Ciro Gomes começou bem pela esquerda. Conteve as palavras, montou um discurso de continuidade das políticas dos governos petistas e foi à luta de olho nos votos do espólio de Lula – ainda que sem o apoio explícito do ex-presidente, coisa difícil de se obter, segundo ficou logo claro. Candidato pelo PDT, chegou a dizer que a aliança à esquerda, com partidos como o PSB e o PCdoB, teria “hegemonia moral” em sua coligação.
Só que os caminhos começaram a se fechar, sobretudo pelo ainda grande poder de pressão do PT sobre os dois ex-aliados, que precisam de seu apoio em estados estratégicos, como por exemplo no caso do PSB de Pernambuco. Ciro agora busca uma saída pela direita.
Embora ofendidos com a preferência explícita pelos partidos de esquerda e o aparente desdém do candidato pedetista em relação a seu apoio, o Centrão não só aceitou seu convite para conversar como saiu animado do jantar que tiveram na noite de terça-feira. Ciro convidou os representantes do DEM, do PP, do PRB e do Solidariedade para construírem juntos “um novo pólo de poder político no Brasil”.
A aliança só não saiu ainda porque esse pessoal do Centrão é pragmático. As últimas pesquisas, embora trazendo um Ciro competitivo, herdando parte dos votos de Lula quando ele não está no cenário, não o colocam à frente de Marina Silva e o trazem embolado com o segundo pelotão de Geraldo Alckmin e Álvaro Dias – outras duas opções da centro-direita.
Para quem só gosta de pular na canoa vencedora já de olho nas benesses do próximo governo, caso do Centrão, convém pensar um pouco mais, engordar o cacife, barganhar com os outros pré-candidatos. É o que estão fazendo, e isso não é surpresa alguma para os que conhecem o DEM, o PP, o PRB e o SD.
Talvez a surpresa venha, isso sim, a acometer o eleitor que pensava em votar naquele Ciro que começou a campanha ponderado no discurso e comportado no programa da centro esquerda. Ele deve estar se perguntando qual será mesmo o claro de governo do pedetista: o do novo pólo ou o da hegemonia moral?
Por mais que o candidato precise de alianças para ganhar tempo na TV, é evidente que o discurso e as propostas de ação de um e de outro não podem ser misturadas na mesma panela. Quem tem o DEM, não tem o PCdoB – nem mesmo na nossa conhecida e desmoralizante salada partidária.
Ao flertar escancaradamente com todo mundo, Ciro Gomes arrisca-se a virar candidato a biruta de aeroporto, reforçando o discurso dos que o acusam de incoerência por ter, em sua vida política, trocado de partido como se troca de roupa. Agora, a troca parece ser de aliados, e também de discurso. A imagem de coerência que o candidato do PDT vinha a duras penas construindo pode se derreter com a rapidez de um Sonrisal.
Helena Chagas é jornalista desde 1983. Exerceu funções de repórter, colunista e direção em O Globo, Estado de S.Paulo, SBT e TV Brasil. Foi ministra chefe da Secretaria de Comunicação Social da Presidência (2011-2014). Hoje é consultora de comunicação