Em março de 2017, o cantor Gustavo Amaral, o Gustavito, de 33 anos, teve a vida abalada por uma denúncia no Facebook. Uma jovem anônima deu a entender que foi estuprada por ele, que teria ainda transmitido HPV a ela. “Sofria ataques pesados e não conseguia me defender. As pessoas não estavam interessadas no que ocorreu, mas em descarregar seu ódio”, lembra. Artista em ascensão, Gustavito teve shows desmarcados e entrou em depressão. “Fui ‘cancelado’ dos ambientes que frequentava, e fiquei com medo de sair de casa.” Em setembro passado, ele venceu um processo por calúnia, e a moça teve de se retratar. “Mas reparar totalmente a situação não tem como. O tempo não volta”, lamenta ele.
CAPA: De Anitta a Drauzio Varella, o cancelamento destrói reputações nas redes
A retomada da vida após o cancelamento é um desafio excruciante. Se a internet não esquece nem os menores pecadilhos do passado dos famosos, que dirá perdoar quem foi condenado no tribunal das redes? Cada um tenta superar o baque da forma que pode — num caso extremo, como o de Gustavito, apela-se para a Justiça. Mas a volta à normalidade frequentemente é um processo longo e requer esforços em várias frentes, na tentativa de aplacar os danos causados, às vezes, por um único deslize fatal. A influenciadora fitness Gabriela Pugliesi foi alvejada por ter dado uma festa em sua casa em meio à pandemia. Perdeu mais de 100 000 seguidores, pediu perdão e desativou sua conta de Instagram, com mais de 4 milhões de fãs, deixando de faturar até 200 000 reais por mês com publicidade. Voltou na última segunda, 20, com um vídeo sobre aprender com os erros e crescer na adversidade. “A gente tem de ter cuidado para não se perder na internet. Para não entrar na energia errada que muita gente dissemina aqui, esse ódio, esse julgamento”, disse.
É raro, mas o contrário existe: há quem se beneficie do cancelamento. Graças à exposição com os ataques que sofreu por praticar bullying com uma garotinha na Disney, o cantor MC Gui ganhou 100 000 seguidores. Em vez de calar, os canceladores eventualmente podem dar força aos seus alvos virtuais.
Publicado em VEJA de 29 de julho de 2020, edição nº 2697