Black Friday: Assine a partir de 1,49/semana
Continua após publicidade

‘O TikTok está matando a comédia’, diz o humorista Renato Albani

Ex-engenheiro de 39 anos, capixaba radicado em São Paulo vem esgotando ingressos com piadas que geram identificação – ainda que entre polêmicas

Por Amanda Péchy Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 5 set 2024, 12h48 - Publicado em 5 set 2024, 07h00
  • Seguir materia Seguindo materia
  • Para Renato Albani, 39, não existe um segredo para a boa comédia. O humorista capixaba, que abandonou a carreira de engenheiro e veio a São Paulo para ganhar a vida fazendo piadas, acredita, porém, em um guia: a capacidade de produzir identificação com o público. “Tudo na vida pode virar piada, e quero trazer as pessoas para dentro da história”, contou ele a VEJA. “Nós, brasileiros, amamos nos sentir representados.” Parece estar funcionando. Com uma agenda cheia de shows esgotados, acumulando 165 mil ingressos vendidos de janeiro a agosto, ele acredita que vai bater o recorde de público de sua carreira, de 215 mil pessoas em 2023. Além de dar pistas sobre planos para o futuro – uma carreira internacional com shows em inglês para o público gringo, e negociação de séries e um filme com streamings –, Albani falou sobre os problemas da “tiktokização” da comédia, que vive uma profusão de vídeos curtos com piadas na internet, e lançou críticas à cultura do cancelamento. “A comédia só deve ter um limite: quando vira crime”, afirmou.

    Na transição da carreira de engenheiro para humorista, não ficou com medo de quebrar a cara?  Eu, meus pais, todo mundo. Engenheiro é uma dessas carreiras que todo mundo prestigia, né? Eu era professor no Senai no Espírito Santo e fazia uns bicos como comediante. Por lá, sabia que não tinha para onde crescer na comédia. Assim que me formei, depois de enrolar muito, recebi uma proposta incrível de emprego no setor de petróleo. Devia ter feito meus olhos brilharem, mas não aconteceu. Tive que tomar uma decisão: ou seguia uma carreira, ou outra. Foi quando vim para São Paulo para perseguir meu sonho. Apesar do receio, fui o único quem acreditou que eu poderia dar certo na comédia.

    Quando percebeu que tinha dado certo?  No começo, eu fazia shows ganhando 100 reais, às vezes 30 reais, às vezes 50 reais. Deu um desespero, porque o emprego que eu rejeitei pagava 10 mil reais mais benefícios. Isso em 2013! Mas percebi rápido que estava no caminho certo, porque passando muitos perrengues, estava feliz. Eu falei: “Cara, só pode ser isso aqui.” Agora, senti que as coisas começaram a virar quando meus vídeos começaram a ir bem nas redes, em 2015. Dois anos depois teve um momento importante, quando entrei em cartaz em São Paulo. Desde então, não parei os shows.

    Já se meteu em alguma situação só para ter história para contar depois?  Tudo que acontece na vida tem potencial para piada, 100%. Então nunca topei nada com esse propósito específico. Mas, quando acho que um programa vai virar uma furada, costumo ficar mais atento (risos). Se tudo der errado, pelo menos faço uma piada disso depois. De qualquer forma, já sou muito observador em geral. O que eu busco na hora de escrever é a identificação, quero trazer as pessoas para dentro da história. Quero que o público pense: “Isso ou aconteceu comigo”, ou: “Isso claramente aconteceria comigo”. Nós, brasileiros, amamos nos ver. Nos sentir representados.

    'Dá para fazer piada com absolutamente tudo o que acontece na vida', diz o comediante Renato Albani. -
    ‘Dá para fazer piada com absolutamente tudo o que acontece na vida’, diz o comediante Renato Albani. – (Arquivo Pessoal/Reprodução)

    Seu livro recente “É raro, mas acontece muito” é inspirado nas histórias que você conta nos palcos. Qual é a sua preferida?  É uma piada que contei pela primeira vez lá atrás, há oito anos, sobre o dia em que meu pai me levou à lanchonete quanto tinha oito anos. Como toda criança é endiabrada, eu pedi o maior lanche que tinha, para a fúria do meu pai. Quando chegou, dei duas mordidas, e fiquei cheio. Ele queria me matar (risos). Gosto dessa história porque aconteceu um negócio muito louco, que nunca mais se passou comigo: depois que o vídeo da piada viralizou no YouTube, o público nos meus shows pediam por essa piada. É coisa que não acontece com comediantes, mas com músicos, bandas.

    As redes sociais são importantes para qualquer figura pública, e no humor não é diferente. O que acha da “tiktokização” do humorismo?  O formato de vídeos curtos do TikTok está matando a boa comédia. Quando começamos a postar há quase dez anos, ainda tinha muito trabalho por trás. Por exemplo, para fazer meu primeiro vídeo com boa repercussão, que hoje tem 7, 8 milhões de visualizações, precisei alugar câmera, gravar seis vezes até ficar bom e editar por horas. Tinha sete minutos. Hoje, pego meus vídeos longos, que ainda envolvem muito disso, e faço cortes para o Instagram. Só que a nova leva de comediantes acha que esse é o segredo: postar vídeos. Sem se preocupar com a qualidade do conteúdo e da técnica.

    Surgiu uma polêmica depois de você fazer uma piada sobre o paraskatista Daniel Amorim, que não tem os dois braços e ambas as pernas. Humor tem limite?  Só o crime. Fora disso, não tem limite. Na verdade, se eu evito fazer piada sobre certo grupo de pessoas, isso sim é preconceito. É menosprezar sua capacidade de entender a piada como ela é: uma piada. O grande problema da comédia é que muitas pessoas não a veem como arte. A gente aceita mais uma música, um filme, um livro, uma pintura sobre um tema polêmico. Mas a piada só é vista como tiração de sarro, apesar de ser um mecanismo interessante para levantar discussões e apresentar novas perspectivas. Fora que, na maioria das vezes, as críticas vêm de “fiscais” que não têm nada a ver com o alvo da piada.

    Você cresceu com as piadas da TV dos anos 1990, ainda distantes do politicamente correto. Acha que o mundo ficou mais careta?  Não. O mundo mudou, e isso é normal. O problema de hoje é que a internet dá cada vez mais voz a pessoas idiotas, porque todo mundo pode expressar sua opinião, seus questionamentos, inseguranças e carências por lá. Isso também ajudou a produzir a cultura do cancelamento. Se eu não gosto de alguma coisa, se não concordo com alguma coisa, ela não pode existir. E não só com a comédia, a política está assim, religião sempre foi assim. Até por isso, sou prevenido. Faço investimentos imobiliários, tenho empreendimentos no setor de eventos. Se amanhã eu for cancelado, se acabarem meus shows, pelo menos tenho um plano B.

    Publicidade

    Publicidade

    Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

    Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

    Black Friday

    A melhor notícia da Black Friday

    BLACK
    FRIDAY

    MELHOR
    OFERTA

    Digital Completo

    Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

    a partir de 5,99/mês*

    ou
    BLACK
    FRIDAY
    Impressa + Digital
    Impressa + Digital

    Receba 4 Revistas no mês e tenha toda semana uma nova edição na sua casa (menos de R$10 por revista)

    a partir de 39,96/mês

    ou

    *Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
    *Pagamento único anual de R$71,88, equivalente a 5,99/mês.

    PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
    Fechar

    Não vá embora sem ler essa matéria!
    Assista um anúncio e leia grátis
    CLIQUE AQUI.