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Mundialista

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Forças russas derretem no Sul e Elon Musk fala de paz na hora errada

Proposta de paz do homem mais rico do mundo mostra que falta noção - e entendimento sobre a disposição de luta dos ucranianos

Por Vilma Gryzinski 5 out 2022, 06h32

Conquistar Marte, fazer paraplégicos andar e agora voltar a negociar a compra do Twitter são coisas que só visionários da estirpe de Elon Musk conseguem conceber, planejar e colocar em execução.

Mas isso não significa que ele tenha capacidade de resolver a guerra na Ucrânia, como mostram as reações negativas à sua proposta de dar a a anexação da Crimeia por consumada e fazer plebiscitos supervisionados pela ONU em territórios disputados. A Ucrânia também garantiria o fornecimento de água à Crimeia e se comprometeria a ser um país neutro – ou seja, não entraria para a Otan. Propôs que seus seguidores no Twitter votassem contra ou a favor de seu plano.

Musk não explicitou como tiraria os russos desses territórios, só para ficar numa das questões fundamentais sobre a legitimidade um plebiscito dessa natureza.

Fazer plebiscitos com o exército russo dentro deles já acabou de acontecer, com nada surpreendentes resultados de quase 100% de aprovação à sua anexação. Uma encenação grotesca.

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O timing da “proposta” de Musk também foi infeliz. Coincidiu exatamente com um avanço quase inacreditável das forças ucranianas na região de Kherson. Em dois dias, avançaram cerca de 23 quilômetros num território que dava a impressão de ser inexpugnável pela concentração de tropas, inclusive unidades de elite.

Os russos parecem ter desistido de lutar, ficando com três opções, uma pior do que a outra: bater em retirada organizada, fugir desorganizadamente ou cair no campo de batalha.

Propor concessões a um Exército que está avançando foi provavelmente uma iniciativa bem intencionada de Elon Musk, embora recebida com indignação.

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“Aqueles que propõem à Ucrânia que abra mão de população e território – presumivelmente para não magoar o ego de Putin – precisam parar de usar a palavra ‘paz’ como um eufemismo para ‘vamos deixar os russos estuprar e matar mais milhares de ucranianos inocentes e ocupar mais terras’”,  fulminou o ministro das Relações Exteriores, Dmitro Kuleba.

O presidente Volodymyr Zelensky também entrou na briga e propôs uma outra pesquisa no Twitter: “Quem você prefere: a) o Musk que apoia a Ucrânia; b) o Musk que apoia a Rússia?’”. A primeira hipótese estava ganhando com 96% dos votos.

Musk lembrou que prestou uma ajuda totalmente grátis e fundamental para a Ucrânia, ao fornecer equipamento para sua rede de satélites Starlink, o que garantiu a conexão com a internet. Frequentemente, ucranianos convocados para a guerra fazem vídeos de agradecimento a ele.

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Em defesa de sua proposta, Musk argumentou que “a Rússia tem três vezes a população da Ucrânia, portanto uma vitória ucraniana é improvável numa guerra total”.

Ele não levou em conta um elemento fundamental: os ucranianos não querem fazer concessões territoriais aos russos. Uma pesquisa feita no mês passado pelo Instituto de Sociologia de Kiev mostrou que 87% são contra essa barganha. Na turma do não incluem-se 57% dos ucranianos que são etnicamente russos – exatamente os que Vladimir Putin disse que queria defender dos “nazistas”.

Para reforçar esta disposição, Zelensky assinou um decreto que simplesmente proíbe negociações ou qualquer tipo de concessão à Rússia.

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O ódio ao invasor que atacou o país sem nenhuma justificativa, praticando atrocidades que são mostradas diariamente nas redes sociais, é muito mais forte do que qualquer possibilidade de acordo com o inimigo. Essa é uma característica da psique coletiva de povos eslavos demonstrada inclusive durante o sofrimento inenarrável suportado durante a II Guerra Mundial.

A descoberta de massacres, violações e torturas em lugares como Bucha e Izium significa que “se alguma vez houve espaço na opinião pública ucraniana para fazer concessões à Rússia, este espaço agora se fechou”, segundo uma análise da revista New Yorker.

Sem contar o avanço das forças ucranianas não só na região de Kherson, ao sul, como em Luhansk. Por causa dessas vitórias, Putin adiantou o recrutamento de reservistas e a realização dos  plebiscitos ilegítimos que provocaram a declaração de anexação.

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Se os ucranianos recusam compromissos e a Rússia tem a vantagem brutal de um enorme arsenal nuclear, como a guerra pode acabar?

Essa é uma pergunta que envolve nada menos do que o destino da humanidade: se a Rússia estivesse na iminência de uma derrota, possivelmente usaria uma arma nuclear tática, ou seja, de alcance limitado. Estados Unidos e aliados europeus teriam que responder, possivelmente com um bombardeio arrasador da frota russa no Mar Negro, e daí estaria formado o quadro da guerra total, com ataques e retaliações em escala apocalíptica.

A alternativa seria um golpe que tirasse Putin do Kremlin, mas todos os especialistas concordam que o eventual substituto poderia ser pior ainda. As críticas internas que ele vem recebendo por pegar “leve demais” no conflito atual indicam exatamente isso. Toda a elite política e militar russa é formada sobre o conceito de que a Rússia jamais pode fazer concessões.

A hipótese contrária também é inconcebível: uma vitória russa sobre uma Ucrânia arrasada, por meios convencionais ou nucleares, seria inaceitável para a aliança ocidental, pois todos os países fronteiriços que têm minorias russas estariam imediatamente sob risco de invasão. Isso inclui os três países bálticos que fazem parte da Otan. Um ataque russo contra eles exigiria uma resposta coletiva, como estabelece o Artigo 5 da carta da aliança, levando portanto à mesma situação de guerra entre as duas maiores potências nucleares do mundo.

Ninguém tem respostas factíveis para esses dilemas. Muito menos Elon Musk, que ainda passou pelo vexame de ter sua proposta considerada “muito positiva” pelo porta-voz de Putin, Dmitri Peskov.

Detalhe nada tranquilizador: centros de evacuação de Kiev estão recebendo estoques de pílulas de iodeto de potássio, que têm ação preventiva para o câncer de tiróide provocado por doses altas de radiação se tomado imediatamente depois do evento maligno, seja um vazamento em usina nuclear, seja uma bomba.

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