Uma garota presa a uma cadeira de rodas vive sob os cuidados de uma mãe superprotetora capaz de barbaridades para defender a cria – inclusive fazer de tudo para que a filha nunca se liberte de sua doença. O enredo do filme Fuja, da Netflix, remete de bate-pronto à série The Act, produção de 2019 com Patricia Arquette e Joey King baseada na história real da relação doentia entre uma mãe e sua filha. Mas originalidade, nesse caso, é o de menos. Embora esteja longe de ser arrebatador, não se pode dizer que Fuja careça de eficiência: está na primeira posição de atrações mais vistas na plataforma de streaming e alcançou 80% de aprovação dos críticos no site americano especializado em cinema Rotten Tomatoes. A explicação é que dispõe de um trunfo matador: a presença em cena da sensacional Sarah Paulson. No papel da mãe endiabrada, a atriz de American Horror Story e Ratched confirma-se como a nova dama do suspense.
Na produção, Sarah é a professora Diane Sherman, que passa por um parto cheio de complicações e quase perde sua filha, Chloe Sherman (Kiera Allen). A menina cresce acometida por graves problemas de saúde, como asma, diabetes, arritmia e paralisia dos membros inferiores – o que a faz se locomover por meio de uma cadeira de rodas. Agora, aos 16 anos, o sonho da garota que cresce rodeada de proteção e cuidados é ter sua independência e ir para a faculdade. Mas tudo muda quando ela descobre as verdades – e, principalmente, as mentiras – sobre sua mãe. O conflito é a deixa para Sarah Paulson dar seu show de atuação.
O pendor para viver mulheres misteriosas – e perigosas – veio quase naturalmente para a atriz americana. Nascida na Flórida em 1974, Sarah se mudou com a mãe e a irmã mais nova aos 5 anos para Nova York, onde dormia em um colchão no chão de um pequeno apartamento no Queens. Desde cedo, a menina sonhava em ser atriz, como sua ídolo Julia Roberts, cuja imagem estava estampada em seu armário do colégio. Ela queria ser igualmente “glamorosa, chamativa e charmosa”. Porém, rapidamente descobriria que seu dom era de metamorfosear por personagens “desagradáveis, desajustadas ou cruéis”.
Feminista e reservada sobre sua vida particular, Sarah não gosta de rotular sua sexualidade – pois, ao fazê-lo, ela teme se sentir presa a uma camisa de força (para usar um termo que cairia bem a tantas de suas personagens). Sarah vive uma paixão há cerca de seis anos pela também atriz Holland Taylor (de Two and a Half Men), de 78 anos – 32 anos mais velha que ela, que tem 46. “Há uma pungência em estar com alguém mais velho. Acho que valorizamos mais o tempo, o que fazemos juntos e o que é importante, e isso pode fazer com que as pequenas coisas pareçam muito pequenas”, disse Sarah em entrevista ao The New York Times.
Diferença de idade, de fato, sempre foi algo que a atraiu nos relacionamentos. Antes de Taylor, Sarah já namorou a atriz Cherry Jones (Defending Jacob), que é 18 anos mais velha. Antes ainda, ficou noiva do ator e dramaturgo Tracy Letts (Ford Vs. Ferrari), que tem nove anos a mais.
Apesar de seu começo na comédia, como na série Studio 60 on the Sunset Strip, de Aaron Sorkin, em que interpretou uma cristã conservadora, e de suas aclamadas imitações humorísticas de personalidades, Sarah consagrou-se no suspense. Mas não um suspense sisudo, e sim a variação mordaz e hilariante do gênero que se tornou a marca do roteirista Ryan Murphy, seu grande “padrinho”. Sarah demonstrou sua versatilidade ao desdobrar-se em diversas personagens bizarras na série de antologia American Horror Story: apenas nessa produção, ela interpretou uma jornalista lésbica, a diretora de uma academia de bruxas, um par de gêmeos siameses, e uma fantasma viciada em drogas.
Ao lado da veterana Jessica Lange, Sarah se tornaria uma das atrizes-fetiche de Murphy. Aqui num registro dramático, brilhou como a advogada Marcia Clark na excepcional American Crime Story: O Povo Contra OJ Simpson. Mais recentemente, pôs seu carisma à prova como a tenebrosa enfermeira que dá nome à minissérie Ratched – na qual só mesmo ela se salva. Agora, com o bem-sucedido thriller Fuja, ela não acrescenta lá muito prestígio a seu currículo, mas prova que não depende do padrinho Murphy para reluzir. Na atual safra do suspense, não dá para fugir de Sarah Paulson.