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A nova briga entre Lula e Bolsonaro que se abre no ano novo

Caio Fábio, Yago Martins, Lourenço Stelio Rega e Silas Malafaia avaliam - a Rodolfo Capler - os desafios do novo governo frente ao segmento religioso

Por Rodolfo Capler
Atualizado em 28 dez 2022, 14h05 - Publicado em 28 dez 2022, 13h26

A 3 dias da cerimônia da posse presidencial, o novo governo se encontra envolto em um grande impasse: como será o relacionamento dos evangélicos com o presidente Lula? Tendo recebido o apoio de 32% do eleitorado evangélico no último pleito (62% votaram em Bolsonaro) Lula terá de furar a bolha da militância progressista e estabelecer pontes de aproximação com os fiéis, a fim de sedimentar a sua governabilidade.

Para Ricardo Borges, 40, evangélico há 20 anos, e membro da Igreja Batista Esperança em Piracicaba (SP), Lula pode ter uma ótima interlocução com os evangélicos, porém, terá de lhes prestar contas de muitas coisas. “Nós evangélicos somos ensinados a perdoar, porém, confesso que muitos ainda não conseguiram perdoar o Lula por conta de seus erros passados”, disse à coluna.

Em busca de interlocução com os eleitores evangélicos, o PT fez parcerias com pastores evangélicos de esquerda, como Paulo Marcelo Schallenberger, no último período eleitoral. A tentativa parece não ter surtido muito efeito, pois a maioria dos fiéis ainda se identifica com Jair Bolsonaro. “O Bolsonaro encarnou aquilo que defendemos: o combate à corrupção, a pauta da família e outras coisas que nos são muito caras. Esse conjunto de coisas foi traduzido na pessoa dele. Por essa razão, Bolsonaro é o líder político preferido dos evangélicos”, afirma Silas Malafaia, pastor presidente da Igreja Assembleia de Deus Vitória em Cristo. Em contrapartida, para Yago Martins, pastor batista, escritor e idealizador do maior canal de teologia do mundo no YouTube (“Dois dedos de teologia”), Bolsonaro pode perder a sua preponderância entre os evangélicos. “Haverá certamente um grupo decrescente de apoiadores radicais de Bolsonaro, contudo, muito provavelmente, veremos no Brasil um mimetismo do que aconteceu com o trumpismo nos Estados Unidos, onde Donald Trump, mesmo derrotado, continuou a ser interpretado como um tipo de presidente no mundo espiritual”, explica. Posição mais abstrusa sustenta Caio Fábio D’Araujo Filho, teólogo e mentor do Caminho da Graça. “Se Bolsonaro continuar se mostrando deprimido e mantiver posicionamentos de autodestrutividade, como vem fazendo nos últimos 40 dias, haverá uma quantidade enorme de evangélicos que o olharão de maneira muito negativa. O apoio a Bolsonaro dependerá também do que acontecerá em seu casamento. Se a Michelle o abandonar, por alguma razão, ele perderá respaldo significativo dos crentes”, alerta.

As barreiras que Lula terá de transpor

Embora Bolsonaro possa perder a sua hegemonia entre os evangélicos, isso não significa – necessariamente – que Lula conquistará o apoio majoritário do segmento religioso. Ainda há muito o que se fazer nesse sentido pelo novo governo. Os desafios são inúmeros, a começar pela recuperação da confiança dos fiéis, um dia arruinada. “O maior desafio de Lula será contraditar a sua ideologia e seus companheiros. Eu não acredito que ele mudará”, comenta Malafaia. Parecer semelhante é apresentado por Lourenço Stélio Rega, teólogo e ex-deão da Faculdade Teológica Batista de São Paulo. Segundo ele, o novo presidente conseguirá alguma conexão com os evangélicos “se esclarecer a situação sobre a anulação do seu julgamento na Lava-Jato”. Ainda conforme Rega, “é uma situação complexa que certos segmentos juristas ainda não conseguiram absorver; isso afeta cidadãos, os segmentos religiosos e, também, lhe tira certa credibilidade”. 

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Além de tentar reconquistar a confiança dos fiéis, Lula terá de lidar com a chamada pauta de costumes; prioridade para os evangélicos. Defendendo-a foi que Bolsonaro ganhou o coração do segmento religioso, quando, em 2016, surgiu publicamente pleiteando a Presidência da República. Para Martins, a pauta de costumes constitui o maior desafio do governo Lula, pois “é uma espécie de Santo Graal” para o movimento. “Uma agenda política que envolva aborto, questões LGBTQIA+ e restrição da liberdade de expressão, será um grande problema para Lula”, explica. D’Araújo Filho acredita que Lula, pessoalmente, não pode atender essa demanda de comunicação com os evangélicos em decorrência da pauta de costumes. “A tríade pênis-vagina-ânus é o que movimenta uma igreja evangélica ensandecida pelo poder e pela dominação, portanto, Lula terá o desafio hercúleo de tentar aproximações reconciliadoras por intermédio de terceiros, visto que somente evangélicos conseguem se comunicar com evangélicos”, explica.

Outra barreira a ser transposta pelo novo governo é o clima de divisão social que domina o país e que fermenta muitos círculos evangélicos. No último período eleitoral, muitas igrejas evangélicas instauraram uma verdadeira caça às bruxas, destituindo alguns pastores (de linha mais progressista) de seus cargos e banindo muitos fiéis como consequência de seus posicionamentos políticos à esquerda ou contrários a Bolsonaro. Os resultados disso já são experimentados com igrejas rachadas, membros emocionalmente feridos e uma grande evasão de fiéis que diariamente engrossam as fileiras dos desigrejados do país. Por essa razão, arrefecer a atmosfera facciosa que circunda a nação e, também, os templos, é uma tarefa a ser perseguida por Lula. “Eu creio que se há alguma participação de força do governo Lula em relação a esvaecer esse problema é justamente pela via da equanimidade, ou seja, pela eficácia do trato social. Como a maioria dos evangélicos é formada por gente pobre e manipulável, a única coisa que realmente pode interferir nesse processo de divisão social é um investimento massivo em educação. Só vejo esse caminho para a superação do obscurantismo que domina os evangélicos”, destaca D’Araújo Filho. Por sua vez, Rega, eticista e profundo conhecedor das idiossincrasias do segmento evangélico, avalia de modo similar: “Me parece ainda que, com o tempo, o segmento evangélico se dedicou mais à atuação missionária e eclesiástica, que são corretos, mas tem deixado a reflexão e o aprofundamento nos estudos dessas áreas – bíblica, teológica, ética, etc. – de modo a se construir diálogos sadios e produtivos”. Dessa forma, conclui: “A divisão social instalada no cenário evangélico, sem esses reparos, provavelmente continuará”.

* Rodolfo Capler é teólogo, autor do livro “O país dos evangélicos” e pesquisador do Laboratório de Política, Comportamento e Mídia da Fundação São Paulo/PUC-SP

 

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