‘Negócio das Arábias’ observa fator humano da globalização
Com Tom Hanks, filme acompanha vendedor de TI que tenta se estabilizar emocional e financeiramente após crise econômica
Como em um rápido pesadelo, de repente, Alan (Tom Hanks) vê suas posses desaparecerem. A boa casa, o carro do ano, a bela esposa e as oportunidades de emprego se vão, deixando apenas a pergunta aos berros: “Como eu vim parar aqui?”. A breve introdução do filme Negócio das Arábias, narrada em formato de um comercial de TV surreal, mostra o estado de nervos e ansiedades do personagem que, em seguida, se destaca de terno em um avião repleto de homens com turbantes e túnicas, a caminho da Arábia Saudita.
LEIA TAMBÉM:
Má alimentação causou meu diabetes, diz Tom Hanks
Tom Hanks pode ser herói em novo filme de Clint Eastwood
Alan tem a missão de encontrar o rei do país para vender um aparato tecnológico que promove conferências online por meio de hologramas. Se o negócio for fechado, a comissão vai ajudar o vendedor americano a pagar suas muitas dívidas, resultantes do fechamento da empresa chefiada por ele, massacrada pela crise econômica de 2008 e pela concorrência desleal da China.
Como uma versão de Esperando Godot, de Samuel Beckett, o filme se desenrola a partir da longa expectativa da chegada do rei árabe, que nunca aparece. Entre os percalços, Alan precisa esconder o desânimo e elevar o clima entre a equipe de apresentação, que trabalha em condições pouco favoráveis. Ele também desenvolve sérios problemas para dormir, não consegue um bom drinque (a venda de bebidas alcoólicas é proibida no país) e precisa lidar com um tumor do tamanho de uma maçã em suas costas.
As diferenças entre a cultura árabe e a americana e a desigualdade social são pinceladas na trama através de detalhes. Como a amizade de Alan com o motorista Yousef (Alexander Black), que leva o turista a um povoado distante, quando um marido rico acusa o jovem de flertar com sua esposa. Ou quando o protagonista entra em um dos prédios de alto padrão que estão sendo construídos no deserto e vê a situação deplorável dos trabalhadores, antes de entrar em um apartamento digno de uma cobertura milionária em Nova York.
Inspirado no livro Um Holograma para o Rei (Companhia das Letras), de Dave Eggers, o filme joga luz no fator humano da globalização. Hanks interpreta o homem comum, em busca apenas de sobrevivência, enquanto o fantasma da concorrência chinesa continua a assombrá-lo. Não há nele motivações de prazer ou de completude existencial, e sim a cobrança típica do american way of life, que pede: “Volte a ser um vencedor”.
Dirigido pelo alemão Tom Tykwer, do intenso Corra, Lola, Corra (1998), a adaptação tem um ritmo lento e peca ao lançar mão do velho olhar ocidental, que observa o resto do mundo de cima, como um safári a ser explorado e, por vezes, temido. O trunfo da produção fica com a boa atuação do veterano Tom Hanks, que consegue expressar o inexplicável sem palavras na pele do homem que passa por uma séria crise de meia-idade, enquanto tenta se encontrar, literalmente, no meio do nada.