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O déjà vu causado pela repetição de atores em ‘Babilônia’

Escalação de artistas que pulam de um papel para o outro no horário nobre da Globo confunde o espectador e vira piada nas redes sociais, onde Bruno Gagliasso, o cafetão Murilo da nova trama das nove, é chamado de Edu, o serial killer da série ‘Dupla Identidade’, e Gabriel Braga Nunes, de ‘Laerte’, o galã cafajeste de ‘Em Família’

Por Meire Kusumoto e Maria Carolina Maia
22 mar 2015, 18h12

Na última segunda-feira, dia de estreia de Babilônia, a sucessora de Império na faixa das nove da Globo, o espectador conheceu Luís Fernando, o jornalista cafajeste interpretado por Gabriel Braga Nunes na trama de Gilberto Braga, Ricardo Linhares e João Ximenes Braga. Ou melhor: o público rememorou Laerte, o galã insosso que o ator viveu na novela Em Família. Último folhetim de Manoel Carlos, ele ocupava o mesmo horário, no mesmo canal, há menos de um ano. A sensação de déjà vu foi tanta que Luís Fernando vem sendo chamado de “Laerte” nas redes sociais, mesma brincadeira feita com Bruno Gagliasso, que até as vésperas do Natal vivia o serial killer Edu na série Dupla Identidade, de Gloria Perez, e agora encarna o cafetão Murilo. “Eu é que queria ser uma das meninas do Edu – ops, Murilo”, tuitou uma espectadora na noite da última quinta-feira, em um sinal claro de que o trabalho anterior do ator ainda está fresco na memória. E também em um indício inequívoco de que a repetição de atores na Globo chegou a um ponto de saturação: ao ponto de ser um desafio para o público, que a cada dia vem afrouxando mais os vínculos com as produções da emissora. É como um jogo da memória ao contrário: para ver Babilônia, é preciso esquecer quem os atores acabaram de viver na TV.

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É difícil para o espectador, como se vê pelos comentários nas redes sociais, se identificar com um personagem semelhante a outro que acabou de sair do ar. E esse obstáculo precisa ser transposto para que o elenco, junto com outros fatores, faça a trama decolar no Ibope. Nesta primeira semana, Babilônia movimentou as redes sociais, mas ainda não representou um grande feito em termos de audiência. Marcou 33 pontos na estreia na Grande São Paulo, onde um ponto responde por 67.000 domicílios, depois dos 44 alcançados na despedida de Império. Uma queda é de fato esperada, mas onze pontos são um baque forte, a ser superado nos próximos dias, com o crescente envolvimento do público com a trama e seus personagens. Da modorrenta Em Família para Império, o declínio foi de três pontos.

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“A repetição é prejudicial (para a audiência)“, diz José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, homem que formatou a grade de programação da Globo tal como ela é hoje, com sanduíche de novelas e telejornais. Para Boni, hoje sócio de uma afiliada da emissora, a paulista TV Vanguarda, o canal deveria repensar o seu volume de produções. Atualmente, a Globo mantém até cinco novelas inéditas no ar, quando o horário das onze também é ocupado por tramas como Saramandaia (2013) e O Rebu (2014), além da reprise do Vale a Pena Ver de Novo (agora bombando com Rei do Gado), de ao menos duas séries semanais fixas (caso de Tapas & Beijos) e de minisséries esporádicas (como a última, Felizes para Sempre?). “Estamos produzindo em maior quantidade do que a disponibilidade de talentos no mercado. Deveríamos reduzir um pouco a quantidade em favor da qualidade”, diz o ex-diretor da Globo.

Boni pode ter razão. A novelinha Malhação, que há vinte anos vem assumindo a função de formar e lançar atores dentro da emissora carioca, parece não dar conta de suprir de mocinhos, vilões e coadjuvantes as tantas tramas globais. O segmento mais sofrido, entre eles, é certamente o de galãs de meia idade. Daí o paranaense Alexandre Nero ter sido escolhido para uma nova novela antes mesmo de pôr de molho as barbas do Comendador José Alfredo.

Mal deixou de lado a empáfia do Comendador de Império, Nero começa a se preparar para outro protagonista no horário nobre: o personagem principal de Favela Chic, novela de João Emanuel Carneiro que sucederá Babilônia às 21 horas. O desafio será grande também para o ator, que terá de convencer o espectador de que pode se transformar em novos personagens com rapidez. E que é o novo personagem, e não José Alfredo, quem está em cena, quando chegar a hora.

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Apesar do cansaço provocado no espectador pela repetição da imagem, a missão é cumprida por nomes como Nathalia Timberg e Adriana Esteves, que, embora marcada para sempre pela Carminha de Avenida Brasil, tanto pelo peso da personagem e do folhetim como por seu talento em executá-la, tem o molejo necessário para dar alma a outra vilã, a invejosa e obcecada Inês da nova trama. Já em casos como o de Gabriel Braga Nunes e de Carmo Dalla Vecchia, que pulou do Fernando, de Amor, Eterno Amor (2012) para o Manfred Ducke, de Joia Rara (2013) e deste para o Maurilio de Império, sem mudar de expressão facial, o problema se agrava.

A escalação de artistas que acabaram de sair do ar era evitada durante a “era Boni” – os mais de trinta anos em que a Globo foi comandada pelo executivo. “Naquela época, os atores tinham que descansar a imagem e a orientação era de criar novos galãs”, diz Claudino Mayer, doutor em teledramaturgia pela USP e autor do livro Quem Matou… O Romance Policial na Telenovela (Annablume). “Mas agora não há mais condições de se fazer isso. Além de ser mais garantido colocar alguém que já é conhecido do que apostar em um novo rosto.”

Mayer lembra que a repetição também pode ter um lado positivo, no caso daqueles atores capazes de envolver o espectador em cada papel que fazem. Estes, pelo talento que têm, chamam público para as atrações. É como ver um filme só porque tem a Meryl Streep no elenco. “É uma espécie de cartão de visita para essa obra que está começando”, diz Mayer.

Em Babilônia, o melhor exemplo dessa versatilidade em cena é dado por Fernanda Montenegro, que interpreta a advogada Teresa, companheira de Estela, vivida por Nathalia Timberg. No ano passado, Fernanda viveu a protagonista Dona Picucha na segunda temporada do seriado Doce de Mãe, trabalho que rendeu a ela o Emmy Internacional de melhor atriz em 2013. Antes, por Fernanda Montenegro integrou o elenco de duas novelas, Saramandaia (2013), na faixa das 23 horas, e o remake Guerra dos Sexos (2012).

Quando o ator não dá conta do recado, no entanto, pode restar a sensação de estar se vendo uma novela velha, que desperta pouco interesse e com a qual é difícil firmar um pacto de confiança, contrato necessário entre obra e consumidor. E não se alude aqui a Vale a Pena Ver de Novo, que vai bem, obrigada, com artistas pouco vistos na TV nos últimos anos, com exceção do produtivo Antonio Fagundes. Além de monstros já mortos, como Raul Cortez e Regina Dourado, Rei do Gado reúne rostos pouco explorados hoje na televisão, como Lavinia Vlasak, Mariana Lima e Almir Sater, todos eles um enorme frescor nas atuais circunstâncias.

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