As imagens do Pantanal em chamas, dos animais mortos, da destruição provocada pelo fogo e da fumaça que sufoca quem vive na região dominaram o noticiário do país nas últimas semanas. E não é para menos: trata-se de um desastre ambiental de grandes proporções. Mas esse é apenas um dos aspectos do problema: mais que um desastre ambiental, os incêndios no Pantanal em 2020 são consequência direta do desequilíbrio entre os pilares da sustentabilidade.
A palavra sustentabilidade costuma ser interpretada unicamente como proteção ao meio ambiente. Isso é um erro. Ela se apoia em três pilares, que precisam estar em equilíbrio: o pilar social, o pilar ambiental e o pilar econômico. Esse é o chamado ‘Tripé da Sustentabilidade”. E, assim como em qualquer tripé físico, é fundamental que os três pilares estejam igualmente firmes e dimensionados.
Na prática, isso significa que, ainda que exista resultado econômico com preservação ambiental, se não houver desenvolvimento social, não existe sustentabilidade. Da mesma forma, se houver apenas resultado econômico, mesmo que o ser humano seja beneficiado, não há sustentabilidade se o meio ambiente for prejudicado.
E esse é o aspecto que mais requer atenção na questão do Pantanal. Para além das medidas emergenciais de combate aos incêndios, o que nos preocupa é: como evitar que esse desastre se repita nos próximos anos? Uma coisa é sabermos que existe uma tendência a incêndios na região durante a estiagem – outra muito diferente é ficarmos reféns do clima e de atitudes criminosas, sem um plano para o desenvolvimento da região. Um plano robusto, de longo prazo, solidamente apoiado sobre os três pilares da sustentabilidade.
Eu moro em Mato Grosso há 34 anos, conheço bem a região. Estive há alguns dias no Pantanal, juntamente com a comissão externa do Senado Federal constituída para tratar do tema. De tudo o que vi e ouvi, o que mais me doeu foi a angústia do pantaneiro. A angústia de quem se sente abandonado. A angústia de quem vê sua atividade centenária, que primava pelo equilíbrio com a natureza, sendo mal compreendida e até criminalizada.
O Pantanal depende fortemente do turismo. Mas essa não é a única atividade econômica da região. Durante três séculos, o homem pantaneiro desenvolveu formas de interação com a natureza, atuando na pecuária, na agricultura familiar, na pesca. O homem pantaneiro não tem nenhum interesse em destruir o ambiente que lhe dá a vida e permite a subsistência de sua família.
Se existem melhorias que podem ser adotadas nos processos produtivos, o pantaneiro precisa ser qualificado para isso. Se existem investimentos que precisam ser realizados para que essas medidas se concretizem, o pantaneiro precisa de linhas de crédito adequadas, com acesso simplificado e juros baixos. Porque, se existe alguém que pode atuar diretamente na preservação do Pantanal, esse alguém é o pantaneiro.
A região toda depende de um equilíbrio delicado. E isso não apenas é possível, como é necessário. Existem projetos voltados à preservação das onças que indenizam o pequeno pecuarista quando um bezerro é atacado, evitando assim que ele tente eliminar o felino. Existem propriedades rurais em que a presença das onças foi transformada em atrativo para observação de turistas.
A combinação de diferentes atividades econômicas é essencial para que as famílias pantaneiras possam se manter na região, com uma visão de futuro sustentável. Se esse futuro passar pela observação à distância de aves e felinos, precisaremos da estrutura adequada de conectividade, por exemplo. Se passar pela intensificação do turismo rural, precisaremos tomar as medidas necessárias para preparar o pantaneiro para isso.
O Pantanal é vida, é água, é biodiversidade. Mas é, acima de tudo, gente. E o momento é este: na comissão do Senado estamos trabalhando para planejar um futuro sustentável, no qual as famílias pantaneiras possam garantir seu sustento em perfeito equilíbrio e simbiose com a natureza, para que as cenas de destruição que tanto nos angustiaram nos últimos dias fiquem para sempre na memória de um passado que, esperamos, nunca mais se repetirá.
Carlos Fávaro, senador da República por Mato Grosso