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O Ibama sem dentes

Há suficientes indícios de que desmantelamento de mecanismos de repressão não é mera incúria

Por Ricardo Noblat
27 nov 2020, 13h00
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  • Editorial de O Estado de S. Paulo (27/11/2020)

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    Em seus delírios persecutórios, o presidente Jair Bolsonaro recorrentemente vê nas críticas internacionais à defesa do meio ambiente do Brasil ambições escusas que ameaçam a “soberania nacional”. Mais realistas são as apreensões em relação àqueles que se valem das queimadas e desmatamentos como pretextos para alavancar seus interesses, como os setores protecionistas do agronegócio internacional e os políticos demagógicos ávidos por excitar o eleitorado sensível à pauta ambiental. Mas o problema é que o governo lhes entrega esses pretextos de mão beijada. Se a lei ambiental brasileira, que é uma das mais avançadas do mundo, fosse cumprida, esses pretextos evaporariam.

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    Contudo, não há como impor a lei sem mecanismos de punição. Um levantamento feito pelo Observatório do Clima a partir de dados fornecidos pela Lei de Acesso à Informação revela que desde outubro do ano passado até pelo menos agosto deste ano praticamente nenhuma multa ambiental foi aplicada.

    Historicamente, o pagamento de multas no Brasil já é baixo. Nos três anos anteriores à gestão Bolsonaro, foram aplicadas cerca de 15 mil autuações por ano, totalizando mais de R$ 3 bilhões em multas. Mas somente 5% foram efetivamente cobrados, depois de longos e tortuosos recursos judiciais.

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    Em outubro do ano passado, o Decreto 9.760 suspendeu a cobrança de multas até a realização de audiência de conciliação. Em tese, a ideia seria fazer com que os órgãos fiscalizadores chegassem a um acordo, sem necessidade de contestação judicial, acelerando a aplicação das sanções. Mas na prática o Ibama realizou apenas 5 audiências de um total de 7.205 agendadas. O ICMBio não fez nenhuma. As únicas multas pagas foram as aplicadas antes de a conciliação vigorar.

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    “A autuação é só o início de um processo sancionador. O autuado tem direito de fazer sua defesa, o processo vai ser julgado. A cobrança só ocorre quando a multa é considerada devida”, explicou Suely Araújo, do Observatório do Clima. “Mas o que vimos é que esse processo não está nem sendo iniciado. A conciliação não está ocorrendo.”

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    Além disso, os crimes e infrações não tiveram seu prazo de prescrição suspenso, o que pode fazer com que as autuações sejam extintas sem que os infratores sofram qualquer punição.

    Há suficientes indícios – muito além da já folclórica conclamação do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, para “passar a boiada” (i.e., alterar as normas ambientais) em meio ao pânico da pandemia – de que o desmantelamento dos mecanismos de repressão aos crimes ambientais não é mera incúria, mas uma ação concertada.

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    A hostilidade de Jair Bolsonaro em relação à causa ambiental é confessa. Já na campanha de 2018, o então candidato disse que havia excesso de multas ambientais.

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    Em março passado, o governo eliminou a exigência de autorização específica para a exportação de madeira, facilitando a exportação ilegal. Recentemente, uma auditoria do Tribunal de Contas da União apontou que a distribuição de cargos de chefia do Ibama a militares desrespeitou exigências legais de contratação impostas pelo próprio governo, com nomeações irregulares, que não atendem aos critérios mínimos de experiências profissional e acadêmica previstos por lei.

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    O resultado é catastrófico. As queimadas e desmatamentos em biomas como o Pantanal e a Amazônia estão batendo recordes; a reputação do agronegócio nacional está sendo dizimada; os investidores estão fugindo do Brasil; e autoridades internacionais ameaçam, entre outras retaliações, barrar acordos como o que foi concertado entre o Mercosul e a União Europeia.

    Nunca é demais lembrar: a lei brasileira, com destaque para o Código Florestal, é exemplar e rigorosa. Bastaria a sua aplicação para pôr o Brasil numa posição incomparável em todo o mundo no campo ambiental.

    Nullum crimen sine lege – não há crime sem lei, diz o adágio jurídico. Os crimes existem – as árvores e animais carbonizados na Amazônia e no Pantanal estão aí para prová-lo – e as leis também. Mas sem sanções as leis são inúteis, e os crimes aumentarão dia após dia.

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