Está longe de terminada a batalha contra o vírus infernal.
Mesmo num lugar como a Grã-Bretanha, que já vacinou 50% da população e comemora as quedas radicais no número de vítimas, existe a plena consciência de que “nenhum país é uma ilha” – inclusive as próprias Ilhas Britânicas.
A possibilidade de que os bons resultados sofram uma regressão, a partir da próxima segunda-feira quem pretender viajar sem motivo de força maior está sujeito a uma multa de cinco mil libras – quase 40 mil reais.
A medida vale até junho e abarca as duas semanas de recesso de Páscoa das escolas, um período tradicional de “férias no sol”, por coincidir com o fim do inverno e a corrida por um lugar numa praia grega ou espanhola, entre outras.
Exceções: quem viaja a trabalho ou para estudos, nascimento ou morte em família, transações imobiliárias ou obrigações legais.
Proibir viagens é uma medida pesada, principalmente num país com a tradição anglo-saxã de liberdades individuais.
Mas o governo de Boris Johnson não quer correr riscos maiores do que os já existem, inclusive porque a Covid-19 está dura de controlar em vizinhos como a França, onde Paris e outras regiões importantes voltaram para o lockdown que Emmanuel Macron havia prometido nunca mais fazer.
A França pode entrar na “lista vermelha”, criada para abarcar países com variantes temidas como o Brasil e a África do Sul, além de nações no seu entorno.
Para entrar no Reino Unido vindo desses lugares, é preciso fazer uma quarentena total de onze dias num hotel de aeroporto. O desconforto e o custo, assumido pelo viajante, têm por objetivo justamente desincentivar as viagens.
Entre outras iniciativas que pareceriam absurdas no mundo pré-coronavírus, o governo britânico está cogitando distribuir testes para que moradores de regiões onde o vírus se mostre mais renitente façam o autoexame com o cotonete duas vezes por semana de modo a localizar exatamente os focos.
As medidas de precaução acontecem num ambiente de desentendimento entre Inglaterra e a União Europeia, recém-separadas pelo Brexit e pelos resultados divergentes em matéria de vacinação.
Até a imensamente séria e equilibrada Angela Merkel está apoiando uma medida de força com um potencial explosivo de consequências: proibir a exportação de vacinas da AstraZeneca fabricadas em países da União Europeia.
A ameaça veio, inicialmente, da mulher que Merkel emplacou como presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen.
Uma intervenção desse tipo prejudicaria diretamente a Grã-Bretanha, que precisa de quatro milhões de doses fabricadas na Bélgica para manter o cronograma da segunda fase da vacinação a partir de abril – o país optou, pioneiramente, por dar a primeira dose das vacinas à maior quantidade possível de pessoas.
Numa inversão de expectativas, Boris Johnson não fez nenhuma ameaça de retaliação (segurar os insumos fabricados na Inglaterra para a vacina da Pfizer, por exemplo). Ao contrário, propôs até eventualmente dividir as vacinas com os vizinhos mais afetados.
Um mundo em que Angela Merkel faz ameaças estapafúrdias e Boris Johnson mantém a cabeça fria mostra como o vírus continua a bagunçar as narrativas.