980, em que se dividiam claramente o bem e o mal. Hoje, os autores não trabalham mais dessa forma. Os vilões têm humor. Ninguém é 100% mal”, diz Cintia Lopes, autora do livro A Seguir, Cenas do Próximo Capítulo.

A revelação dos motivos que levam Inês a ter uma ambígua admiração por Beatriz, antecipada pelos autores depois do estouro da crise de Babilônia, pode dar algum lastro à vilã de Adriana Esteves. E pode dar a Babilônia algum conflito para se acompanhar. Ainda falta tutano, contudo, à ninfomaníaca de Gloria Pires e à mocinha de Camila Pitanga. E falta um embate real que oponha a mocinha e a vilã da história, para além do assassinato do pai de Regina, executado por Beatriz no primeiro capítulo do folhetim. As personagens, a bem da verdade, mal se trombam na babilônia que é esta novela.

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Outros problemas do folhetim, apenas para pincelar o quadro (confira a lista completa acima), são a cansativa repetição do Rio de Janeiro como cenário – com exceção de Amor à Vida (2013), todas as tramas das nove se passam no Rio desde Insensato Coração (2011), outro texto bastante criticado de Gilberto Braga e Ricardo Linhares – e a falta de um humor inteligente, coisa de que a sua antecessora, Império, a novela do arrogante e carismático Comendador José Alfredo (Alexandre Nero), era bem servida. O núcleo cômico de Babilônia se resume àquele formado por Norberto (Marcos Vera), a cunhada, Karen (Maria Clara Gueiros), e o irmão, o malandro Luís Fernando (Gabriel Braga Nunes, mais uma vez no papel de cafajeste). Bem mediano, digamos.

É claro que a equação não poderia ser simples nem se limitar às controvérsias. Se fosse uma grande novela, afinal, Babilônia não perderia o seu público com tanta facilidade para a concorrência. E vale ressaltar que a concorrência não é tão direta assim: Os Dez Mandamentos, a trama bíblica que tem rendido 13 e até 14 pontos de média para a Record, vai ao ar antes da novela da Globo, que é exibida entre 21h15 e 22h15, e compete com ela por poucos minutos apenas. Quem bate de frente mesmo com o folhetim é a infantil Carrossel, do SBT. Uma produção “família”, é verdade, mas também uma trama que atinge um público deixado de lado por Babilônia e pela TV aberta em geral: as crianças. Além do mais, Os Dez Mandamentos e Carrossel têm seus trunfos, mas não são comparáveis a uma novela da Globo, que atingiu um padrão de qualidade raro na TV. É possível elogiar as tramas das rivais, desde que com alguma complacência: são boas para o padrão das emissoras que assinam a sua produção, mas não para o padrão da Globo.

Nem tudo está perdido, portanto, para Gilberto Braga, Ricardo Linhares e João Ximenes Braga. Além da experiência que possuem, os três contam com um recurso que, para as especialistas ouvidas pela reportagem, pode virar o jogo. Babilônia tem um grande elenco, pronto para decidir o jogo, quando – e se – a bola voltar a rolar redondinha. Mas é preciso que venha redonda, e não chapada como a chata e histérica Regina.

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