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Thomas Traumann

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Thomas Traumann é jornalista e consultor de risco político. Foi ministro de Comunicação Social e autor dos livros 'O Pior Emprego do Mundo' (sobre ministros da Fazenda) e 'Biografia do Abismo' (sobre polarização política, em parceria com Felipe Nunes)
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A república de Rio das Pedras

Como uma favela dominada pela milícia virou comparação do governo Bolsonaro

Por Thomas Traumann Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 18 jul 2022, 12h59
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  • Rio das Pedras é um bairro na zona Oeste do Rio que entrou na história por ter sido a primeira experiência miliciana do país. Nos anos 1990, depois de assassinar dois presidentes da associação de moradores, ex-policiais tomaram o controle do bairro prometendo acabar com o tráfico. Com ajuda do batalhão da PM local, acabaram com as quadrilhas locais, e impuseram uma lei particular de castigos físicos a quem era pego fumando maconha, horários para festas e censura às músicas com letras consideradas imorais. Em troca, cobravam uma taxa de segurança.

    Com o tráfico dominando metade da cidade, Rio das Pedras foi saudada como um “mal menor” pelo poder público. Com o tempo, o modelo de Rio das Pedras se espalhou pelos bairros próximos, como Itanhangá e Muzema. Com as taxas de segurança, vieram a exclusividade dos milicianos para a venda de botijões de gás, instalação de Tv à cabo e o transporte de vans. Nada podia entrar no bairro se não fosse da milícia. Em alguns anos, a milícia passou a controlar o tráfico de drogas em toda a Zona Oeste do Rio. Quem tenta resistir à extorsão é vítima de ameaças, torturas e execuções. Cerca de dois milhões de moradores da Região Metropolitana do Rio vivem sob o domínio das milícias.

    Deve-se ao cientista político Bruno Paes Manso, um dos principais pesquisadores sobre violência urbana no Brasil, mostrar a correlação do avanço da milícia carioca com o crescimento político de Jair Bolsonaro. Como deputado, Bolsonaro fez discursos a favor da milícia, contratou familiares de milicianos para seu gabinete e ganhou suas eleições em territórios controlados pelos paramilitares. Quando o seu ex-chefe de gabinete Fabrício Queiroz era procurado por corrupção, estava escondido pelos milicianos de Rio das Pedras.

    “Na depressão coletiva que a gente passa a viver em 2018, com sucessivas crises políticas e econômicas e com a descrença geral na política, é que uma figura como essa, que se coloca como alguém capaz de restabelecer a ordem pelo uso da violência, passa a ganhar um certo crédito. É nesse sentido que o milicianismo ganha uma dimensão nacional. Uma figura e um grupo que dizem não acreditar no estado de direito, na Constituição, querem reinventar uma nova ordem a partir dos valores que eles representam. E pelo uso da violência armada, da adesão de grupos armados que compactuam com os mesmos valores. Ao mesmo tempo, desconstruindo tudo que vinha sendo formado pela recente democracia brasileira. E a gente passa a correr o risco de se transformar na República Federativa de Rio das Pedras”, diz Paes Manso.

    O modelo Rio das Pedras, segundo Paes Manso, é o de o Estado e os órgãos de controle só atrapalham, e aí podem ser as legislações ambientais que impedem garimpo ilegal, a Receita Federal que investiga rachadinhas do filho ou as decisões do Supremo limitando as intervenções do Executivo. Bolsonaro, diz Paes Manso, é resultado “da ideia de que você tem instituições democráticas frágeis, incapazes de lidar com o crime, e que para você levar a ordem para esses lugares, você tem que se impor pelo uso da violência. É um tipo de gestão que acredita no papel instrumental da violência, da ameaça”.

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