Aos 31 anos, Colleen Hoover trabalhava como assistente social e vivia com o marido e três filhos em uma casa-trailer no interior do Texas, nos Estados Unidos. Escrever era um hobby despretensioso. Isso até uma única leitora levá-la a ampliar o escopo: sua avó ganhara um Kindle de Natal e queria ler uma história da neta. Colleen descobriu então a plataforma de autopublicação da Amazon e, em janeiro de 2012, usou a ferramenta para disponibilizar de forma virtual o livro Métrica, drama sobre uma jovem em luto pela morte do pai. Um eficiente boca a boca fez com que, cinco meses depois, o título chegasse à lista de best-sellers do The New York Times. A vida de Colleen se transformou de forma brusca — uma reviravolta quase tão rocambolesca quanto as tramas assinadas por ela.
A partir do sucesso improvável da estreia, ela se revelou um fenômeno crescente, que encontrou eco por aqui. No Brasil, ela é a autora que mais vendeu livros no primeiro semestre deste ano: foram 500 000 exemplares no período, desbancando J.K. Rowling do posto de favorita dos brasileiros. O carro-chefe é o romance de 2016 É Assim que Acaba, há 52 semanas entre os mais vendidos no ranking publicado por VEJA. A mesma lista traz o nome da americana em variadas posições, tanto na categoria de ficção quanto na de infantojuvenil.
A eficiência da fórmula de Colleen é incontestável. Inspirada pelos dramas que presenciou durante o tempo em que foi assistente social, ela escreve sobre assuntos espinhosos, como o luto, as dificuldades financeiras e até a violência doméstica — mote de É Assim que Acaba. Se a temática é louvável, a qualidade deixa a desejar. Os dilemas dos personagens são embebidos por romances mornos, homens complicados (de preferência belíssimos) e um clima de mistério que abusa dos ganchos entre os capítulos — recurso manjado, mas que faz dela uma exímia page-turner (termo em inglês para autores que impelem o leitor a virar as páginas).
Nesse pacote, são os finais escritos por ela que os fãs curiosamente exaltam. Colleen mergulha no sentimentalismo do melodrama, levando o público às lágrimas. Muitos fãs, aliás, gostam de se gravar chorando para postar nas redes sociais. Questionada sobre esse “dom”, Colleen surpreende. “Sou um pouco fria, então exagero nas emoções ao escrever, para conseguir sentir algo”, diz.
Em dez anos, a americana lançou vinte romances e explorou como poucos o campo vago em que viceja o gênero chamado de young adults. Esses jovens adultos estariam entre 18 e 26 anos, faixa etária que rejeita tramas francamente adolescentes, ao mesmo tempo que consome romances fáceis e palatáveis. No caso de Colleen, a diferença entre seus livros para maiores de idade e os juvenis se dá pela escrita mais picante em uns que em outros. A divisão funciona na teoria: seus livros trazem na capa alertas de classificação indicativa para maiores de 18. O sucesso no segmento tem razão de ser: ela foi coroada como “rainha do TikTok” e tem um robusto público adolescente proveniente da rede social. Veio do TikTok, aliás, o empurrão que fez com que aumentasse exponencialmente suas vendas a partir de 2021 — prova de que nem a literatura escapa da bestificante rede da dancinha.
Publicado em VEJA de 17 de agosto de 2022, edição nº 2802
*A Editora Abril tem uma parceria com a Amazon, em que recebe uma porcentagem das vendas feitas por meio de seus sites. Isso não altera, de forma alguma, a avaliação realizada pela VEJA sobre os produtos ou serviços em questão, os quais os preços e estoque referem-se ao momento da publicação deste conteúdo.