O dado que decide toda eleição desde 1989 – e o que ele diz sobre 2022
Cientista político Alberto Carlos Almeida recorre a Machado de Assis para explicar em novo livro por que a inflação influencia a corrida presidencial
Foi inspirado nas linhas escritas por Machado de Assis no romance A mão e a luva, de 1874, que Alberto Carlos Almeida, doutor em Ciência Política e consultor político de instituições financeiras, escreveu, junto ao pesquisador Tiago Garrido, um livro homônimo. No clássico de Machado, a personagem Guiomar tem três pretendentes para escolher com quem se casar. No final, ela fica com quem lhe ofereceu seu sobrenome. Na visão dela, o par ideal era quem asseguraria bem-estar e posição social a ela. Na obra de Alberto e Tiago, há uma pesquisa de mais de trinta anos de eleições no Brasil. “É a opinião pública quem escolhe o presidente ideal, a luva que cabe em sua mão”, compara Alberto a VEJA.
Em conversa com a coluna, Alberto esmiúça argumentos que explicam os resultados das eleições presidenciais desde 1989 até hoje, fala da influência de artistas e o poder das redes sociais nessa fase de pré-campanha. O lançamento será nesta quarta-feira, 10, na Travessa de Ipanema, no Rio.
A ELEIÇÃO SEGUNDO MACHADO. “A mão e a luva é o título de uma obra de Machado de Assim, eu sempre gostei desse título, porque sugere ideia de encaixa entre opinião pública e o candidato. Entre vários, um sabe que vai se encaixar melhor. A luva não se presta a caber em qualquer mão, é assim em qualquer eleição”.
LUVA APERTADA. “Em 2014, foi eleição mais apertada que tivemos. Dilma Rousseff venceu Aécio Neves no segundo turno por uma margem muito pequena. A gente intitula esse capítulo como ‘A luva rasgada’, porque não fica num figurino perfeito para uma mão específica. A luva caberia tanto na mão de Dilma, quanto da de Aécio”.
FATOR INFLAÇÃO. “A situação da opinião pública só se alterou uma vez, em 1994, com a implantação do Plano real. O clima era por mudança, mas a inflação caiu de mais de 30% para 5% ao mês. Foi a única vez que a luva modificou tanto para caber numa mesma mão (a do FHC). Isso não aconteceu em nenhuma outra vez. E é muito difícil que ocorra agora”.
O PODER DO REAL. “No ano da eleição de 1994, a inflação sempre subia de um mês para outro. E de repente caiu para 5%, explode o consumo. FHC ia para o interior do país, em comícios, levantava a cédula de um real e falava que valia mais que um dólar. Foi decisivo na campanha. É muito difícil mudar a situação que a gente se encontra hoje. Nada vai ser tão forte quanto foi o Plano Real próximo à eleição”.
O QUE SE VÊ EM 2022. “Para 2022 temos duas mãos (Lula ou Bolsonaro) para uma só luva, que é a opinião pública. Percebe-se que está se querendo mudança. Essa eleição se assemelha muito a de 1998. Fernando Henrique disputava a reeleição com um oponente bastante conhecido, que era Lula. Hoje o presidente disputa a reeleição também com Lula. Em 1998, o terceiro colocado nas pesquisas era Ciro Gomes. Hoje, também é Ciro. Só tem uma coisa que difere: O índice de ‘ruim/péssimo’ de Fernando Henrique era 25%, Bolsonaro tem 47%, é o estado de opinião pública querendo mudança. É o clima geral”.
7 DE SETEMBRO. “O eleitor não se deixa ludibriar, ele vê quem está melhorando a vida dele e quem não está nem aí. Não é um evento como o de 7 de setembro que vai ludibriar o eleitor. A gente mostra isso no livro. Esses auxílios em cima da hora também são tentativas de se ludibriar. A inflação é o dado mais importante para manter a popularidade de um governo, assim como para eleger alguém. É o número mais importante para qualquer eleição, não tem jeito”.
EFEITO ANITTA. “Todas as pesquisas antes e depois do apoio de Anitta a Lula dão a mesma intenção de votos. O que tem impacto é a opinião pública. Não é um artista ou outro”.