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Críticas e análises sobre o universo da televisão e das plataformas de streaming
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Boate Kiss: série da Netflix escancara ao mundo 10 anos de impunidade

Novo true crime da plataforma, 'Todo Dia a Mesma Noite' abusa do drama e revisita tragédia que matou 242 pessoas em balada de Santa Maria (RS)

Por Kelly Miyashiro Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 25 jan 2023, 09h07 - Publicado em 25 jan 2023, 09h00

No dia 27 de janeiro de 2013, um incêndio na Boate Kiss em Santa Maria, no Rio Grande do Sul, causou a morte de 242 pessoas queimadas, pisoteadas e intoxicadas com espuma tóxica. Naquela noite, uma festa do curso de Agronomia da Universidade Federal de Santa Maria era realizada no local, onde o vocalista da banda Gurizada Fandangueira acendeu um sinalizador de uso externo dentro do clube, atingindo a espuma do teto que era feita de um material inflamável. Além das fatalidades, 636 pessoas ficaram feridas e com sequelas até hoje. Na próxima sexta-feira, 27, o caso completa 10 anos não só da tragédia, como da impunidade. Dos 28 indiciados por envolvimento direto e indireto na incêndio – entre donos da boate, integrantes da banda, funcionários da prefeitura e até bombeiros –, apenas quatro pessoas foram levadas à julgamento, condenadas, porém, com uma manobra de advogados, conseguiram habeas corpus e estão soltas. Ou seja, nenhuma pessoa responsável pelas centenas de mortes está presa atualmente. Nesta quarta, 25, a Netflix lança a série dramática Todo Dia a Mesma Noite, baseada no livro-reportagem homônimo de Daniela Arbex, sobre a história que abalou o Brasil e que até hoje não trouxe justiça às vítimas e seus familiares.

Na onda do true crime, a ficção roteirizada por Gustavo Lipsztein e dirigida por Júlia Rezende para a Netflix busca resgatar a memória de tantas vidas interrompidas, enquanto torce para que o caso não caia no esquecimento. Em cinco episódios, as histórias de vítimas e suas famílias são simuladas para mostrar como aqueles jovens obviamente tinham sonhos, eram amados e só queriam se divertir na Kiss naquela noite. Para além da tragédia, o drama também ressalta, como no livro de Daniela, a chocante reviravolta da busca por justiça quando pais de vítimas fatais foram processados pelo Ministério Público por apenas cobrarem insistentemente, ao longo de anos, a punição dos responsáveis. Havia a suspeita de que políticos foram protegidos à época das investigações. Com a tocante atuação de artistas como Paulo Gorgulho, Debora Lamm, Bianca Byington e Raquel Karro na pele dos pais que perderam seus filhos, Todo Dia a Mesma Noite é visceral, fazendo com que qualquer espectador consiga se imaginar na situação angustiante do momento em que a notícia do incêndio irrompe a cidade de Santa Maria, passando pelo reconhecimento das centenas de corpos espalhados por hospitais e ginásios, à luta incansável por uma resposta do Estado sobre a barbaridade.

Na próxima sexta-feira, 27, também, o Globoplay lança a série documental Boate Kiss – A Tragédia de Santa Maria, produzida e apresentada pelo repórter Marcelo Canellas. Formado na Universidade Federal de Santa Maria, mesma instituição da maioria das vítimas, o jornalista cobriu o caso de perto ao longo da década e agora revisita o local do incêndio, sobreviventes e parentes das vítimas. Comovente como a série da Netflix, o documentário reconstrói a noite fatídica, utiliza imagens de arquivo da cobertura da época e atualiza entrevistas, sem deixar de lado o olhar jornalístico de lado e dando ênfase ao drama da injustiça brasileira sobre o caso. 

Juntas, as duas obras reforçam um retrato de impunidade que ainda cicatriza a história do Brasil com um caso revoltante de negligência e corrupção, mas principalmente de luto. Com sorte e apelo, renasce a esperança de que justiça seja feita e que tais lástimas não se repitam. “Há expectativa de mudar a consciência coletiva da memória do Brasil, causando uma reflexão que possa modificar o futuro. É sobre o fim da cultura da impunidade e essa minissérie pode ter uma contribuição imensa porque sua função social é potencializar a voz desses pais e de nos fazer refletir sobre é os caminhos que nos fizeram chegar até aqui”, diz Daniela Arbex a VEJA. 

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