O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Dias Toffoli criticou a “judicialização” excessiva de discussões de temas no país e afirmou que esse mesmo excesso revela uma deficiência das instituições.
“A gente brinca que lá a gente decide do parafuso ao foguete. Tudo vai parar no Supremo. E nós, do Judiciário, não podemos dizer ‘não vamos julgar’. Se tudo vai parar na Justiça, temos que refletir enquanto sociedade”, declarou. Toffoli participou do painel sobre Justiça e Segurança do 23º Fórum Empresarial Lide, que acontece no Rio de Janeiro.
“Somos criticados, muitas vezes, pelo excesso de litigiosidade, pelo excesso de decisões. Mas, na verdade, quem tem que refletir sobre isso é a sociedade e os poderes constituídos. Porque se tudo vai parar no Judiciário, é porque há uma falência dos órgãos e das instituições e da sociedade em resolver seus conflitos”, disse. “Temos que destravar o país. Temos que ter órgãos de estado que tenham sistema de fast track de trabalhar juntos e de ter decisões rápidas”.
Toffoli sinalizou a existência de um “conflito” hoje no país com a criação do trânsito em julgado — momento em que uma decisão judicial torna-se definitiva, sem que haja a possibilidade de recurso. O termo “trânsito em julgado” é mencionado na Constituição Federal e em diplomas como os Códigos Civil e Penal, mas nenhum traz uma definição legal.
“Um contrato só vale se tiver uma decisão judicial com trânsito em julgado. Na administração pública, os gestores mordem o dedo dos órgãos de controle. E muitas vezes aquilo que, por exemplo, um estado e o Executivo federal estão de acordo, o pessoal do Tesouro Nacional diz ‘Vai no Supremo, que aí com a ordem judicial estamos protegidos'”, declarou.
Como exemplo, o ministro citou a liminar concedida por ele mesmo ao estado do Rio de Janeiro. Em maio, o magistrado suspendeu o aumento no serviço da dívida do estado com a União — a alta era uma punição ao descumprimento do plano de recuperação fiscal assinado pelo estado. Toffoli concedeu o direito de que o Rio de Janeiro pague as parcelas mensais da dívida no valor correspondente ao ano de 2023, sem a aplicação de sanções. A concessão da liminar, no entanto, disse Toffoli, foi conversada primeiramente com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Já nesta semana, o tema foi tratado pelo Congresso: o Senado aprovou a renegociação de dívidas dos estados com a União, com a possibilidade de pagamento em até 30 anos e com juros menores. A matéria segue para a Câmara.
“O projeto de lei no Senado para resolver esse problema saiu do Judiciário, para resolver no Congresso Nacional. E quando se vai no Tesouro, o técnico diz: ‘Se eu assinar isso, posso ser responsabilizado’. Então judicializa”, declarou.
Reforma tributária
Ainda falando do excesso de processos no país, Dias Toffoli apontou que a reforma tributária deverá aumentar a judicialização. O ministro afirmou que, desde a criação da repercussão geral — que garante a possibilidade de que a decisão tomada pelo Supremo seja vinculante para toda a Justiça –, foram 341 temas aprovados e outros 270 julgados apenas em matéria tributária.
“Virá uma demanda enorme, porque com a nova emenda constitucional que alterou o sistema tributário e a sua regulamentação, é evidente que vai haver uma judicialização (…) Quanto mais texto na Constituição, mais judicialização nós vamos ter. E dizia ao Paulo Guedes [ex-ministro da Economia], ao Haddad, que o ideal da reforma era enxugar a Constituição, estabelecer critérios de premissas, de divisão da federação das competências, mas não colocar tanto texto. Fizeram tudo ao contrário”, declarou.